Rectas intermináveis que medem o pensar na espera dos quilómetros que se pensa ultrapassar entre uma meditação e outra que vem já ali, no dobrar da curva que se segue, interregno de frieza no tempo de firmeza dos arreios aos cavalos que as marcas dizem que o veículo tem. Curva feita, o relaxe instala-se de novo, olhos postos na neblina de calor ao fundo do asfalto na camuflagem perfeita da lomba traiçoeira. Nas bermas debruadas a capim seguem os meninos de cadeiras de plástico na cabeça, os que têm chinelos, os que não têm não levam cadeiras, seguem a viagem livre pelas bermas do destino sem poiso para a planta do pé nem esperança de sentar o cós em algo menos duro que o asfalto quente que pisam.
Alguns esticam a mão timidamente na tentativa de encurtar passos às maltratadas pernas pelo calor do asfalto, o pó dos caminhos e dos insectos sem dó. Um deles, o Francisco sentei-o um dia na pendura da incerteza que é o meu banco do lado face à aceleração e às curvas traiçoeiras. Perguntou-me se podia ser meu amigo, respondi-lhe que sim na ignorância que a amizade dele faz-me muito mais bem a mim, do que a minha a ele. Trocamos contactos, eu dei-lhe o meu número, ele não tem telefone, deu-me o da mãe. No afã de ultrapassar as curvas que a vida me deu não mais me lembrei do Francisco.
Hoje ele ligou-me, precisou recorrer a alguns exercícios de memória para me lembrar dele, mas lembrei-me finalmente, até dos sonhos que me transmitiu nos quilómetros que o separavam da escola, que demoraram de carro vinte minutos a percorrer.
Não, não estava a precisar de nada. Não, não queria nada… Tão só saber se eu estava bem!