A viagem neste ônibus, longa e cansativa, causa-me agora desagradável início de tédio. Eu procuro inventar coisas para fazer, objetivando distrair minha atenção e obter um pouco de conforto psíquico ante a mesmidade desta situação. Creio que os demais passageiros também teriam semelhante sensação se os mesmos existissem. Ocorre que sou o único ocupante deste veículo que sequer tem motorista.
Começo a ter recordações de meu tempo de criança quando, para mim, viajar de ônibus era uma festa, uma linda aventura, pois eu adorava quando meu pai e minha mãe me levavam em algum lugar para o qual precisavam ir com auxílio do referido transporte. Eu ia, o tempo todo, apreciando a paisagem, o que me fazia transbordar de alegria, mas ficava triste quando a viagem terminava e eu tinha que voltar para casa.
Eram tempos de descobertas, quando eu tomava contato com as coisas do mundo que me cercava. Tudo era novo e deslumbrante como o brinquedo que se ganha de presente no Natal, aniversário ou quando se tira nota alta na escola. Tinha a mesma sensação. Tudo isso era como achar maravilhosos tesouros ocultos nas verdades do mundo encantado no qual vivia.
Hoje, encontro-me nesta longa viagem de infinitas horas, sem sequer ter uma parada, mesmo rápida, que pelo menos dê tempo para tomar um cafezinho ou um copo d’água.
Para completar, forma-se uma típica situação, pois me vejo dentro de um demorado engarrafamento de trânsito.
Meu ônibus encontra-se agora parado na frente de uma loja muito antiga, aparentemente desabitada, com suas velhas passagens fechadas através de selos, a sugerir ante a visão de paredes, portas e janelas bastante prejudicadas, um estado de completo abandono.
Fico, assim, olhando para este curioso cenário, à procura de algo interessante para ver, mas não vislumbro nada que desperte minha atenção em termos de alguma satisfação visual.
Depois de examinar com os olhos cada detalhe da parte frontal desta construção, supostamente sem habitantes, em plena cidade do Rio de Janeiro, instintivamente elevo meu olhar em direção à parte superior da velha construção. Neste momento, tenho a sensação de que meus olhos brilham de deslumbramento, pois no alto do frontispício do prédio há uma sacada que mais parece um grande escaninho e dentro de um dos espaços retangulares a ele pertencentes, vejo, acomodada em atitude de sublime repouso, uma linda e delicada pombinha branca, que pode ser vista em seu inteiro perfil.
Sou, então, invadido por inenarrável felicidade ao ver este “pedacinho de natureza” mostrar a presença de sua paz, repleta de beleza e plenitude em meio à desastrosa imensidão de frias vigas e pilastras de concreto que compõem a aglomerada e compacta desunião que caracteriza a habitual performance da grande metrópole.
Roberto Armorizzi