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Deixa que me abisme

 
Deixa que me abisme
na falésia íngreme do desterro,
que seja sangue putrefacto
no mar aberto do silêncio.

Este cansaço
com que me deito e que me acordo,
este eco a vibrar vazio dentro de mim,
esta vontade mórbida de me retalhar em espinhos,
nos silvados dos teus e meus caminhos,
de morder pétalas rubras de rosas,
as que antevejo nas minhas mãos depostas
sobre o peito
e, amado, num momento de delírio póstumo,
ser de ti, elo perdido entre a tília e o jasmim…

Deixa que me assombre e tombe
no avesso do verbo em que te inscrevo,
no verso pérfido que me degola a fala
que me estripa a alma na mais pálida escuridão.

Mas deixa...

E que, no jardim florido desta dor,
renasçam cinzas, sílicas, poeiras cósmicas.

Renasçam carícias em forma de forjas
e que, em inflamação acesa,
tacteie a pele em urdidura indómita,
em chagas,
nas mais profundas queimaduras,
estas que em vida me consomem e me imolam
na cegueira que me coabita

… para que me esqueça, amado,
quem sou, quem fui,
por fim.


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Autor
Mel de Carvalho
 
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Enviado por Tópico
Tânia Mara Camargo
Publicado: 20/09/2007 19:28  Atualizado: 20/09/2007 19:28
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Usuário desde: 11/09/2007
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Mensagens: 4246
 Re: Deixa que me abisme
Aplausos, que forte o teu poetar, adorei!