Sonetos : 

MEUS SONETOS VOLUME 031

 
Tags:  Marcos Loures Sonetos  
 
1


Ao ver tantas desgraças que acontecem
Percebo quanto o amor foi esquecido.
Bocas que se maldizem sempre tecem
Desculpas para ofensas. Esquecido
O povo que será dono do céu,
Tão maltratado morre em cada esquina.
Usando de artimanhas como um véu,
A mão que é tão voraz, já discrimina.
O triste, meu querido carpinteiro,
É vermos em Teu nome tanta farsa,
Quem tinha que ensinar ao mundo inteiro,
Odiando, simplesmente se disfarça
E grita contra irmãos, discriminando,
No desamor imenso, vão matando...

2

Ao ver teu nome escrito nas estrelas
Formando constelar conformação
Eu tive já por certo uma impressão
Que um dia eu poderia recebê-las

Ou mesmo até quem sabe enfim cabê-las,
Guardadas toda noite no colchão.
Assim eu me entornando de paixão
Teria a claridade destas velas.

São belas, com certeza, mas não creio
Que possam vir comigo. Tão distantes.
Dois corpos que se fazem como amantes

Não podem com certeza ter receio.
O amor na cobertura ou no recheio
Promete doces, raros, fascinantes...



3

Ao ver teus seios nus o meu desejo
Aumenta pouco a pouco, mil delírios...
Tal avidez me toma quando vejo
Alabastrinos campos, alvos lírios...

Andando pelo quarto, sigo os passos,
Meus olhos vão sedentos o tempo passa.
Sorrindo tão matreira. Estendo os braços,
Mas perco tua imagem na fumaça...

Afago os teus cabelos, num momento,
Percebo que este sonho, uma utopia.
Que não me larga mais o pensamento,
Povoa minha vida em fantasia.

Sentindo já teu hálito, querida,
Tu tomas totalmente a minha vida...


4


Ao ver tua atitude
Negaceando a sorte
Aonde se comporte
O todo que se mude
A vida não me ilude
E sei do mesmo norte
Ainda quando é forte
O tanto quanto pude.
Vestindo a melhor lua
A sorte continua
Pousando noutro encanto
Vestígios de outras eras
E nelas tu temperas
O amor em raro canto.


5


Ao ver tua atitude, companheiro,
Não posso me furtar ao comentário.
Decerto não se sabe por inteiro,
Por isso, eu não serei, assim sectário.

Mas nada justifica uma atitude
Insana, sem qualquer explicação.
Espero que tu penses, logo mude,
Agindo com mais lógica, atenção.

Feriste que jamais te fez o mal,
Palavras; feito faca, sempre cortam.
Agiste como fora um animal,
Será que tantas coisas nunca importam?

Desculpe se te falo essa verdade,
No jumento, menor bestialidade...


6


Ao ver tua beleza sem igual,
qual pedra preciosa, meu rubi,
num rubro mavioso e sensual,
percebo como é bom te ter aqui,

por vezes um amor fenomenal,
mostrando esta alegria que vivi,
teu corpo sedutor, sensacional,
mais belo neste mundo, eu nunca vi.

Vem logo que te espero, não demora,
eu quero te beijar, querida, agora
e ter tua nudez em minha cama,

rolando a noite inteira em tanta fúria,
imersos na lascívia e na luxúria,
rubro rubi, vermelha: intensa chama!


7


Ao ver tua chegada no portão,
Percebo toda a sorte que recebo,
E tenho a maravilha que percebo
Ter sua origem sempre na paixão.

Mais forte vai batendo o coração
No amor que imaginei e que concebo
Marcado por desejo e sedução.
Eu sinto-me querida qual um Phebo

Que encontra uma Afrodite em sua cama,
Vivendo esta loucura que me inflama
Sou um homem feliz, isto eu não nego.

Não tema a solidão, triste quimera,
De novo revivendo em primavera
Num mundo mavioso assim me entrego...


8


Ao ver tua nudez
A diva mais perfeita
Minha alma se deleita
Enquanto em sonho vês
A louca insensatez
Na tez onde se deita
A vida quando aceita
Marcando a placidez.
Ousando muito além
Do quanto a vida tem
E gera a sorte em nós
Vencido pelo vento
O canto aonde eu tento
Desaba em velha foz.


9


Ao ver tua nudez adivinhada,
Desejos incontidos... mil vontades,
A silhueta bela desnudada,
Coração disparando em ansiedades.

Beleza sem igual já desfraldada,
A noite se esfumaça, veleidades,
A lua se derrama na calçada
E adentra em nosso quarto. Claridades.

Percebo em cada véu que vais tirando
A chama do desejo me tomando
Vibrando com loucuras, sempre e mais.

Antes que caia, amor, último véu,
Num salto mergulhando neste céu
Invado com prazer, divino cais...



10


Ao ver tua sobeja
Vontade a se traçar
Ousando a divagar
No quanto se deseja
A sorte que assim seja
Permita o navegar
E trame no luar
Somente o que se veja.
Invisto cada canto
Aonde em paz garanto
O todo enquanto eu pude
Vencer os dissabores
E nisto aonde fores
Trarás a juventude.



11


Ao ver tua nudez sensacional
Rolando em minha cama, convidando,
Chamando para o belo ritual
O fogo vem depressa me tomando.

E na lareira acesa, tantos sóis,
Avanço prazerosas sensações
Por sobre a maravilha nos lençóis
Coberta por teu corpo – tentações.

E seduzido embarco na loucura,
Nada mais me segura, vou inteiro.
Tomado por desejos e ternura
Querendo do prazer o gosto e o cheiro.

E assim em cavalgada, sonho intrépido,
O dia vai passando quente, lépido...


12

Ao viver nosso sonho
Em meio aos vendavais
Pudesse ter a mais
O quanto enfim proponho
E vejo onde me ponho
Tentando entre cristais
Os dias magistrais
E nisto vou risonho
Alçando o quanto possa
Da vida além da fossa
Endosso cada verso
Marcando em rara rima
O quanto dita o clima
E nisto eu me disperso


13

Ao ver um beija flor, nesta manhã,
Lembrei de tua boca junto à minha.
Delícias que vivi em doce afã
Nas asas dessa simples avezinha.

O grande amor, pensei que a gente tinha,
Mas nada disso teve um amanhã.
Morrendo qual a flor que, tão sozinha,
Perfuma simplesmente em vida vã.

Na boca deste pobre passarinho,
O beijo que tentei e não me deste.
Morrendo em tanta sede de carinho;

Relembro nosso amor que já perdi.
A solidão em penas que me veste
Nas penas do destino/colibri...


14

Ao ver uma criança abandonada
Nas ruas das metrópoles, faminta.
Imagem que devia ser mostrada
São cores tão reais que a vida pinta.

Ali, talvez encontre explicação,
Para essa violência que nos toma,
Amar é sempre multiplicação
Não é somente simples como a soma.

