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Júpiter, acompanhas-me até à Avenida Principal? Sim, não te preocupes, era mesmo isto o que precisava. Só te tenho a agradecer. Já agora, posso tratar-te por “tu”? Desculpa o atrevimento.
…
Há dias que te tenho observado.
Tenho-me descoberto a observar-te, grande corpo celeste,
Imenso pedaço de vida e luz.
Nos meus olhos figura o mais sereno do mais sereno retrato;
O mais brilhante do mais brilhante que pode ser;
Numa catarse indistinta, num sublimar de espectros divinais,
De auroras envolventes e sedutoras plumas,
Vais-me enternecendo o tempo.
Amoleces-me as, então submissas, emoções.
Imortalizas-me o mais primitivo de mim,
Eternizas o mais afincado do que já nem sei se sou.
…
Cá por baixo tem estado tudo na mesma. Que tal um café? Tenho tempo.
Eu sei que não me conheces bem, mas eu vejo-te sempre e desde sempre.
…
Embalo-me e às percepções convencionadas.
Sou mais do que fui feito para ser.
Sinto mais do que fui feito para sentir.
Este sou eu amargurado com o sentimento,
Louco. Seduzido pela tua sensualidade, Júpiter.
Mergulhado no mais revolto, no mais intenso vórtice abstracto,
No mais impetuoso expoente, na mais ardente corrente.
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Não quero atrasar-te de maneira nenhuma. Eu pago, não te aflijas.
A vida tem-me corrido bem nesses termos.
Pelo menos
…
Oh Júpiter,
Clareia-me as vísceras.
Purifica-me o alvoroço escuro que escondo,
Banha-me o que não tenho.
Envolve-me as entranhas e coloniza-me. Totalmente.
Faz-me ser um bocado de ti.
Partilha essa tua vista maravilhosa comigo.
Este sou eu, irredutível, a pedir-te que me unas aos céus;
Que me sejas e que me deixes ser-te.
Tem-me. Sê-me.
Funde-me com o maior vigor.
Agrega-me os sentimentos num só
E faz-me levitar. Perto de ti. Contigo.
…
Lá estão os jardins da Avenida. Sim, cada vez mais nítidos. São eles.
Parece-me que está na hora de cada um seguir o seu rumo
…
Deixa-me ser imagem divinal.
Eternamente: pelo desconhecido.
…
Resta-me esperar que tenhas gostado do café.
Podemos repetir. Um dia.
Rui Gomes, 6-11-2011