Estive a olhar a água que cái pelo ralo enquanto banhava-me…
Veio-me o pensamento de que, assim como aquela água que esvai-se
Vão-se os segundos vividos… os amores perdidos em cenas.
Apenas cenas presentes e que, um dia, se esvaem como aquela água.
Sem lamento… sem respeito… sem saudades.
Saudades…
Apenas se sente daquilo que nos é extremamente egoísta…
Daquilo que apenas a nós é bom… sem muito importar o contexto…
A história… o cenário… o outro.
O que entregar mais em nome de apenas uma cena?
Uma cena… tão sem importância depois de vivida e, posteriormente…
Apenas contada… como algo que nunca se teve sentimento algum.
Algumas vividas… tornam-se patéticas.
O tempo e a distância do vivido proporciona esta estranha metamorfose.
Outras… muito tristes…
Mas, geralmente… nada sentido ou traduzido por quem as narra.
Sim… pois de quem doeu e se deu… nada vale a pena falar.
É mesmo assim… de qualquer forma e de qualquer jeito…
Contada por uma boca leviana qualquer.
Sem som… sem rima adequada… sem tom… sem nada.
Então… quando olho novamente para o ralo…
Que escoa a água que lava o meu corpo…
Penso que não haverá quem quererá saber se a mesma arrasta lágrimas…
Se tentei lavar a alma – embora impossível…
Se tentei apagar uma história doída… sem sucesso.
Ou se apenas quis limpar o resto cansado do meu dia de trabalho.
Será apenas água escoando no ralo…
Será apenas mais um tempo que não volta…
Será apenas mais uma cena…
Acompanhada apenas pelos fiéis e frios ponteiros do relógio…
Em ritmo com a água que escoa… com tudo o que com ela segue.
E não retorna ao mesmo ponto… nunca mais.
Karla Mello
Agosto/2010
karla.melo66@hotmail.com"Nao tenho ambições nem desejos. Ser poeta nao e uma ambição minha. É a minha maneira de estar sozinho." (Fernando Pessoa)