TABACARIA
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Álvaro de Campos: "Tabacaria" (excerto)
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serei o que de mim fizer
sem o ser nunca:
por cada janela olhada
por dentro,
tão dentro de mim,
em mim tão aberta
e à vez tão fechada
há uma fachada de branco com a língua pintada
cheia de gente e olhos sem fim.
alexandra cruz mendes
cruz mendes