[Entardece no Arraial do Barreirão... Caminhos de Araguari - MG]
O sino rouco que me entardece
Toca repicando antigas plangências
Capturadas pelos meus sentidos,
Memorações que para sempre ficarão.
Na montanha que azula ao longe,
A estrada de cascalho branco
Que serpenteia, erma, pelas encostas,
É o caminho onde lua escreve mistérios.
A gameleira, de dia, o refrigério da sombra,
De noite, a copa cheia de assombrações.
A revoada de andorinhas na torre da igrejinha
Anuncia uma liberdade além das montanhas azuis.
A ave-maria que se evola para o alto
Conduz-me ao infinito e me convence
De que o céu é tão bom, tão bom
Que até me dá vontade de morrer!
O campanário da igreja é a visão solitária
Do viajante que pára e espia, do alto da colina,
O lugarejo onde a vida — ainda bem! —
Não tem possibilidade alguma de mudar.
Para quem toca o fenômeno desse sino?
Toca para aqueles bois carreiros
Apenas descangados da lida,
E para o burro já liberto do arado.
Toca para onde se perdem os sentidos,
Para o aberto das invernadas,
De onde, o gado manso retorna
Numa melancolia de passo lento;
Toca para o cavaleiro
Que esporeia o animal
Na ânsia de apressar o passo
Para não chegar de noite;
Toca para a corredeira do corgo
Que cantarolou alegrias o dia inteiro,
Mas agora, nas sombras do entardecer,
Murmura-me os medos da noite;
Toca para alongar a espera ansiosa
Por quem ainda não chegou da cidade...
Toca até mesmo para quem nem liga
Para o choro do toque do sino.
No arraial que escapou das águas brabas,
Ainda o sino tocará como antigamente,
Chamando a todos para o concerto
Eternamente impossível de Céus e Terra!