O sol chegou deslizando pela montanha abaixo
E a sombra foi ficando exprimida entre o córrego e a montanha oposta
Como tinham montanhas, todas lindas !
De repente a sombra acabou e o sol tomou conta dos dois lados
Era o sinal iluminado de mais um dia, todos os pássaros cantaram
Os bois espreguiçavam e rumavam para os pastos
Os cavalos que dormiram bem à noite começaram a trabalhar
Era dia lindo de sol, de muito trabalho, suor pra todo lado, de todos
Meu pai ensinava a todos, como sabia, e todos aprendiam agradecidos
Pai nosso e ave Maria, antes da lida, do almoço e jantar e no fim do dia
Minha mãe, com todo pureza e beleza juntas, cuidava da casa e dos filhos
Levantava bem cedo, trabalhava muito e dormia depois de todos
Passaram-se os anos, meus pais envelheceram e cansados pararam
E tudo parou com eles, tudo acabou e os homens mudaram, morreram
Nunca mais vi aquele sol lindo do meio dia, nem a sombra do engenho
Nem o suor no rosto do meu pai, nem o lenço na cabeça de minha mãe
Pus o pé na estrada, com uma saudade danada e um cheiro de mato
Fui morar na cidade grande, sem ninguém pra me orientar e um calo na mão
Deixei minha mãe naquela fazenda, cuidando do meu pai e de meus três irmãos
E Deus velando por nós seis ainda me faz escutar a voz do meu pai me chamando bem alto
Não sabia que aquele sol que deslizava montanha abaixo pela manhã
No final do dia cansado subia a outra montanha e outra montanha, até sumir no céu
E até hoje ilumina meu pai e muitos dos homens que na fazenda viveram
É bem assim: o sol nos mostra o caminho durante o dia e ilumina a vida durante a noite
José Veríssimo