Quantas vezes ouvimos dizer «a minha vida dava um livro». Pois bem, sabendo até que a iliteracia bate recordes espectaculares – e nisso tiramos vantagem de longe sobre qualquer país que se atreva – há que ter cuidado com aquilo que se diz. Primeiro, porque existe vários estilos de livros e para todos os gostos e feitios e medidas e, quando alguém cai sem termos nestes termos, há que referir especificamente o teor do livro que é para não se cair em enganos, pois há para aí muita gente atrevida que aproveita qualquer deixa para criar graçolas de género porno-popular.
Segundo, porque os livros não têm culpa das desgraças dos outros, não tão-pouco servem de lenço de mão para choramiguices. E terceiro, e esta sim a mais importante que Deus botou ao mundo, quem diz que a sua vida dava um livro ou é do Benfica ou é maneta. Do Benfica porque, só um grande benfiquista guarda na memória o passado e, ao escrevê-lo, ao avivar os tempos, será uma forma de limpar o pó das taças. Já o maneta, bem, esta era só para enganar.
E a gente pergunta, ora diz lá tu porque é que a tua vida dava um livro?
- Tá calado, pá, a minha vida, ui, tantas coisas, ui, nem queiras saber!
Já sei, eles respondem assim para não sabermos já a história nem o final, e assim, quem quiser saber, há que comprar o livro, será? Ou talvez, esperem lá, eles não adiantam partes do livro que é para a gente não gamar ideias, sob pena de plagiarmos a vida deles.
Não sei, estou "Confúcio". Não entendo, muita gente diz que a sua vida dava um livro, mas, o que é certo, poucos a escrevem?
Falta de editora?
Estão à espera da implementação total do acordo ortográfico?
Ou será que estão a adiar, adiar, adiar, que é para ter mais páginas para contar? Até ficar assim, bem grosso, para mostrar aos amigos que a sua vida é mais cheia. Olha, vês aqui, a minha vida, trezentas páginas, toma!
Alguém me explica, por favor? A minha vida dava um livro. Mas, porquê só um? E porque não dois livros, ou uma tiragem de 300 exemplares. E se o que escreveu a sua própria vida, está a lê-la, no repouso da sanita branquinha e, naquele momento em que se ergue para l&mp*r o ku, cai o livro lá dentro. Já viram o desastre, a sua vida, na sanita.
Se ao menos tivesse um outro mandava tirar fotocópias. Bem, com esta brincadeira já estou a dar um alerta. Amigos, para quem está a pensar em ter a sua vida num livro, ao fazer e ao fazer, mande logo imprimir uns dez ou vinte. Além de ficar mais protegido contra eventualidades, sai mais em conta, ouviram? Mas que mania é essa de virem dizer que a sua vida dava um livro. O que terão as suas vidas de tão especial ao ponto de pensarem que alguém daria dez ou quinze euros por ela. E porque a vida não dava um disco? Ou um baralho de cartas? Ou um quadro? Mas porquê um livro? Qual é a obsessão de querer sacrificar uma árvore, que não faz mal a ninguém, só porque um lamechas se lembrou numa noite de copos que queria escrever o livro da vida dele.
Às tantas acham que escrever dá saúde, lá por o Saramago ter morrido aos 86 anos. Então para isso dediquem-se ao cinema, que duram até aos 102, não é Manoel? Sinceramente, não me entra no córtex central. A minha vida dava um livro…esperem, a não ser que a ideia passe em dar a escrever fora, como fez a Carolina Salgado. Poupa-se tempo e não se cansa a cabeça. Deve ser isso. As pessoas são totós ou quê, escrever um livro é ir ali à farmácia e pedir supositórios? Olhe, faça favor, queria um Livrex em cápsulas. Em cápsulas não há, temos pena. Não, pena não quero, faz calo no dedo. Estou a ficar avariado, os livros de filosofia do décimo ano não falam disto, mas sempre ouvi dizer que todo o homem deve ter um filho, plantar uma árvore, e escrever um livro!
Eureka! Então vem daí. Ai estupores que não me avisaram antes de escrever esta crónica.
Podiam ter dito logo, rapaziada, assim não estava para aqui a atirar barro à parede. Ainda por cima começa pelas tarefas mais fáceis: fazer um filho! Ou será por fases? Só plantas a árvore se fizeres um filho. Só escreves o livro se plantastes a árvore e fizeste o filho. Alguém me está aqui a perguntar: e fazer o filho, não tem exigência nenhuma? E quem não fode, nunca escreverá um livro? Eliminemos então esta questão idiota.
Aguardem. Estou a pensar. Vou fazer um xixi e volto já. Ainda aí estão, óptimo. Ora, bem, ora bem… (não, não sou pago à letra, isto é mesmo assim) Ah, valeu a pena ter ido soltar a bexiga. Já sei a solução: Ora, quando alguém diz «a minha vida dava um livro» esse alguém não é parvo não, pois sabe muito bem, por A + B elevado à raiz quadrada vezes 69, que, levará, outra, vida, a, escrevê-la, logo, mais anos de vida! Ó pá, posto isto sim, a minha vida é que podia dar um livro, mas o Kamasutra chegou primeiro…
(amor, volta!)