Sonetos : 

DESENCANTO

 
Tags:  Marcos Loures    Soneto Loureano  
 
111

Não me cabe conduzir
Este mundo de tal forma
Que tentando outro porvir
Encontrara em vã reforma
O caminho a prosseguir
Nesta angústia que deforma.

Reunindo o quanto possa
E talvez já nada reste
O meu mundo, a sorte nossa
O cenário mais agreste
Onde quis e nada endossa
A visão clara e celeste.

E se vejo ou não o quanto
Bebo apenas desencanto.

112

Na palavra mais venal
No sentido onde disperso
O resumo tal e qual
Tento ousar em tom diverso
Do que pude em ritual
Em tormentos, quando verso.

Resumindo o meu caminho
Onde nada se fez tanto
O meu passo mais daninho
Garantindo o ledo pranto
E bebendo deste vinho,
Sei do todo em vão quebranto

Resplandece esta ilusão
Em sobeja dimensão.

113

Nada mais se vendo enquanto
O que pude não viera
A verdade aonde espanto
Derradeira primavera,
O meu verso noutro canto,
A palavra mais sincera.

Resumindo o que não vivo
E sequer possa encontrar
Num momento onde me privo
Da vontade de chegar
O meu passo mais altivo
Já não tem qualquer lugar,

E sem porto, o meu navio
Segue em louco desvario.

114

Marcas destas noites vãs
Entre tantas que busquei
As angústias tão malsãs
Entre os rumos mal tomei
As palavras mais louçãs
Dominando a velha grei.

No momento onde a clausura
Dita o rumo e nada traz,
A verdade que tortura
Deixa a sorte para trás.
E a incerteza se perdura
Mostra um rumo atroz, mordaz,

Restaurando o que se quis
Já não possa ser feliz.

115

Destes louros da vitória
Que sonhara no passado,
Emoção se torna escória
E o meu tempo desolado,
Não redime esta memória
Nem progride; então me evado.

Esquecera qualquer sonho
E vagando em noite escassa
A palavra onde a proponho
Na verdade nada traça
Tão somente este enfadonho
Caminhar em leda praça.

Marcas de outras eras trago
E cultivo cada estrago.

116


Arremato cada verso
Onde pude ser além
Do cenário mais disperso
Quando o nada nos convém
E se possa eu desconverso
O vazio sem meu bem.

Restaurando o que inda pude
Apresenta-se o final
E meu canto mesmo rude,
Desarvora bem ou mal,
E tentando outra atitude
Vejo a antiga, tão banal.

Escusando quem me fira,
Apagando a torpe mira.

117

Marejando sem cuidado
Com a fúria do oceano,
Onde louco, agora invado,
E mostrasse novo dano,
O meu canto desolado,
Dele mesmo não me ufano.

Resta apenas o que eu traga
No meu peito sem temer,
A explosão audaz e vaga
Noutro rumo a me perder,
Afiando cada adaga
E sabendo ora prever

O momento sem palavra
Onde o tempo a morte lavra.

118

Na medida do possível
Tento acreditar no sonho,
E se fosse tão mais crível
O cenário que componho,
Num momento mais plausível
Outro enredo ora proponho.

Versifico quando busco
Dos meus ermos um sinal,
Que pudera ser tão brusco
E deveras sensual,
Novamente se me ofusco
Tento um novo ritual.

Esquecendo o que não levo
Meu amor não foi longevo.

119

Açodando o que vivera
Com palavras mais sutis
O pavio aceso e a cera
Pouco a pouco já desfiz,
Onde a sorte concedera
Eu jamais serei feliz.

Expressando em verso atroz
O que nunca mais se visse,
Espalhando ao longe a voz,
Anuncia-se a mesmice
E o meu canto em ledos nós
Nem sequer o sonho ouvisse.

Resplandece o meu futuro
Onde em nada me asseguro.

120

Bebo e tento num instante
Desvendar este infinito
O meu passo não garante
Nem sequer o velho rito
E se molda num rompante
O que possa e necessito.

Esbarrando no vazio
No momento mais cruel
Onde o rumo em desafio
Faz a vida em carrossel,
Tramo o quanto ora desvio
Num sombrio e ledo céu.

A palavra não nos cura,
Traz somente esta tortura...
 
Autor
MARCOSLOURES
 
Texto
Data
Leituras
720
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
0 pontos
0
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.