Nos braços da criança que se estendem
Pedindo, não futuro, mas presente;
Nos corpos das meninas que se vendem,
Percebo que amizade vai ausente...

No rosto da menina; sempre insisto,
A lágrima chagásica de Cristo...


15

Ao ver você correndo pela casa,
Relembro de meus tempos de criança.
Desenho redivivo na lembrança
Qual fogo que, distante ainda abrasa.

Brincando de carrinho, fantasias
Que o tempo descorou em falsas telas,
Barquinho de papel nas frágeis velas
Descendo na enxurrada, belos dias...

E mesmo quando embirra está feliz.
Depois de perceber cada vitória.
A lágrima no rosto, nunca diz

Da luta já vencida sem vanglória
Percorro em ilusão o velho trilho
Marcado pelos passos de meu filho....


16

Ao ver-te em tua cama, nua e bela,
Meus lábios ansiando te tocar.
Percebo qual voyeur numa janela
Divina expectativa de chegar

E ter nesta nudez que se revela,
A plenitude em gozo, a devorar,
Quem dera se eu pudesse convertê-la,
E tê-la do meu lado a desfrutar

De todas as delícias prometidas,
Sentindo-te em orgástica doçura.
Sorvendo cada gota de teu gozo.

Assim em tuas coxas, distraídas,
As mãos e os lábios plenos de ternura,
Entregues ao prazer maravilhoso...


17


Ao vislumbrar a deusa, agora nua
Meu verso se tornando imperecível
Lembrando de teus olhos vejo a lua
E nela esta beleza inesquecível.

Deitando cada raio sobre a rua,
Na chama que me invade em luz incrível.
O pensamento alcança e assim flutua,
Felicidade, agora, enfim, possível.

Saber do nosso amor, estar liberto,
Sentir o paraíso bem mais perto
Meus sonhos em delírios bons, imersos,

Sentidos tão profanos consagrando
O amor que segue sempre iluminando
Momentos maviosos e diversos...


18

Ao viver o nosso amor
Encontrei felicidade
O meu mundo a recompor
Com total tranqüilidade

Neste sonho encantador
Vou amando de verdade
Com certeza sou feliz
Neste amor que eu sempre quis.

Encontrando a poesia
Nos teus olhos, minha amada,
Sigo ao rumo da alegria

Nesta senda iluminada
Cada verso propicia
A mais bela caminhada.


19

Ao “receber as flores que te dou”
Percebo o teu semblante mais feliz,
O vento da paixão que nos tocou
A cada dia mostra o que se diz

No verso que encantado nos sobrou
Dizendo deste amor, qual aprendiz
Apenas num momento soçobrou,
Mas isso não causou nem cicatriz...

Assim, dois companheiros que se adoram,
E formam irmandade inesquecível,
Meus dias nos teus sonhos se decoram,

Amor que nos uniu, ninguém separa,
E mesmo num buquê tão perecível
Percebo esta alegria, viva e rara...


20


Aonde a minha sorte já se abriga
Encontro todo o bem que desejara.
A mão que com firmeza me antepara
De toda a recompensa desobriga.

Companheirismo assim querida amiga
Uma luz valiosa por ser rara,
Curando quando a vida faz escara
Permite que meu passo em paz prossiga.

E quando em melancólica tristeza
Expressa o seu valor e traz leveza
A quem só carregara amarga cruz.

Sabendo perdoar a quem maltrata,
Amiga verdadeira não desata
O laço em que se deu meu Bom Jesus...


21





Aonde algum sentido foi composto
Em tréguas e carícias lisonjeiras,
O sonho do poeta decomposto,
Arranca as brancas flores, laranjeiras.

Jazigo da esperança; sigo exposto,
Preparo meus mergulhos, ribanceiras,
Qual rei que tolamente foi deposto,
Minha alma segue a sina das bicheiras.

Ectoplasmas das tolas ilusões
Rondando esta charneca/coração,
Apenas uma estúpida canção.

Escombros escondidos nos porões
E os corpos decompostos nesta adega,
Que uma alma sem pudores te sonega...


22

Aonde e com que força desfrutar
As meras conseqüências do que fomos,
Se o aval em eloqüência diz do mar,
Compêndios destilando em vários tomos

Atingindo os estromas da esperança,
Alheio ao caminhar dos velhos tontos,
Os dias que inda guardo na lembrança
Marcados como mágicos em pontos

Diversos desta longa caminhada,
Sangrada por espinhos, pedregulhos.
Depois desta ilusão ser destroçada
Encontro tão somente vãos entulhos

E deles soerguendo os meus castelos,
Que um dia, sem modéstia, foram belos...


23

Aonde em tempestade eu já me asilo,
Percebo a plena glória do viver,
Tocado pela força do querer,
A vida se mantendo em nobre estilo.

No corpo da mulher faço o meu silo,
Nas matas ciliares do prazer
Inundação gostosa de se ter
Deixando o caminhar bem mais tranqüilo.

Amor em tatuagem demarcada
Já sente esta manhã prenunciada
Em raios tão sublimes e felizes.

Legando ao meu passado o sofrimento,
Agora do teu lado novo intento
Calando para sempre os meus deslizes.


24


Aonde encontrarei suaves rastros
Daquela que deixei em noite escura,
Olhar desta mulher, divinos astros
Ajudam com certeza na procura.

O barco que se perde, vai sem lastros
Distante deste cais trama amargura
Bandeira que se perde sem os mastros
Assim é meu amor sem a ternura

De quem eu desejei por toda a vida,
Depois dos sofrimentos que eu passei,
Imagem com certeza, a mais querida

Dourando em alegrias o arrebol
Tornando mais bonita a minha grei
Estrada iluminada sob o sol.


25

Aonde encontras mel nos versos meus?
Colméia da esperança, o tempo leva.
Amor um falso archote teima em breus,
Ao fim da caminhada resta a treva...

Sombrios os meus olhos buscam luzes,
De falsas pedrarias, minhas minas.
Espalho um rastro tolo feito em cruzes,
As minhas poesias? São ladinas...

Mascaro com sorrisos minha dor
Inerente vergasta que me corta.
Na mítica expressão quase um louvor,
Que a fria realidade cedo aborta...

Meus versos são tão doces quanto pensas?
Olhaste sem notar minhas despensas...

26

Aonde eu esperava algum alento,
Somente a mesma falsa sensação
De um gozo sem porque e sem razão.
Não valendo sequer pelo momento.

Prazer só por prazer? Sobra o lamento
Do tempo que perdi sem direção.
Retorno novamente ao mesmo não.
Sem forças pra lutar, entregue ao vento.

À parte da verdade, tu sorris.
Jamais irei querer saber de bis,
Abismos que não quero mais transpor.

Por mais que tu me digas que é tolice,
Cansado do marasmo e da mesmice,
Canteiro sem cuidados mata a flor...



27


Aonde inda haveria primavera
Depois de invernos tantos que coleto,
A mão que decifrasse algum soneto
Moldando a solidão, vaga quimera.

