Ofereci-te minhas tristezas
Aceitaste-as
Agora como vivo sem elas?
O que coloco no espaço vazio que ficou?
Não posso queixar-me
Afinal, fui eu que em medo de não as aceitares as ofereci
Não fui capaz de prever o vazio que ia ficar
Não as peço de volta
Recebeste-as com um sorriso nos lábios como o de uma criança que recebe uma prenda fora de época
Agora só tenho este espaço enorme que não sei como hei de preencher
Como minha casa sem mobílias nem gosto para mobilar
Minha barba feita e cabelo cortado mostram um rosto no espelho que já não conheço
E sobrada apenas as roupa que tinha no corpo sinto que já não as posso vestir
Saio do meu antigo palácio
Hoje sem gloria
Envergonhado pelos olhos dos outros entro na primeira loja que encontro
Não sei o que escolher
A funcionária que devia ajudar-me não se aproxima até que eu diga três vezes se faz favor
Preciso roupas novas – digo
Ajuda-me – penso
Olha-me de alto a baixo como quem duvida da minha capacidade de pagar
Não sei se temos o que procura – diz
Cabra – Penso
Olho a minha volta e tudo é tão estranho
Sei que não são as roupas que vão preencher o meu vazio
Apetece-me fugir
Não sei o que procuro, quero apenas uma roupa discreta para esta estação – Digo
Não liga muito a moda, certo?
Afinal ela não é tão parva assim – penso
Não - respondo aliviado como quem acaba de ser compreendido.
A rapariga escolhe-me algo
Visto-me e acho-me ainda mais estranho ao espelho do que achava a poucas horas
Coloco as roupas velhas num saco
Pago
Vou-me embora
Olho o que agora para mim é lixo pela última vez antes de abandonar
Sinto que parte de mim morreu
Para parte de mim poder crescer