Esta é a história de duas criaturas de Deus
que viviam numa floresta distante há muitos anos atrás.
Eram elas, um cavalinho e uma borboleta.
Na verdade, não tinham praticamente nada em comum,
mas em certo momento de suas vidas
se aproximaram e criaram um elo.
A borboleta era livre,
voava por todos os cantos da floresta
enfeitando a paisagem.
Já o cavalinho, tinha grandes limitações,
não era bicho solto
que pudesse viver entregue à natureza.
Nele, certa vez, foi colocado um cabresto
por alguém que visitou a floresta e a partir daí
sua liberdade foi cerceada.
A borboleta, no entanto,
embora tivesse a amizade de muitos outros animais
e a liberdade de voar por toda a floresta,
gostava de fazer companhia ao cavalinho,
agradava-lhe ficar ao seu lado e não era por pena,
era por companheirismo, afeição,
dedicação e carinho.
Assim, todos os dias, ia visitá-lo
e lá chegando levava sempre um coice,
depois então um sorriso.
Entre um e outro ela optava por esquecer o coice
e guardar dentro do seu coração o sorriso.
Sempre o cavalinho insistia com a borboleta
que lhe ajudasse a carregar o seu cabresto
por causa do seu enorme peso.
Ela, muito carinhosamente,
tentava de todas as formas ajudá-lo,
mas isso nem sempre era possível
por ser ela uma criaturinha tão frágil.
Os anos se passaram e numa manhã de verão
a borboleta não apareceu para visitar o seu companheiro.
Ele nem percebeu,
preocupado que ainda estava
em se livrar do cabresto.
E vieram outras manhãs e mais outras
e milhares de outras, até que chegou o inverno
e o cavalinho sentiu-se só
e finalmente percebeu a ausência da borboleta.
Resolveu então sair do seu canto e procurar por ela.
Caminhou por toda a floresta a observar
cada cantinho onde ela poderia ter se escondido
e não a encontrou.
Cansado se deitou embaixo de uma árvore.
Logo em seguida um elefante se aproximou
e lhe perguntou quem era ele e o que fazia por ali.
-Eu sou o cavalinho do cabresto e estou a procura
de uma borboleta que sumiu.
-Ah, é você então o famoso cavalinho?
-Famoso, eu?
-É que eu tive uma grande amiga
que me disse que também era sua amiga
e falava muito bem de você.
Mas afinal,
qual borboleta que você está procurando?
-É uma borboleta colorida, alegre,
que sobrevoa a floresta todos os dias
visitando todos os animais amigos.
-Nossa, mas era justamente dela
que eu estava falando. Não ficou sabendo?
Ela morreu e já faz muito tempo.
- Morreu? Como foi isso?
-Dizem que ela conhecia, aqui na floresta, um cavalinho,
assim como você e todos os dias
quando ela ia visitá-lo, ele dava-lhe um coice.
Ela sempre voltava com marcas horríveis
e todos perguntavam a ela quem havia feito aquilo,
mas ela jamais contou a ninguém.
Insistíamos muito para saber
quem era o autor daquela malvadeza
e ela respondia que só ia falar das visitas boas
que tinha feito naquela manhã
e era aí que ela falava com a maior alegria de você.
Nesse momento o cavalinho
já estava derramando muitas lágrimas de tristeza
e de arrependimento.
- Não chore meu amigo,
sei o quanto você deve estar sofrendo.
Ela sempre me disse que você era um grande amigo,
mas entenda, foram tantos os coices
que ela recebeu desse outro cavalinho,
que ela acabou perdendo as asinhas,
depois ficou muito doente, triste,
sucumbiu e morreu.
-E ela não mandou me chamar
nos seus últimos dias?
-Não, todos os animais da floresta quiseram lhe avisar,
mas ela disse o seguinte:
“Não perturbem meu amigo com coisas pequenas,
ele tem um grande problema
que eu nunca pude ajudá-lo a resolver.
Carrega no seu dorso um cabresto,
então será cansativo demais pra ele
vir até aqui.”
Você pode até aceitar os coices que lhe derem
quando eles vierem acompanhados de beijos,
mas em algum momento da sua vida,
as feridas que eles vão lhe causar,
não serão mais possíveis de serem cicatrizadas.
Quanto ao cabresto que você tiver que carregar
durante a sua existência, não culpe ninguém por isso,
afinal muitas vezes, foi você mesmo
que o colocou no seu dorso.
Silvana Duboc, em bela fábula sobre a vida.