Enquanto a farsa amarga vive a espera,
O gosto que não fosse o predileto,
Apenas não serei frágil inseto,
A pele que perdi se regenera.

Viria finalmente me salvar,
Mas nada mais teria por resgate.
A mão que acaricie; não me mate,

Tampouco tenha força pra sangrar,
O peso do passado em minhas costas:
Verdades esquecidas, ora expostas...


28


Aonde nossas sortes já se trançam
Palavras se misturam como as pernas,
As noites maviosas que se avançam
Decerto tão divinas quanto eternas.

Às vezes me parece quando hibernas
Que nada mais tu sentes. Olhos cansam,
Mas logo com carícias doces, ternas,
Os teus desejos chegam e me alcançam.

És minha, tanto afirmo quando nego.
Vagando vou sem rumo, e quedo cego,
Mas tenho esta esperança de um verão

Que traga o teu amor com atitude,
Se queres ou não queres, vem e ajude
Preciso que respondas sim ou não...



29


Aonde procuramos, sem critério
Jamais encontraremos senão dores.
Canteiro que se perde sem as flores,
Derruba qualquer reino, mata o império.

Do amor reconhecer cada mistério
Num mister delicado. Tais sabores
Misturam-se deveras com temores
Volvendo à voz antigo voluptério

Ourives que conhece e que lapida
Com toda a precisão, a nossa vida
Assegurando um dia mais sereno.

Açoda-se em procela embarcação,
Porém ao persistir na direção
O cais se mostrará por certo, ameno


30

Aonde te buscar, se jamais eu te vi?
Através de uma porta, ouvia a tua voz
Aos poucos se afastando. Um grasnido feroz
Dizia que talvez temesse até a ti.

Vasculho sob a mesa, além, lá ou aqui
E um eco repetia o grito feito algoz.
No silêncio cortante; o nada chega, após...
Difícil conceber. Se não tive, perdi?

Eu sei que já te amei; e isso não mais importa
Etérea criatura, um anjo ou um demônio...
Uma mera ilusão causada por hormônio

Espectro de mim mesmo? O vento ainda corta
E repetindo o som de passos nesta escada
Enlouquecendo. Vão, eu busco, e encontro o nada...


31



Aonde tu buscaste a liberdade
Eu sei que na verdade nada tinha,
Um dia até pensei que fosses minha
Porém só encontrei a falsidade.

Jamais fui bom de grana, pobretão
Sem ter casa bonita nem riqueza,
Que vale ter amor se nesta mesa
Havia só ki-suco, arroz feijão.

Querias um carrão em tua porta,
Comprei uma Brasília setenta oito,
No café da manhã pão ou biscoito.

Assim a fantasia não suporta.
Fugiste com um cara velho e rico,
Deixando como herança este penico...


32


Aonde tu quiseres
Contigo eu estarei,
Tu és entre as mulheres
A que eu sempre esperei

Do jeito que preferes,
Amar é nossa lei,
Teu corpo, mil talheres,
Banquete que sonhei.

Vem logo, meu desejo,
Que a vida já nos chama,
Poder te dar um beijo,

Acendo fogo e chama,
Futuro que prevejo,
Em nossa rara trama...

33


Aos braços deste amor que me queria
Que fazem do meu corpo o seu joguete,
Não quero nesta vida mais confete
Apenas destruir esta agonia.

A noite vai passando em mão vazia
E o tempo ao qual amor já me arremete
Fazendo o que bem quer logo promete
Manhã que tão distante não viria.

Aborto de ilusões, a noite vaga,
A boca que me morde enquanto afaga,
Uma draga pedindo que eu me afaste,

Mas mesmo com sarcasmos, sigo rindo
Nem mesmo a tempestade prosseguindo
Não rompe da alegria esta dura haste.


34

Aos braços deste sonho já se atira
O bem que tantas vezes fora fonte
Ouvindo a perfeição expressa em lira,
Eu sinto o sol tocando a minha fronte

E pronto para encantos meteóricos
Aberto o coração eu continuo.
Meus versos prosseguindo agora eufóricos
Procuram com delícias nosso duo.

Entregue a tais delírios, nada temo
Sequer o vendaval que, sei, virá;
Meu barco necessita de teu remo,
E quero navegar, contigo, já.

Quem sabe deste amor que não tem hora,
No encanto deste canto, revigora...


35

Aos céus vai penetrando e logo invade
Tomando cada rua e cada beco,
Arrebenta as represas e ganha eco
Espalha-se depressa na cidade.

Toando em explosão, felicidade,
Alaga um coração outrora seco,
E neste emaranhado, eu quero e peco
Bebendo até total saciedade.

No intenso fogaréu, uma esperança
Avança e não se cansa desta andança
Que trama um gosto raro; adentra o mar

Derrama no infinito tanta luz,
E o sol que farto brilho reproduz,
Espreita esta alvorada a debruçar.

36


Aos ermos, tempestade me levara
Sem sequer me mostrar qual paradeiro,
Jogado sempre a esmo, não achara
Mais rumo neste sonho derradeiro.

De ver em cada pedra, a jóia rara.
Ocaso que no acaso foi inteiro.
Apenas ledo instinto me guiara,
E o sonho, qual cigano, bandoleiro.

Aspergindo meus sonhos bar em bar,
Diluências destas luzes multicores
De um caleidoscópio, o meu amar,

Em gozos tão diversos, tais mosaicos
Por vezes sei que são mesmo prosaicos,
Mas saiba que são teus os meus amores..


37


Aos olhos de José, a pecadora,
Menina que traindo se fez má.
Futuro, noutros tempos, mostrará
Imagem que será, pois, redentora.

Daquela gravidez, virá o cordeiro,
Que a todos nos trará este caminho,
Tesouro sem igual e verdadeiro,
Feito na plenitude do carinho.

Assim a humanidade em novo tempo,
Sabendo desafio e contratempo
Verá cumprida, enfim, a profecia

Do reino de Judá escravizado,
Quem nos libertará, eternizado,
Renova-se a esperança a cada dia...


38


Aos olhos tão distantes do luar
Deitando sobre a relva, enlanguescido.
Converso com estrelas e ganho ar
Voando sobre o sonho, decidido...

Talvez a minha sina; hei de encontrar
Nas ilusões do beijo prometido,
Nas gotas do sereno... Flutuar
Por sobre todo o mundo... Convencido

Do bem que um amor nos traz; pura alegria
Rompendo a madrugada em belo sonho.
Viver da mocidade, a fantasia

Que mostra num sorriso benfazejo
Um paraíso imenso e tão risonho
Que é feito de emoção e de desejo...


39


Aos pés da Santa Cruz louvando a vida,
Fazendo dos meus versos a oração
Que possa demonstrar uma saída,
Cordeiro irá vencer fero leão?

