Zézito é um robusto rapazinho
Orfão e de tenra idade
Vive com o seu padrinho
Sózinho e sem carinho
E sem o bem da liberdade
Vive numa pequena aldeia
Rodeada por serras e montes
Vive numa terra feia
Que de cansaço está cheia
Onde não cabem os horizontes
Zézito levanta-se com o nascer do dia
E começa logo a trabalhar
Nunca lhe faltando a energia
Vivendo na esperança de que um dia
Outras terras o virão chamar
Levando debaixo do braço pão e mel
Na serra o rebanho vai guardar
Escoltado pelo seu cão fiel
Nunca pára de sonhar
Sonha com o outro lado da serra
Mundo novo que ele há-de pisar
Espaço aberto que encerra
Toda a verdade da terra
Que um dia será o seu lar
O seu padrinho vê nele o herdeiro
E Zézito que não quer ser grosseiro
Guarda para si o seu único sonho
De lutar por um futuro mais risonho
Com os seus calções remendados
E a sua camisita desbotada
Vai andando pelos prados
Olhando tudo e não vendo nada...
E, de repente, fica parado
- É um lobo e dos grandes!
Exclama apavorado
Mas o seu amigo atento e leal
Já corre em direcção do animal
Farrusco, em luta raivosa
Acaba por sair vencedor
E abanando a cauda vaidosa
Olha o seu dono com amor
Chegada a hora da janta
Zézito e o seu fiel cão
Levam o rebanho de volta ao povoado
E na mesa despida de carne e pão
Mastiga a escassa refeição
De um prato de caldo migado
Sem dar contas ao padrinho
Vai ao pomar do vizinho
Come fruta sem parar
Até ficar consolado
Não é que ele goste de a tirar
Mas fazer aquilo é tão engraçado...
De seguida e sem parança
Vai à loja dar comida aos animais
À vaca grande que é sua herança
Aos coelhos que são todos iguais
Aos porcos assustados e barulhentos
E aos pintos que são aos centos...
Mas ao sair do galinheiro
Com expressão fatigante
Pensa que leva o ano inteiro
Nesta azáfama constante
Os anos passaram...
Zézito é hoje um rapazinho
Os seus sonhos não mudaram
O que enfada o seu padrinho
Vai de quando em vez à cidade
Com o seu fato domingueiro
Disfrutar da pouca liberdade
Onde gasta um pouco do seu escasso dinheiro
Continua a sonhar que um dia
Outra vida irá ter
Outras terras há-de conhecer
Quer falar estrangeiro
E será um bom engenheiro!
Mergulha horas e horas
Seguidas na leitura
De bons livros ensinadores
Ele sabe que daquela vida dura
Também nascem bons doutores...
Nesta lida costumeira
Alguns meses foram passados
E um dia a sorte o bafejou
Entre afazeres e recados
Numa tarde de muito calor
Zézito é chamado ao povoado
Estava na aldeia um senhor
Que era tido como rico
E muito bem educado
Veio à procura de alguém
Forte, sadio e inteligente
Vive sózinho sem ninguém
E já se vai sentindo doente...
Do afilhado do Manuel
Logo se lembrou o taberneiro
O rapaz tinha os requisitos
E era forte como o castanheiro
Zézito, sujo e suado
Mas de coração esperançado
Vê no sorriso daquele senhor
O futuro com o qual havia sempre sonhado
Despede-se do furioso padrinho
Com alguma pena e saudade
Enfim...encontrou o seu caminho
E com uma expressão de carinho
Leva nos olhos a felicidade
O seu fiel amigo pela mão
E grande fé no coração!
Manuela Fonseca