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Tarde Chuvosa

 
Tarde Chuvosa
 
O dia amanheceu tão bonito. Ela pensou enquanto observava a chuva cair da grande janela da sala. O jardim de seu avô mal podia ser visto devido à intensidade com que a água caía. As crianças, todas, estavam perambulando pela casa a procura de algo pra fazer e resmungando quando se davam conta de que realmente não tinha nada pra fazer.
Livros de colorir, gibis, fitas de vídeos e jogos de tabuleiros, todos espalhados pela sala, naquela bagunça comum de criança. Os meninos tentavam fazer com que o gato andasse no caminhãozinho. Enquanto as meninas tentavam vesti-lo com algum vestido de boneca.
Justine observava tudo aquilo sustentando um sorriso. Esses dias chuvosos a lembravam de quando era criança. Ela costumava fazer a mesma coisa, espalhar seus brinquedos, tentar vestir o gato, sair perambulando pela casa procurando algo com que se entreter. E, quando o cheiro de bolinho de chuva invadiu suas narinas, sem nem ao menos lhe pedir permissão lágrimas ameaçaram cair de seus olhos – sua mãe era quem costumava fazê-los. Era a alegria das tardes chuvosas. Macios, cheirosos e com a quantidade certa de açúcar e canela. Para acompanhar, o chocolate quente mais delicioso do mundo.
- O que foi Justine? – Um dos meninos perguntou quando notou o olhar molhado da prima.
- Nada querido. Você sentiu esse cheiro? – Ela perguntou colocando-o em seu colo. O menino fez que sim com a cabeça e sorriu, entendendo o que aquele cheiro significava.
- A vovó está fazendo bolinho de chuva! – Ele falou animado e saiu correndo para contar as outras crianças.
Justine sorriu com a alegria que tinha tomado conta da sala, que segundos atrás suportava somente o barulho causado pelos miados do gato, que agora ameaçava arranhar qualquer pessoa que se aproximasse dele. Ela se levantou e caminhou até o rádio, colocando um velho disco dos Beatles que as crianças gostavam – porque tinha um grande submarino amarelo na capa – e depois foi para a cozinha fazer companhia a avó.
A cozinha era o lugar favorito da casa de todo mundo. As crianças gostavam de lá porque eram espertas o suficiente para saber que, em alguma porta dos diversos armários espalhados por lá, tinha um paraíso de chocolates, balas e biscoitos, e mesmo que elas fizessem turnos para descobrir onde estava essa porta, elas não a haviam encontrado ainda (o que não sabiam é que Justine guardava os doces na prateleira de livros na sala, jamais pensaram em procurar lá), já os adultos, ou aqueles que se consideravam adultos, gostavam da cozinha porque sabiam que em dado momento um café fresquinho sairia, seguido de bolo e quem sabe, se o avô estivesse de bom humor, uma boa conversa jogada fora regada a cigarros.
Justine se jogou na mesa e se pôs a folhear o livro de receitas que sempre ficava por lá. Aparentemente a avó nem tinha notado sua presença, então ela continuou em silêncio. O livro era uma peça rara e muito estimado naquela família. A maioria trabalhava com comida ou gostava simplesmente de cozinhar. Para Justine, aquilo era sua bíblia e o maior responsável pelo seu sucesso.
- Oh… Justine, não ouvi você entrar. Por que a sala está tão barulhenta? – A avó perguntou desconfiada. – Hum… Não me diga que eles descobriram que eu fiz bolinho de chuva. – Justine fez que sim com a cabeça. – Droga, eu queria fazer sossegada, daqui a pouco vai ter um enxame me pedindo um pedacinho e quando eu me der conta não vai sobrar mais nada.
- Acho que não. Eu coloquei Beatles pra eles ouvirem e, além disso, acho que eles estão muito ocupados com o gato.
- Sei, e você, por que não está lá ocupada com o gato?
- Bom, tirando o fato que eu tenho vinte anos, o gato já estava ficando arisco. Não queria que ninguém chegasse perto.
- Entendi. E o trabalho, você não vai hoje?
- Não. Eles não precisam de mim hoje.
- Ah…
As duas ficaram em silêncio ocupadas com seus pensamentos. Justine folheando o livro e lembrando-se do dia da festa de Anabel e a avó concentrada em fazer bolinhas perfeitas com a massa do bolinho de chuva.