Nas mãos dos poderosos, a vergasta
Erguida a cada instante, tantas chagas,
Imagem que inda guardo, sacra e casta,
Enquanto me escravizas, vens e afagas

Uma ardilosa fêmea que conquista,
E, aos poucos me domina e me destrói.
Nos olhos invulgares desta artista
A mansa tempestade que corrói.

Aos meus pés encontro em precipícios
Altar que se ergue em podres sacrifícios...



40



Aos pés da Santa Cruz o caminheiro
Depondo suas preces busca a paz.
O amor como um terrível companheiro
Dor e felicidade, medo traz.

De todos os pendores, mensageiro,
Ao mesmo tempo é manso enquanto audaz
Terríveis ilusões, bem corriqueiro
Tramando as amarguras e os manás.

E triste por não ter a companhia
Que há tanto desejei e nada vinha,
Pensando que a emoção fosse tão minha

A noite desabando assim vazia,
Mortalhas disfarçadas de esperança
Enquanto a morte em vida já me alcança.



41




Aos pobres esquecidos nas senzalas
Modernas dos prostíbulos e guetos.
Tapetes e molduras ganham salas,
Retratam mamelucos, brancos, pretos

Mostrando em cada face o mesmo medo,
E as marcas das chibatas da injustiça.
Nos quadros mal se esconde este segredo
Que é feito de suor, e de cobiça.

Sugados pelas bocas mais vorazes,
Rasgados, maltrapilhos, fedorentos,
Vertidos nestas telas são capazes
De ter quase um sorriso sem lamentos...

Na sala dos ricaços, estampados,
Em quadros, valem muito... tristes fados...


42

Aos poucos cego amor vai me tomando
Minha alma neste instante tão inquieta
De luzes e de trevas se banhando,
Respalda toda a dor deste planeta
Por rumos mais diversos me guiando,
A sorte em pleno azar, logo arquiteta.

Do templo em calmaria se fez lava,
Meu dia a dia torna-se medroso,
Aonde louco amor se emaranhava,
Os frutos das tristezas e do gozo,
Por vezes alma insana inda lutava
Temendo por futuro tenebroso.

Porém amor ditoso em tal batalha,
Avança e em duro corte me retalha...



43


Aos poucos desnudando essa pantera
Que existe na mulher que desejei,
Da flor que despetalo; a primavera,
Se entorna na nudez que eu ansiei.

Liberta adormecida e louca fera
Que quer nesse prazer sulcar a lei
Amando sem limites, vem à vera
Sugando cada gota, me faz rei...

As pernas se procuram no tapete
Estendido na sala de jantar,
Sedento... Esta vontade de beber-te

Aumenta cada vez e muito mais...
Devoro enquanto deixo devorar
Amar e ter prazer nunca é demais!



44


Aos poucos lenta chama nos abrasa,
E o fogaréu se torna inevitável.
A vida feita agora não defasa
Permite que se mostre interminável.

Distante de Saigon, Bagdá ou Gaza
O dia vai passando mais amável,
A paz anda rondando a nossa casa,
O sonho se tornando inigualável.

Apenas quero ter o que não tive
Andar pelos lugares onde estive
Num tempo em que o amor se fez venal.

Erijo um monumento no meu peito,
Tramando um novo dia de outro jeito
Felicidade sendo natural...


45



Aos poucos percebendo que amizade
É feita em laços firmes, poderosos,
Deixando perceber que a liberdade
Tem seus caminhos ricos e formosos,

Não posso discutir amenidades,
Apenas sentir braços poderosos
De quem se faz na vida em irmandades
Forrando sonhos, belos, maviosos...

Assim, amiga, vejo mais dourada
A estrada que nos leva ao infinito,
Se cada dia vibra em alvorada,

A força da amizade, em belo rito,
Permite retirar destes caminhos,
As pedras, urzes, trevas, os espinhos...


46



Aos poucos se soltando nos meus braços,
Deitada em minha cama, sem receios...
Abrindo lentamente teus espaços
Extravasando todos meus anseios...

A vida já nos trouxe em fortes laços
E deu-nos, à vontade, muitos meios;
Amor vem penetrando cortes,aços,
Descanso meu carinho nos teus seios..

Tu és encanto e paz, razão de vida,
Bailando no teu corpo meus desejos...
Sentindo-te feliz, tão atrevida,

A chama que surgiu se fez vulcão
Tomando nosso céu em relampejos
Incêndio mavioso da paixão...



47


Aos poucos te conheço e reconheço
Acertos e vantagens em te ter.
Se queres tanto amor, eu te obedeço,
E busco meu amor satisfazer.

Verdade, por pior que sempre doa,
Trazendo lealdade, sempre traz;
Firmeza no que pensas da pessoa
Que sempre verdadeira, amor te faz.

Não posso conviver com tais disfarces
Que, fáceis, muitas vezes nos destroem,
Nos beijos mentirosos, noutras faces,
Não fazem quase nada e nos destroem.

Não deixo me enganar, experiência,
Por tramas que me roubam consciência...


48


Aos poucos vai florindo este caminho
Em rosas, dálias, lírios e jasmim.
Trazendo para a vida este jardim
Aonde refazemos nosso ninho.

Meu sonho adormecera tão sozinho,
Guardado bem recôndito e no fim
Ao receber de ti tanto carinho,
O mundo renasceu, sorriu pra mim...

Num átimo percorro belas sendas,
Enlaço uma esperança a cada dia,
Vivendo o nosso amor em poesia,

Segredos bem guardados tu desvendas,
Que paire sobre nós viva esperança,
No sonho em que se canta, em que se dança...


49


Aos poucos vem raiando uma emoção
Que em lutas desiguais nos apascenta
Causando o mais temível turbilhão,
A força redentora e violenta.

Amor em terremotos nos invade
Na extrema convulsão nos tranqüiliza
Além deste desejo e da vontade
Em plena tempestade trama a brisa.

No fogaréu insano em que me perco
A sorte se mostrando movediça
Amor é da esperança um fino esterco
Santificando a fúria da cobiça.

Ao mesmo instante; cobra enquanto apena
É prenda que se faz, voraz e amena...


50

Aos raios do luar iluminada
Deitando em minha cama teus pudores,
Ancora meus desejos, madrugada,
Nos olhos a boiar, encantadores.

Desfilas seminuas transparências,
Na camisola bela de organdi,
Sorrindo disfarçando as inclemências
Do fogo que percebo arder em ti.

Quem teve tantas vezes pudicícia
Cedendo a tais volúpias enlanguesce
Entrega-se na insânia com malícia
E a fome de te ter aumenta, cresce;

E tudo o que mais quero, tez morena
Que entregue na alva lua, já me acena...



51

Aos ventos e tempestas da saudade
Proponho uma bonança, tolamente.
O amor jamais seria tão urgente
Se houvesse pelo menos liberdade.

E quando a fantasia não invade
O peso do passado cruelmente
É tudo o que em verdade inda se sente
Espalhando os pedaços na cidade.

