Para retomar nosso tema, quero enfatizar que temos a ver com a espiritualidade, quando mergulhamos nessa profundidade de nós mesmos e experimentamos a realidade como um todo.
Espírito é aquele momento de nossa consciência que nos abre à percepçõa de que somos parte de um todo e de que pertencemos ao todo.
Espiritualidade tem a ver com experiência, não com doutrina, não com dogmas, não com ritos, não com celebrações, que são apenas caminhos institucionais capazes de nos ajudar na espiritualidade, mas que são posteriores a espiritualidade.
Nasceram da espiritualidade, podem conter a espiritualidade, mas não são a espiritualidade. São água canalizada, não a fonte da água cristalina.
É grandioso quando a religião ou determinado caminho espiritual consegue de fato canalizar a experiência espiritual e nos levar continuamente a beber da fonte.
Trata-se então de uma religião que guarda sua funcionalidade verdadeira, que se enche de reverência e, por isso, não manipula os sentimentos humanos, não aterroriza as consciências, nem prende os professos na trama de seus dogmas.
Entende tudo como aceno para o mistério, como indicações sobre o inefável. Só se contenta quando leva o ser humano a mergulhar nessa suprema realidade, e não quando o transforma num devoto seguidor de suas doutrinas, ritos e preceitos morais.
Não é fácil manter essa dialética entre espiritualidade e religião. Muitas vezes só chegamos a uma verdadeira experiência espiritual desmontando o edifício religioso, tal como fazemos com os resíduos que escondem o ouro precioso.
Leonardo Boff, teólogo, trecho do Livro: "Espiritualidade, um caminho de transformação". Editora Sextante.