FREEPORT
Tive a oportunidade recentemente de visitar uma nova instalação de saúde, construída no centro da cidade de Lisboa, destinada a Cirurgia Ambulatória.
Instalações magnificas, com os mais modernos e sofisticados equipamentos, bem desenhada e rigorosamente feita de acordo com a legislação em vigor, cumprindo todos os pormenores da mesma.
Trata-se de um investimento que ultrapassou o milhão de euros sem o custo do imóvel, cujo metro quadrado deverá ser significativo já que se encontra numa das zonas mais nobres da cidade.
Esta unidade está há oito meses à espera de licenciamento.
Não, ninguém se esqueceu de entregar a documentação...
Cumpriram-se todas as formalidades atempadamente e aguarda-se há oito meses a autorização de abertura, o relatório ou o documento que um burocrata qualquer em representação de um qualquer organismo terá que passar, assinar e carimbar.
Como simpático, desenrascado e característico cidadão tradicional português, eu, perguntei de imediato:
"então e não conhecem ninguém?" ao que me retorquiram:
"Para quê?". Estava para responder:
"para lhe pagarem alguma coisa, por baixo da mesa",
mas contive-me porque percebi que aquelas pessoas não perceberiam tal procedimento.
Admirem-se pois do Freeport.
É o sistema, a oportunidade, o hábito e a ocasião que nos fazem seguir caminhos pouco éticos.
Como é possível investirem-se um, dois ou três milhões de euros, assumir a amortização, para não falar de outros custos, e ter que esperar mais de oito meses para iniciar o negócio, que depende de alguns funcionários e de organismos incompetentes, negligentes, desadequados, fatigados e acima de tudo, corruptos?
Ah! se eu estivesse nesta situação: arranjava de certeza um primo do genro do conhecido da mulher do doutor que manda naquela coisa para me dar o ridículo documento que me permite empregar pessoas, tratar de pessoas e pagar o investimento que fiz acreditando neste País que não sai da sola da chinela.
Pagava-lhe, corrompia-o.
Noutros tempos e noutros países até podíamos deixar a cabeça de um cavalo favorito do burocrata, à noite, na cama, com o recado:
“esta é uma proposta irrecusável...”
Abençoado País de tão brandos costumes.
Rui Fontes (Presidente da AAGI-ID)
José Mota
Rui Fontes - Sem Papas na Língua - Autorizou e recomendou a publicação deste texto no Luso Poemas