Quem sabe alguma chance merecesse
Quem fez das tripas todo o coração,
Nas mãos ainda trago o meu formão

Nos olhos sensação de uma quermesse
Que possa traduzir em prece e reza
O quanto o amor que tento me despreza...



52

Na pacificadora sensação
Que toma nosso peito, sem cobranças
Forjada pelas tréguas, alianças
Formando em dois soldados, batalhão.

Dela mesma se faz renovação
E no cantil, somente as esperanças
Nas velas desfraldadas, confianças,
No mar tempestuoso da paixão...

E somos companheiros de viagem,
Nas estações, nos cais, em vários portos
Por mais que sejam duros, sejam tortos

Os caminhos; seguimos. Numa aragem
Serena e mais sensata. Mas com ardor
De quem sabe regar, canteiro e flor...


53

Apagam o que sobra desta chama,
Os ventos sem juízos da saudade.
Procuro quem me fale, mas quem há-de
Se o tempo sacripanta não reclama.

Parceiros desse jogo, céu e lama,
Ao mesmo tempo treva e claridade,
Vem logo que esta noite tudo inflama
Depois só restará diversidade.

Perversos os caminhos deste amor.
Friável, mas perfeito em suas rimas.
Marasmo destruindo tais estimas

Impedem que se eleve o nosso andor.
Carcaças do que fomos? Esquecidas.
O vento renovando nossas vidas...


54


Apagando as estrelas de neon,
Em meio à confusão: carros, buzinas,
A lua se reflete nas meninas
E o romantismo ainda dita o tom.

Taça de cristal, caixa de bombom,
Umedecendo assim tantas vaginas,
As horas vão passando mais ladinas,
Por mais que alucinante seja o som

Sirenes e sirenas, coxas, pernas,
As ânsias do passado são eternas
E atendem aos delírios dos meninos.

Depois de certo tempo, a mesma ronda,
Se a lua toma o céu, gorda e redonda,
Convites sensuais aos desatinos...


55


Apagas, num segundo a negra chama
Que outrora consumia os meus anseios.
Vertendo a fantasia em belos seios
O amor em plenitude já nos chama..

Adorna a noite escura de quem ama
Os lumes mais sublimes. Sem receios
Percorro esta esperança em mansos veios,
Fartando-se do gozo noutra trama.

Jamais esqueceremos tanto enlevo,
Por isso é que em meus versos sempre devo
Louvar o nosso amor que é puro e santo.

Alçando o Paraíso nos teus braços,
Unindo bem mais fortes nossos laços
Teremos da poesia o pleno encanto...


56


Apago o meu cigarro, bebo um trago,
A bebida se torna tão amarga,
Se a voz neste momento já se embarga
Esqueço a placidez, fujo do lago.

Do vento, o temporal que se aproxima,
Balança o meu telhado de sapê;
O amor quando se esquece de você
Encontra a solidão, perfeita rima.

Cadenciando o passo, sei do abismo,
E mesmo sem destino, ainda cismo,
Vencido pelo infausto de saber

Que nada adiantou ter tantos sonhos
Se os dias que virão serão medonhos,
Ao menos pude ter algum prazer...


57


Apaixonadamente em loucos beijos
Dois corpos se conjugam plenamente
Nesta união perfeita de desejos
Semeio na lavoura uma semente

Que brota toda noite e de repente
Refaz nossas viagens, relampejos,
Amor que extasiado já pressente
Fartura na colheita sem ter pejos.

Anseio teus carinhos, boca e pernas,
Cobrimos de prazer, a noite intensa
Mostrando estas vontades doces, ternas

Neste infinito sonho eu sou feliz.
Ternura desejosa e tão imensa
Além do que este beijo já nos diz...


58


Apaixonadamente eu sempre penso
No quanto eu poderia te dizer
Outrora solitário em mar imenso
Vazios já cansei de percorrer.

O verso que se fez enamorado
Deitando uma esperança no meu peito
Carpindo o quanto fora desgraçado
Morrendo pouco a pouco, insatisfeito.

Das rimas que encontrei: amor e dor,
A solidão rimando com paixão
Cenário que se mostra alentador
Nos olhos da mulher em sedução

Um canto mais ameno me dizia
O quanto eu quero ser a poesia.


59

Apaixonadamente me perdi
Nos braços mais gostosos deste mundo.
Pois sempre desejei estar aqui
Nesta casa, contigo, num segundo...

Estrela incandescente, Deus me deu
Trazendo uma alegria sem igual
Acendes o luar no olhar que é meu
Fazendo a poesia natural.

Amando teus cabelos, tua boca.
Sorrisos que em minha alma já descansam.
As ânsias de te amar na vida louca,
O paraíso pleno sempre alcançam...

Pois sabem que encontraram o luar,
Ansiosamente vivem para amar...


60


Apaixonadamente me entreguei
De corpo e de alma, cego e destemido.
Amar passou a ser a minha lei
Meu rumo, nesta estrada, decidido.

Ao ver tua partida; percebi
Que tudo o que eu sonhara se perdera.
Matando sem perdão, a primavera,
Levando todo amor, longe daqui.

Viver sem ter quem amo. Triste sina.
A vida se repete novamente.
Como posso esquecer se em minha mente
Tua lembrança vem e me domina.

Escute este lamento em poesia
Deixaste de presente uma agonia...


61

Apaixonado eu sigo por você,
A cada novo dia, mais feliz.
O meu olhar procura e sempre lê
Palavras que meu peito agora diz,

Do amor no qual meu verso vive e crê
Inspiração jorrando em chafariz
Num palacete ou casa de sapê
Amor já faz de tudo o que bem quis

Sabendo que sou seu, amada prenda
Segredos desta vida, amor desvenda
E todas as tristezas; ameniza.

O quanto que eu desejo o seu carinho,
Na calmaria expressa em nosso ninho
A sua voz escuto nesta brisa.


62


Apascentando assim, temível fera,
Eu sigo a caminhada vida afora.
Já tendo a sorte imensa que se espera
No quanto uma amizade se assenhora.

Encantos sem igual, eu te garanto,
Nos olhos desta eterna companheira,
Secando em calmaria qualquer pranto
Demonstra a solução mais verdadeira.

Miramos o destino que virá
Com olhos de bonança e mansidão
Eu quero o teu querer e desde já
Percebo desde o solo esta amplidão

Erguendo sobre nuvens, tantas, gris,
Eu posso te dizer que sou feliz...
Marcos Loures


63

Apascentará mares violentos,
A mão de quem professa uma amizade.
Afugentando assim, a crueldade,
Os dias serão mansos, sem tormentos.

A par da violência e seus intentos,
Derramas sobre nós suavidade,
E nisso posso ver tranqüilidade
Tomando com firmeza os sentimentos.

Poderes que se encontram raramente,
A vida muitas vezes os sonega,
A quem em amizade alma se apega

Ajuda a ultrapassar qualquer torrente.
Por mais que a vida mostre-se indolente
Prossigo junto a ti, em mansa entrega...



