Eu sempre tive medo de ficar preso no elevador, mas esse medo se intensificou quando eu descobri que aquele botão de “alarme” é meramente ilustrativo. Eu descobri isso por acaso, em um dia que estava com vontade de perturbar os vizinhos e passei quase 5 minutos apertando aquele botão. Saí do elevador com um ar de malandro, jurando que havia acordado todos no prédio, mas o porteiro me disse que só dava para ouvir dentro do elevador mesmo, que era uma forma de diminuir o pânico em quem estivesse preso. Falando isso, ele aumentou o meu pânico. E se eu ficasse preso no elevador? Os celulares costumam ficar fora de área lá dentro.
Passei então a fazer experimentos. Pedi pra minha irmã mais nova ficar no térreo, enquanto eu fingia que estava preso no elevador. Bati na porta um milhão de vezes e gritei com tanto força que fiquei com falta de ar – sou asmático – e tive que fazer nebulização. Mas sabe o que é pior? Minha irmã não ouviu nada. E se fosse real? Eu ficaria preso no elevador até alguém ter a idéia de usá-lo? Se bem conheço as pessoas no meu prédio, quando elas vissem o elevador parado em um só andar, pegariam o outro elevador – o de serviço. Eu podia passar D-I-A-S preso no elevador, sem comida, sem água, e SEM AR! Depois desse dia, eu decidi que nunca mais andaria de elevador.
Passei a subir e descer os oito andares de escada, e confesso que meu condicionamento físico aumentou um pouco. Mas um dia eu subi correndo (estava apertado para ir ao banheiro) e tive crise de asma no meio da subida. Comecei a ficar tonto, minha vista embaçou e eu pensei que fosse morrer SEM AR – e mijado. Tentei gritar, mas ninguém ouviu porque as escadas são muito isoladas do resto do prédio. Eu fui encontrado desmaiado, pelo porteiro, quando ele estava recolhendo o lixo dos apartamentos, e fui levado ao hospital em estado crítico.
Depois do acontecido eu me mudei para uma casa - onde não precisava subir escadas ou elevadores - e passei a levar na bolsa o meu kit de nebulização, apitos de socorro e mantimentos como água e cereais, para o caso de eu ficar preso em algum elevador empresarial. Mas morar em casa tem seus problemas. Como ninguém entendia o meu medo de elevadores, eu tive que me mudar sozinho. Não havia porteiros, portanto, a segurança era pouca. Eu ouvia os barulhos na rua e ficava sempre tenso, pensando que a qualquer momento minha residência poderia ser invadida, saqueada e usada de cativeiro para mim, até que algum familiar meu pagasse um resgate.
Resolvi tomar uma providência preventiva. Liguei para os meus pais, passei a senha da minha poupança pessoal e autorizei no banco uma transação sem cartão; disse que eles poderiam limpar a conta em caso de seqüestro. Mandei construir um muro em volta da casa e coloquei meio metro de cerca elétrica acima dele. Troquei meu Honda Cívic por um Celtinha vermelho (para não chamar à atenção dos assaltantes) e cancelei as linhas telefônicas para que ninguém grampeasse minhas ligações e descobrisse todos os meus passos. Coloquei alarme no portão da frente e uma grade na porta de dentro, além de ter instalado janelas - que não abrem - feitas de vidro blindado, também adquiri porte de arma. Comecei a me sentir realmente seguro na minha casa, tanto que me demiti do meu emprego e passei a trabalhar em casa, escrevendo crônicas e enviando para jornais – pela internet.
Um dia o alarme tocou no meio da noite. Eu fiquei afobado na mesma hora, liguei para a polícia e eles chegaram quinze minutos depois. Quando abri a porta, não eram policiais, ou eram policiais usando mascaras de meia com furo nos olhos, mas eram três e eles invadiram minha casa, saquearam tudo e me fizeram de refém. Meus pais estavam viajando e minha irmã pensou que fosse brincadeira quando eu liguei do meu celular – cuja bateria acabou quinze minutos depois do incidente me impedindo de fazer qualquer outra ligação. No final, os não-policiais/policiais bandidos desistiram do resgate, me trancaram dentro da minha própria casa e fugiram com tudo que eu tinha de valor (inclusive o celular descarregado). Por sorte deixaram meu nebulizador, porque todo aquele estresse me fez entrar em crise asmática.
Fui encontrado pelos vizinhos uma semana depois, eletrocutado nas cercas acima do muro. É que minha casa andava cheia de baratas, e eu fiquei com medo que elas se unissem para me atacar e entrassem em todos os meus orifícios. Uma delas estava se aproximando, quando eu decidi que nós não podíamos permanecer no mesmo ambiente. Pensei em matá-la, mas ela tinha asas e eu estava em desvantagem. Saí correndo e pulei o muro, mas na agonia esqueci de desligar a eletricidade.
Mas agora está tudo bem, estou morando em uma clínica, meu quarto tem paredes de plástico e eu posso ver qualquer um que se aproxima por uma câmera escondida na porta. Não uso objetos cortantes e não como coisas redondas que possam me engasgar, nem coisas pontudas que possuam perfurar minha garganta. Na verdade, eu só tomo líquidos...