Por mais distante que um fio de cabelo
Esteja de uma nesga de luz solar
À porta de um bar vazio
A silhueta translúcida de um ausente
Arranca a cordéis de linho a solidão
Troça o olhar que se torce com veemência
De um estender de mão
Quando as unhas são apenas garras visíveis
Para arranharem de saudades as costas ao passado
Até os rios suados e ocos presos à garganta
Latem nos penhascos da nossa foz
Como uivos lambuzados de lua e de alma
Porque a alma é o abstracto indefinido
De tantas experiências sem sentido
Que a haver um nós
Haveria um cobertor de dores rarefeito
Pelas meticulosas mãos da ignorância
E porque falei de amor
Muito antes de saber o que ele representava
Nos claustros embriagados do meu sentir
Um odor inodoro esbate-se em forma de trovão
Sobre a derme mergulhada num cacto erecto
Em busca de um plácido jardim infernal
Se falei de amor foi porque nada mais tinha
para dizer
Nem quando sorvia o teu corpo moribundo de desejo
Aberto à passagem metropolitana da minha ansiedade
Que se manifesta na eloquência de um beijo
Se me disseram que Adamastor ainda navegava nos
meus mares
Pronto para dissecar a nau onde me encontrava
Também inventaram o prelúdio triste para um
fado de Coimbra
Trinado por corvos à minha inquietante passagem
Passei...
Sentado no beiral de uma nuvem trovejante
Aguardo a chuva ácida de um retorno impossível
Sobre um miradouro de fantasmas e desejos
antóniocasado