64

Apátrida esperança de um futuro
Aonde esta justiça sobreviva.
Por mais que o chão se mostre estéril, duro,
Do sonho, a fantasia não nos priva.

Eu vejo em teu olhar, mesmo que escuro,
O verde que se espalha em voz ativa
Mudando a direção, saltando o muro
Deixando para trás a alma cativa.

Argúcias necessárias, disso eu sei,
Fazendo da alegria a nova lei,
Mortalhas esquecidas no passado.

Beber desta água mansa e tão serena,
No lume que se mostra e que se acena
Caminho entre ilusões, iluminado...


65


Apeio uma esperança vira-lata
E teimo nos corcéis das ilusões.
Passado que não vi não desbarata
A vida se compõe de dor, cifrões.

Ferroa esta saudade que maltrata,
E tenta ser pavio de vulcões
Descarto as minha dívidas na carta
Jogada sobre as mesas e balcões...

Aparto-me dos sonhos quando tento
E nada me contenta, nem vitória
Amigos usufrutos da vanglória

O beijo que mordeste toma assento
Sem gládio sem tortura, me afiguro
No chão que nunca plantas, frio e duro...


66

Apenas a saudade, amarga, vem
Moldura que não deixa prosseguir
A tela que se pinta pede alguém
O medo não se esquece de impedir.

Arrasa minha casa queima tudo
Saudade da mulher que nunca veio
Olhando o seu retrato eu já me iludo
Beijando sua face eu sonho seio.

Não sei o que se mostra no sorriso,
Vontade de voltar ou de negação.
A noite vem chegando e sem aviso
Transforma todo amor em devoção

Pesando em minhas costas como cruz
Saudade num vazio se traduz...


67


Apenas a tristeza decorando
O olhar de quem pensara estar em paz.
O vento da ilusão já não me traz
Sequer o que sonhei, imaginando.

Alheio aos teus caminhos vou buscando
Apenas o que ainda satisfaz
Um passo tresloucado até, audaz
A senda da esperança desbravando.

Metade do que sou, eu já perdi
Transtorno que encontrei somente em ti,
Causando este soneto em vil lamúria.

Quem pensa ser amor alguma injúria
Não sabe desta fúria que me toma,
A solidão é o nada numa soma...


68


Apenas amizade sabe e diz
Do jogo que se faz mais envolvente
A vida se permite ao aprendiz
Mostrando o que se quer, após, da gente.

A par destes caminhos, sigo ereto
Bebendo em cada fonte água mais pura.
Amor já não suporta qualquer veto,
É feito em perfeição quando em ternura.

Aprendo a cada dia mais um pouco,
É necessário sempre estar atento.
A solidão de um brado quase rouco
Condena uma esperança ao sofrimento.

Por isso, minha amiga, amada amante
Espalhe em teu caminho, diamante...



69

Apenas embalagem, nada além,
Por dentro este vazio inconfundível
O cérebro demonstra tal desnível
Indecifrável oco, o que contém.

Parecendo impossível crer que alguém
Que faz da incompetência combustível
Sabendo ser o tempo este invencível
Feroz e intransponível; inda tem

Desplante de tentar ludibriar
Ao disfarçar as marcas no seu rosto,
Porém neste cenário assim exposto

Não consegue; decerto, me enganar
Negar a realidade; um disparate
A vida sempre dá seu xeque-mate.


70


Apenas encontrei a decepção
Aonde imaginara ver o brilho
De um novo amanhecer, novo estribilho
Mudando a velha e tétrica canção.

Mascando esta terrível sensação
Do tempo se perdendo eu já me pilho
Sonhando com amor sem empecilho.
Acordo e vejo sempre o mesmo não.

O tempo foi em vão, disso eu bem sei,
Estrelas e cometas naveguei
Até ver o meu sonho naufragar.

Mentiras que criei, tais fantasias,
Nos encantos frugais que me trazias
Promessas que cansei já de escutar.


71


Apenas esperança se confessa
A quem já perdeu tudo e não sabia
Da noite que se mostra amarga e fria
Negando ao coração qualquer promessa.

O passo solitário que se engessa
Jamais permitirá um novo dia
A quem se deu sem trégua à fantasia
E aos braços da ilusão, já se arremessa.

Conversas entre mesas, botequins
Deixando bem distante os querubins,
Arcanjos e entidades protetoras.

Da trama sem qualquer clarividência
Amor vai se tornando penitência.
De todos sentimentos, assenhoras.


72


Apenas essa fonte em meu delírio
Transtorna totalmente o pensamento,
Jamais coletaria algum martírio
No que seria tétrico excremento.

Qual vírus o teu corpo eu parasito,
Tentando decifrar o paradeiro
Herméticos vogares, quando os fito,
Percebo a vida como um picadeiro.

Agônica expressão que em poesia,
Vestindo a farda estúpida da sorte,
A mão, se necessário, abriga e cria
Espectros que traduzem farpa e morte.

Avesso aos raios prata desta lua,
O meu féretro, em vida, continua...


73


Apenas esse vento na janela
Falando de quem foi e não voltou.
Imagem do passado me assombrou
E a eterna solidão já se revela.

A sombra que persigo, sendo dela,
Durante tanto tempo me tomou,
E agora que nem sei mais quem eu sou
A velha embarcação destroça a vela.

Abandonadas flores no jardim,
Traduzem o que sinto dentro em mim.
A falsa sensação de calmaria

Bonança que jamais eu conheci
Levaste há tantos anos e daqui
Até a lua cheia está sombria...


74


Apenas este gosto meio amargo
Que trago no meu peito, quase triste.
Na voz que vacilante, sempre embargo,
Lembrança da mulher que inda resiste

As névoas e as brumas da saudade,
Embotam a visão, penso que caio,
Mas logo vem à tona uma verdade
E da realidade, eu já me traio

E volto a te abraçar, neste momento,
Com as ânsias de um amor mal resolvido.
Queria te exilar do pensamento,
Encarcerar-te sempre num olvido...

Mas como, se de noite inda reclamo,
E digo aqui, sozinho: Eu inda te amo!



75

Apenas ilusão não vai embora
E o resto que se dane! Nada além
De um resto de esperança que se aflora
Trazendo desde sempre o velho bem.

Enquanto a poesia se demora,
O vento da alegria nunca vem.
Eu quero, desejando a vida afora,
O quanto eu sei que teimo, mas não tem.

A par da estupidez de ser assim,
Vencido pelos restos que há em mim,
Não tenho outro caminho senão crer

No beijo da serpente que iludindo,
Dizia de um momento bem mais lindo,
Tramando no final, o apodrecer...



76

Apenas ilusões, o que encontraram
Aqueles que se deram sem limites,
Por mais que teus caminhos delimites
Os olhos tão tristonhos se tocaram.

Enquanto os meus propósitos te amparam
Diversas as palavras e os palpites
Negando o que não sei mais que acredites,
Palavras que os ouvidos decoraram...

