''Olha para mim'' diz o espelho. De sorriso triste de mal amado. Deseja conhecer o mundo já explorado. Deseja ser melhor que eu...
Mas como? Pergunto eu aos densos olhos, que me dominam, riem e me apontam, morrendo eu por dentro.
Essas são as minhas certezas...
Se me perguntarem porque sou assim, encolho os ombros. Pois não pedi para estar aqui. Nem o ser mais complexo o pediu. E mesmo assim ele vive, vive morrendo por curiosidade da morte.
E ainda me pedem que use metáforas e ironias, que construa os versos sob arcaicas regras! E dizem que tudo em mim é planeado... Enganam-se! Tudo em mim é espontâneo, apesar de eu pensar que sou eu que construo o meu caminho...
Mas eu sou de tal modo livre, como a Natureza, que dou por mim no denso Inverno fugindo em lágrimas. Sou o verão que ama mas sofre por não ser amado. Sou o Outono, rebelde com as folhas e celestial com o vento. E, por fim sou a Primavera! Floresço, dia ante dia, e morro, hora ante hora...
Mas o espelho rende-se à inveja! E corta-me em feridas. Pequenas imperfeições. Dilúvio de chamas na compreensão. Vejo o meu corpo, autónomo no espelho! Ele olha-me com ódio! Ele rasga-me as viceras, ele destrói o pouco de paz que em mim existe! Ele tira-me a vida! E quer que eu viva nas suas regras insignificantes!
Mas nunca! Nunca mais serei eu enquanto tu existires... Nunca mais olharei para ti, eu.
Pedro Carregal