O tica
Damião abriu os olhos ao ouvir o galo cantando.Não é possível, pensou, parece que deitei agora e já tenho que levantar...Virou pro outro lado, mas lembrou que no dia anterior já recebera uma bronca do patrão, se esticou ainda na cama e resolveu levantar.- Êita vida! Melhor levantar e correr, pra não chegar atrasado.
Tinha de atravessar a cidade, pra chegar até a padaria, onde trabalhava de entregador de pão. Gostava do serviço não gostava mesmo era de acordar cedo. Depois tinha que passar em frente ao hospício e isto sempre o amedrontava. Tinha receio de encontrar algum maluco pelo caminho.
- Arre égua, melhor não pensar nestas coisas que acaba atraindo.
Passou, uma água no rosto, vestiu a camisa e lá se foi. Morava sozinho e estava pensando em arranjar uma cabocla pra dividir a vida com ele. Viver sozinho era muito chato, por isso demorava na rua e acabava dormindo tarde, e se atrasando para o trabalho.
Ao chegar à padaria, o patrão, já estava de cara amarrada.
-Bom dia, seu Jonas, me adesculpe, o atraso.
O patrão nem respondeu, lhe empurrou o cesto de pão, e Damião sem graça, o colocou na cabeça e se foi. – É melhor cortar caminho, pois a freguesia vai reclamar do atraso, gritou o patrão.
Saiu apressado, gritando: - olha o pãooooooooooooooo tá fresquinho.
Suado, caminhava e pensava, que para chegar a tempo, na casa da d. Zulmira, uma velha encrenqueira que reclamava de tudo, precisava passar em frente ao hospício. - Ai, que Deus me proteja.
Quase correndo, percorria as ruas, gritando, numa coreografia engraçada. De longe viu o prédio sinistro, tomara que não tenha ninguém no portão...Olhava pros lados desconfiado, e quando já estava passando da casa de doidos, era assim que se referia ao hospício, um homem pula o muro. Damião, apavorado, começou a correr de verdade e o homem corria também, entrava em ruas saia em becos e nada do seu perseguidor desistir. As pernas já não aguentavam, o suor escorria por seu rosto, quase o deixando sem visão. De vez em quando olhava para trás, e nada, o homem não desistia. Damião, já nem pensava no mau humor da d. Zulmira, queria era se ver livre, do maluco. Já estava botando a língua pra fora de tanto correr e aí se deu o desastre, tropeçou numa pedra, caiu derrubando todo o cesto de pão. Por sua cabeça passou todas as cenas de horror... Rezou uma Ave Maria e encomendou a alma a Deus.
O homem se aproximou exausto e o tocou: É você, o Tica.
Nota: Tique-tá ou Tica é uma brincadeira infantil onde a criança corre até tocar a outra criança, que depois de tocada, passa a ser o perseguidor.
jacydenatal