Careces de sonhar? Fazer o que?
Se a vida em teu olhar já não mais crê
E segue sem saber do que precisas.

Janela do teu quarto está fechada,
Um pássaro partindo em revoada
Esquece vendavais, prefere as brisas...


77

Apenas já repito um velho rito,
Prometo o que não posso mais cumprir.
Não quero e não pretendo ser teu mito,
Nem vômito, num frêmito fingir.

Da poça nego a lama, escondo o barro,
Da moça em minha cama, quero o gozo.
Tuberculosamente quando escarro
O tempo vai rondado, caprichoso.

Raiz de tantos erros no passado,
Aflora em mais cruel sofreguidão.
Prefiro que prossiga assim velado,
A ter que perpetrar a negação.

Se vão inda caminho e sei das senhas.
Eu quero mesmo assim, que logo venhas.


78


Apenas me restando a fantasia
Proporcionando um dia mais feliz,
O quanto uma emoção nos desafia
Traduz o que esperança não desdiz.

Ao desabrigo a sorte conduzia
Quem tantas vezes fora um aprendiz;
Porém ao perceber novo matiz
Ansiosamente aguarda o claro dia

Que possa permitir um sol intenso,
De um sonho mais incrível me convenço
Desejo que se faz consensual.

Perfaço nessa noite uma jornada
Que mostre cada cena desbravada
Do corpo mais perfeito e sensual.


79


Apenas na amizade uma alegria
E nada além de um barco naufragando
O jeito é caminhar em fogo brando
Quem sabe talvez tenha serventia?

Minha alma sem pudores não paria
Sequer o quase tanto, vou levando
O tempo como um velho navegando
Durante um breve instante, quem diria...

Será que esta serpente quer maçã?
Sem ter noção do bote, na manhã
Desdenha em ironia, com sarcasmo

Presentes que talvez não tenha mais,
Mentiras que me contas, sempre iguais
Condenam nosso caso ao vão marasmo...


80


Apenas neste amor vê floração
Jardim que tantas vezes cultivei.
E mesmo que encontrar a negação,
Amor se faz desejo, regra e lei.

A par destes momentos ao teu lado,
Não quero outra alegria em minha vida,
Seguindo o meu caminho enamorado,
A dor de uma saudade vai perdida.

Gostando simplesmente de poder
Dizer o quanto eu quero e não me canso,
Coleto a cada dia, o bel prazer
Na fonte que se mostra num remanso.

Jogando a solidão em mar profundo,
Não deixo de te amar um só segundo

81

Apenas o que um dia quis além
Do quanto nada foste e imaginaste.
Não te vejo somente como um traste.
Tampouco te imagino este ninguém

Que vaga sem destino e busca quem
Talvez possa servir de apoio ou de haste.
O tempo nos condena a tal desgaste
E o fim, inevitável, sempre vem.

Padeces entre luzes quase opacas
A morte aos poucos mostra que as estacas
Aproximam-se. Pensas noutros dias

Que agora tão distantes nada dizem.
Inúteis fantasias que eternizem
Perdidas em verdades tão sombrias...



82

Apenas o que vejo: o céu escuro
Tomando todo o palco, amanhecer.
Sumindo pelas ruas, eu te juro
Que um dia ainda tento te esquecer.

A noite vai passando, eu na espera,
A moça diz que um dia vai voltar,
Quem sabe ela trazendo a primavera
De novo eu possa enfim recomeçar.

Faz tempo que saiu pra dar plantão,
Depois do carnaval, Vila Isabel
Pensei que ela voltasse, foi em vão,
Decerto noutra tenda faz seu mel.

Restando este vazio, e tanto anseio,
Aguardo um telegrama, carta, e-mail.


83


Apenas os desertos espalhou
Os olhos de quem marca a primavera
Na seca que decerto nos tomou,
O gesto incoercível desta fera.

Caminha sutilmente e de tocaia
Espreita cada passo que se dá.
Armadilha na qual a sorte traia
Tocando a minha vida desde já

Jazendo pouco a pouco, uma esperança
Expressa em ironias, cada lavra.
A maldição mais sórdida me alcança
Avinagrando assim, minha palavra.

Sou menos do que pude imaginar,
Mortalha abandonada em preamar...


84


Apenas o vazio que perturba
O sono deste velho sonhador.
Dos pesadelos tantos, triste turba
Momento em solidão traduz em dor.

Olhando para os erros cometidos,
Não resta nem saudades do que fui.
Em todos estes sonhos destruídos
A mágoa que sentia ainda influi.

Nas linhas desta mão, ledo futuro,
A sorte desengana, sigo só.
Bebendo em cada bar, logo procuro

Um jeito de encarar a minha face.
Não quero e nem preciso mais de dó.
Apenas uma amiga que me abrace...



85


Apenas os desertos espalhou
Os olhos de quem marca a primavera
Na seca que decerto nos tomou,
O gesto incoercível desta fera.

Caminha sutilmente e de tocaia
Espreita cada passo que se dá.
Armadilha na qual a sorte traia
Tocando a minha vida desde já

Jazendo pouco a pouco, uma esperança
Expressa em ironias, cada lavra.
A maldição mais sórdida me alcança
Avinagrando assim, minha palavra.

Sou menos do que pude imaginar,
Mortalha abandonada em preamar...


86



Apenas por tributo quero o riso
De quem jamais esqueço, tolamente.
Mas quando tudo muda num repente
Inferno desbancando o Paraíso.

Não vejo solução, e ter juízo
É ficar bem distante da serpente,
Das dores e tristezas, tosco agente
Arcando com a perda e o prejuízo.

Sem luvas de pelica; o bofetão,
Não peço mais carinho nem perdão,
Enfiando a viola neste saco.

Labutas enfrentadas, diuturnas,
Enquanto noutras sendas tu te enfurnas
Feito um panaca aqui ainda empaco...


87


Apenas recomeçam sempre avançam
Os jogos que fazemos gozo e sonho.
Enquanto as nossas pernas já se trançam
O verso mais gostoso, enfim, componho.

Se eu ponho os meus saveiros no teu mar,
Mergulho o meu prazer em mansas águas.
Enquanto este desejo dominar
Em mim com fartas ondas tu deságuas...

As mágoas esquecidas, peito aberto,
Armando um temporal e inundação,
Deixando em polvorosa o vil deserto,
Nos poros, os suores, explosão...

E bêbado da orgástica aguardente,
Como um replay eu jogo novamente...



88



Apenas reconheço o teu semblante
Que está em cada cena que vivi.
Falar de nosso amor tão delirante
É mais do que pensara. Estou em ti.
Em todos os momentos, cada instante
Estás comigo, amada, bem aqui...

Flutuo em cada verso que te faço
E chego ao Alentejo, meu amor;
Persigo-te querida passo a passo,
Eu quero estar contigo aonde for.
Na praia, na montanha, céu, espaço...
Saudade de te ter; prazer... torpor...

