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Alma

 
Acordo e olho-me ao espelho ainda no escuro da manhã. Vejo-me como eu queria que eu fosse, tento moldar-me para que eu seja o que eu sempre quis. Saio de casa com o papel ensaidado. Tenho que me mostrar feliz e contente. Tenho que ser o comum de todos os outros, pois sei que se pisar a linha caio num abismo profundo...
Tento-me mostrar mas já represento, às vezes em demasia... Todas as piadas, todos os sorrisos são em vão. Agora sorrio mais mas tenho que disfarçar as lágrimas. As lágrimas que não saem! E todos choram e eu não sei porquê! Eu que disfarço, coloco uma máscara, crio uma sombra!
Olho a minha vida como um risco com outros tantos entrelaçados. Chamo os espíritos que me perseguem, suplicando a minha alma. Mas não choro! Sou animal exteriormente, vivo apenas com o instinto da sobrevivência. A minha alma, não está dentro de mim! Se estivesse, choraria de tanta ceguice que vejo no mundo. Tento não ouvir as mesmas discussões para não pensar que tudo será em vão, e então represento. Rio-me, digo os disparates que a memória me traz da infância, como um idiota num bando de dementes. São todos tão diferentes mas todos tão iguais. Todos com a alma dentro deles próprios... Loucos! Eu procuro a minha alma! Procuro-a nas pedras, nas àrvores, nas folhas e nas cavernas! Sou um animal que procura a sua alma! E represento, finjo que já a encontrei, como sempre fingi....
Mas de subdito, o meu corpo abranda. Pára de segundo em segundo, vacila de tanta energia acumulada. A mascara desfaz-se, a sombra desaparece e quando, por fim abrirem o meu corpo, jazido no chão não encontrarão nada! Pois a minha alma não está em mim. É tão triste viver sem alma e conviver com ela todo o dia...
Ela vagueia pela praia. Viaja pelos bosques e ruínas abandonadas. Ela respira as lágrimas que derramam por mim! Ela jaz na imensidão do céu azul e no singelo toque da terra vermelha. Ela anda desaparecida por ser tão rebelde, ó alma minha...


Pedro Carregal

 
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PedritoDomus
 
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