É fodido, pensou, enquanto tomava o café pingado acompanhado do bolo-de-arroz da manhã. Tinha logo esta merda de lembrança chegar agora. Não que fosse desconfortável, mas trazia outras com ela que não seriam totalmente inocentes. A lembrança então residia no cheiro a salsa fresca colhida no quintal por trás da casa da avó materna na aldeia em que passava férias. O cheiro lembrou-lhe os bolinhos de bacalhau que matavam a fome durante uma semana inteira, cozinhados na mesma lareira onde o avô outrora havia fabricado peças de barro preto que vendia nas festas das aldeias vizinhas e que trocava por castanhas, cebolas ou o que quisessem dar. A salsa e os bolinhos transportaram-no, em pensamento, para a rodeira que levava ao cemitério da aldeia e onde passou muitas tardes da sua mocidade masculina a jogar à bola com os primos e vizinhos, crianças da idade dele. O cheiro do pó da terra desse carreiro jamais lhe saiu da memória. Nem o cheiro do pó dessa terra em dias de chuva de Verão, em que cheira a terra molhada, misturada com trovoada seca, que tanto o assustava nesses dias. Hoje a trovoada é outra. Tem pensamentos disconexos, confusos e mesclados com loucura por tantas tempestades não resolvidas nas férias de Verão na infância...