Ao belo Porto chegando o meu barco,
Reflete em tanto mar, teu rosto, um marco...



89


Apenas são diversos, os perigos,
Porém a tempestade não se cansa,
Depois de toda a seca já me alcança
Trazendo novamente os desabrigos

Os olhos sonhadores perdem visgos
E soltos vão bebendo da lembrança,
Fazendo do sorriso uma fiança
Vendendo as ilusões, caros artigos.

Mortalhas espalhadas pelo chão,
Vendidas as crianças do sertão,
Aguando uma alegria sertaneja.

Partindo do vazio para o nada,
Espalho meus olhares na calçada,
Liberdade é tudo o que almeja...



90


Apenas solidão cruel me alcança,
Mas vejo depois disso, a claridade
Da noite que aparece em nova dança
Trazendo para a vida, a novidade.

A paz me dominando, agora trança
Os planos mais felizes da amizade,
Janela que entreabri em noite mansa,
Aguarda finalmente a liberdade.

Meus olhos vão em busca dos olhares
De quem por tantas vezes veio aqui,
Estando junto a mim em outros bares

Caçando algum motivo pra viver,
Meu mundo se aproxima então de ti,
Amiga, vislumbrando o teu poder.


91

Apenas solidão serve de guia
A quem por tantas vezes quis liberto
Tocado pela doce fantasia,
O peito escancarado segue aberto.

O passo que se mostra a cada dia,
Seguindo em rumo insano este deserto,
Jogado sempre às traças, ventania
Levando por caminho mais incerto.

Caçando o que não tive, vou sozinho
Fazendo da amargura o doce vinho,
Farsantes sensações vão adentrando

Perfaço este infinito em um momento,
Marcado pela cruz, o sentimento
Aos poucos, meu castelo desabando...


92

Apenas solidão vem e deplora
O quanto me perdi do antigo bando,
A vida num momento desabando
Quem sabe da verdade se assenhora.

Vagando simplesmente mundo afora,
Contra esta correnteza vou remando
Não sei e nem pergunto desde quando
A dor promete cura e revigora.

Tocado pelo bom desta aguardente
Às vezes eu me sinto inconseqüente,
Mas guardo uma esperança em minha vida,

De um dia poder ter tudo o que quero,
A bem de uma verdade enfim tempero
Conversa sempre assim mal resolvida.



93

Apenas solidão, permito que me abrace
Entranha cada garra e rasga mais profundo.
O quanto que já fui; outrora, vagabundo
Prevê depois de tudo, o triste desenlace

Uma agonia intensa expõe em sua face
O rosto que se mostra agora nauseabundo,
Molambo maltrapilho, o coração imundo
Esgota qualquer chance e causa neste impasse

Certeza em que trafego o medo como guia,
Matando pouco a pouco, a leda fantasia.
Nas farpas eu me corto, e nisso vejo a glória

De ser um quase nada, um resto perambula
Nadando no vazio, a morte que me oscula
Talvez seja em verdade, a única vitória.


94


Apenas sou um resto e nada mais,
Rastejo e serpenteio os meus sentidos,
Carpindo os meus desejos esquecidos,
Morrendo sem saber sequer do cais.

Profanas, as vontades mais carnais
Na pele, os meus terrores tão curtidos
Prenunciando o fim, gozos sortidos
Enfurnam-se nas noites abissais.

Extraio de meus olhos, suas cores,
Apreendo tão somente os vir rancores,
A solidão resulta-se do extrato.

Procuro minha face em cada espelho,
Encontrando o perfil, amargo e velho,
Não tendo por resposta um só retrato.



95


Apenas tão somente esta saudade
Vagalumeia sempre junto a mim,
Por mais que na janela exista a grade,
E inda resista até que chegue o fim,

Não posso mais lutar contra a verdade,
Resquícios que carrego de onde eu vim
Impedem toda a paz, tranqüilidade
Não deixam sobrar quase nada, enfim.

As nuvens de falena neste lume
Retornam toda noite no meu quarto,
Da cena repetida, embora farto,

Ainda me embebendo o teu perfume
Crocitando estes corvos ancestrais
Ao mesmo instante dizem: nunca mais!


96


Apenas tão somente, esta saudade
A força corrosiva que não cessa,
No quanto amor em paz já se confessa,
Ao mesmo tempo trai tranqüilidade.

Olhar que me acompanha, na verdade
Mesmo que ausente sempre recomeça
Entranha em minha pele e já se engessa
Ao transtornar renega a liberdade.

Na comoção extrema que me traz,
Negando a cada instante a minha paz,
Sonega esta presença tão distante.

O quanto que sonhei e não te vi,
No espectro que aqui ronda; eu me perdi,
Seguindo esta miragem deslumbrante...


97


Apenas te proponho uma amizade.
Eu sei que é muito pouco ou quase nada,
Riqueza significa a claridade
Que sonhas toda noite ou madrugada.

Um velho sertanejo me dizia
Cantando uma toada bem antiga,
Nos braços da amizade uma alegria
Da vida a fortaleza, bela viga.

Olhando a lua mansa no sertão
Relembro num momento de Catulo,
As aves vão voando arribação,
Uma esperança morre no casulo.

Mas tendo aqui comigo a companheira
A chuva dentro da alma vem ligeira...


98



Apenas um amor pode acalmar
O coração que faz por merecer,
A sorte de ser pleno e de viver
A fantasia intensa de sonhar.

Durante a tempestade navegar
Sabendo que terei total prazer,
De um dia em alegrias conhecer
O quão maravilhoso é se entregar.

Amar e ser feliz. Tudo o que eu quero.
Poder sentir o amor forte e sincero
Daquela que se entrega sem pudores.

Na luz de teu olhar esta certeza
De um dia usufruir farta beleza
Do céu que se permite em raras cores...


99

Apenas um enfeite nesta casa,
Um zero que se põe, ali, na esquerda.
Relógio com certeza não se atrasa,
Acumulando débitos e perda.

Decerto isto é comum, a vida passa,
E nada do que fomos voltará;
O resto da esperança não se enlaça,
Defunto em plena vida, desde já.

Apodrecendo vivo na masmorra,
Por mais que eu tente, nunca fui feliz
Sem ter nem poesia que socorra.
O coração teimoso se desdiz.

Dedilho uma canção neste piano,
Desafinado. Resta o desengano...


3100


Apenas um escombro e nada mais,
Houvesse alguma chance, eu lutaria.
Talvez pudesse ter uma alegria
E o barco encontraria um manso cais.

As esperanças? Guardo-as nos bornais,
Embora saiba ser só fantasia
O que uma alma salobra ainda cria,
Distante dos portais e dos umbrais...

Quem sabe, finalmente, alguma escora,
De tanto que alegria se demora
O tempo de viver vai se escoando

E nada do que outrora imaginara
Enquanto a realidade desampara,
As ilusões fugindo; vão em bando...
 
Autor
MARCOSLOURES
 
Texto
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