A porta da cozinha abriu e por ela entraram seu avô, seu primo Jorge e o garoto que não saía da cabeça de Justine fazia duas semanas. Os três estavam encharcados, mas mesmo assim sustentavam um enorme sorriso no rosto.
- Sai! – A avó gritou escandalizada. – Eu acabei de limpar esse chão e vocês entram com os pés molhados. Onde já se viu. Antonio, não fique ai parado, você também Jorge, e dê uma toalha ao seu amigo!
Justine ainda estava tentando assimilar que Joaquim estava parado bem na sua frente. Durante duas semanas ela aguardou ansiosamente que ele entrasse em contato. Uma mensagem através de Jorge serviria, mas ele não disse nada, não telefonou e nem deu sinal de vida. E agora ele estava parado bem na sua frente e tudo que ela podia pensar era no quanto ele ficava bonito molhado.
- Oi Joaquim. – Ela falou sem pensar e instantaneamente ficou vermelha. Nem deu tempo de ele responder e ela se levantou para pegar toalhas.
A sala continuava uma bagunça, mas pelo menos as crianças tinham dormido. Justine pôde sorrir com isso. Yellow Submarine era perfeito pra fazer com que eles se acalmassem.
Ela demorou o máximo possível para ir até o armário do corredor, implorando para que a vermelhidão em seu rosto passasse ou para que, pelo menos, ele tivesse ido embora. Quando retornou a cozinha viu que ele continuava ali. Se sentindo derrotada entregou a toalha a cada um deles e se sentou.
- O que foi Justine. Você está estranha? – O avô perguntou.
- Não é nada. Só estou cansada acho.
- Sei.
Se sentindo totalmente desconcertada, Justine resolveu ir fumar um cigarro lá fora. A casa tinha uma varanda coberta e a chuva já tinha diminuído um pouco, então ela nem se molharia.
- Vô, onde você guardou o cigarro? – Ela perguntou se levantando e vestindo uma capa de chuva rosa um pouco pequena pra ela.
- Eu tenho aqui no me bolso. – Quem respondeu foi Joaquim, que se levantou e parou ao seu lado. – Eu te acompanho. Justine sorriu se virou para a porta e fechou os olhos bem forte, implorando – e forçando – para não ficar vermelha.
Os dois saíram para a varanda e se sentaram no balanço, que estava levemente molhado, mas nenhum dos dois ligou. Justine se sentou relativamente afastada dele, não tinha a mínima idéia do que dizer então se limitou a pegar o cigarro que ele oferecia. Acendeu e deu uma tragada bem rápido, tudo para não falar.
- Então… – Joaquim começou. Justine deu um sorriso amarelo.
Aparentemente isso fez com que Joaquim perdesse a coragem de falar e ele se pôs a somente fumar e observar o jardim. Justine, como a pessoa descontrolável que era – ou talvez fosse a convivência com as crianças – começou a rir descontroladamente.
- O que foi? – Ele perguntou surpreso.
- Nada, acho que é só um espasmo. Sério. – Ela respondeu gargalhando. Obviamente ele começou a rir também e, quando eles viram, já estavam se beijando, os cigarros esquecidos.
- Justine? – Uma voz de criança chamou, mas ela ignorou. – Justine?
- Hum… – Quando ela virou se deparou com Anabel, que sorria enquanto chupava o dedo. – Sim! Anabel!
- A vovó disse que o bolinho ta pronto.
Justine sorriu. Olhou para Joaquim e ele lhe retribuiu o sorriso, além de lhe dar mais um beijo. Eles se levantaram e entraram na cozinha, que agora cheirava completamente a bolinho de chuva, canela, açúcar e chocolate quente. As crianças já estavam amontoadas em cima dos bolinhos e, quando seus olhos se cruzaram com os da avó, essa lhe lançou um sorriso afetado.
Justine adorava tardes chuvosas.


Julielen Fernandes

 
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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 13/05/2011 22:32  Atualizado: 13/05/2011 22:32
 Re: Tarde Chuvosa
QUANTA MARAVILA NESES ENCANTO DE TEXTO, DEIXO MEU ABRAÇO.

MARTISNS

Enviado por Tópico
AnnaCarvalho
Publicado: 14/05/2011 01:55  Atualizado: 14/05/2011 01:55
Da casa!
Usuário desde: 29/10/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 437
 Re: Tarde Chuvosa
Ô florzinha até tentei comentar tua poesia mas com essa letrinha...
Pena, quem sabe consigo ver na próxima, ok?
Beijos,
Anna.

Enviado por Tópico
GabiCurcio
Publicado: 14/05/2011 16:38  Atualizado: 14/05/2011 16:38
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 Re: Tarde Chuvosa
amei bjs