Luso-Poemas
 
Poemas : 

Não há que se dizer mais nada

 


O fogo que há em ti
É o mesmo que me queima.
Em mim pode agitar a alma
E atormentar os pensamentos
Em ti pode ser apenas
Uma branda chama apática.
Pode ser que em ti
Não consiga aquecer a melancolia
E nem iluminar-te os olhos,
E em mim seja calor eufórico
A brasa da minha língua,
Mas sempre será o mesmo fogo.
O mesmo que na natureza
Vai adubar a terra
Onde então a semente
Estabelecerá sua morada.

A terra que há em ti
É também a mesma que me firma.
Em mim pode ser ressequida
E devorar qualquer umidade.
Em ti pode ser fecunda
Casa de todo verde.
Pode ser que em ti
Seja estrada que encaminhe
E te encha de viço os lábios,
E em mim seja apenas deserto
A sede na minha boca,
Mas será sempre a mesma terra.
A mesma que na natureza
Vai abrigar a pedra
Onde a água cristalina
Brotará como encantada.

A pedra que há em ti
É a mesma em que me assento.
Em mim pode ser início
A base da fortaleza.
Em ti pode ser estorvo,
Lápide indesejada.
Pode ser que em ti
Seja peso sobre os ombros
Ou lhe feche as narinas,
E em mim seja solo seguro
Onde não se conhece a tristeza.
Mas será sempre a mesma pedra.
A mesma que na natureza
No âmago da sua dureza
É berço de toda água.

A água que há em ti
É a mesma que me sacia.
Em mim pode ser escassa
A fonte de todo medo.
Em ti pode ser que farte
Dádiva pura e sagrada.
Pode ser que em ti
Seja rio caudaloso
Ou mar de completa abundância,
E em mim seja ínfima gota
Inexpressiva em meu deserto.
Mas será sempre a mesma água.
A mesma que na natureza
Vai hidratar a semente
Da árvore tão esperada.

A árvore que há em mim
É a mesma que em ti aflora.
Em mim pode ser frondosa
Sombra ao meio-dia.
Em ti pode ser esquálida,
Frágil, mero caniço.
Pode ser que em ti
Seja baixa e retorcida
Ou cacto de pura ira
E em mim seja forte e frutífera
Esteio da minha rede.
Mas será sempre a mesma árvore.
A mesma que na natureza
É mais suscetível ao fogo
Quanto mais é ressecada.

E agora, se me permite,
Não há que se dizer mais nada.
Basta só entender que a vida,
Em nuances repartida,
Nunca foi fragmentada.



Frederico Salvo

Direitos efetivos sobre a obra.
http://pistasdemimmesmo.blogspot.com/

 
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Enviado por Tópico
Tânia Mara Camargo
Publicado: 01/03/2011 01:05  Atualizado: 01/03/2011 01:05
Colaborador
Usuário desde: 11/09/2007
Localidade:
Mensagens: 4246
 Re: Não há que se dizer mais nada
dizer o quê, só me resta aplaudir!
belissímo!
bjs


Enviado por Tópico
varenka
Publicado: 01/03/2011 01:14  Atualizado: 01/03/2011 01:14
Colaborador
Usuário desde: 10/12/2009
Localidade:
Mensagens: 4210
 Re: Não há que se dizer mais nada
Frederico,

Gradiosa poesia!!!Bravo!!!Bravo!!!


Mil beijos


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 01/03/2011 01:29  Atualizado: 01/03/2011 01:29
 Re: Não há que se dizer mais nada
Ahhh....Não tem nada mais pra ser dito mesmo Fred. Tudo o que for dito será muito aquém da beleza dele, da construção, da idéia, da escolha das palavras. Não tem como dizer nada mesmo. Só apreciar e procurar compreender como se sobressaem os elementos naturais e como estão presentes em tudo. Pra mim é perfeito, envolvente, correto e comovente. Um dos melhores. Parabéns!!!!
Carinho sempre,
Má.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 01/03/2011 02:36  Atualizado: 01/03/2011 02:36
 Re: Não há que se dizer mais nada
'Não há que se dizer mais nada'

é um poema completo, sem frestas para senãos, portanto; belo

abração Fred.

zé

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 01/03/2011 10:54  Atualizado: 01/03/2011 10:54
 Re: Não há que se dizer mais nada
LEIO EM SILÊNCIO QUE MARAVILHA DIZER MAIS O QUE, UM ENCANTO DE POEMA.

MARTISNS

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