I
Estou viciado no ópio,
Naquele vil fumo ondulante.
É constante este sacrifício
Em que vivo em cada instante
Da minha vida! Vivo cansado,
Perdido por entre a escuridão.
Sou como uma sombra do passado,
Um velho corpo sem coração.
Mas o opiário é forte
E torna mais doce a nossa morte
E menos real a nossa vida.
Vejo a ilusão prometida
Secando o sangue de minhas veias
E eu, preso a humanas teias,
II
Sinto tonturas estonteantes;
Sinto espasmos incoerentes.
Sei que nada sou que era antes
E que vejo por olhos ausentes.
Que a minha vida era outra, mas
A tristeza tomou posse de mim,
Fez-me andar sem olhar para trás,
Fez-me desejar o meu triste fim.
Minhas veias abertas derramam
O liquido da vida e clamam
Põe algum ópio ou morfina
Que retire a dor da minha sina.
Vejo o fumo em que se torna a vida
E vejo que a minha ‘stá perdida.
III
A vida tenho desperdiçado,
Co’o fumo do prazer eu perdi-a.
Olho para trás, pr’o meu passado,
E vejo que a bela luz do dia
Foi sempre como uma vil miragem
P’ra mim, sempre me queimou os olhos!
Não me recordo da imagem
Das mais belas flores, em mil molhos
Nem dos olhos de quem eu conheço.
Olho p’ro céu e, louco, eu peço
Um fim rápido pra o corpo meu.
O fogo apagou-se, mas ardeu
O coração. Vejo o sentido
De tudo e sei que ‘stou perdido.