REBECA ( CAP I )
A cara estava amassada.
Rosto de quem acabava mesmo de acordar...
Os olhos de pálpebras inchadas.
Demonstravam que teve uma noite bem dormida!
Faziam dias, que não tinha um sono tranquilo...
Era de se esperar, tantos problemas para resolver!
Tinha momentos que se achava maluca, talvez a insanidade estivesse mesmo ocorrendo em si...
Mas rapidamente tirava esses pensamentos da cabeça, era senhora dos seus atos, então estava em pleno uso da razão!
Abriu o chuveiro, esfregava o corpo com o sabonete, que teimava em escorregar de suas pequenas mãos... Queria estar bem limpa, cheirosa, e por que não, apetitosa?
Saiu do box, cabelos lavados, e foi à pia:
Pegou a escova de dentes, e começou a olhar-se no espelho do banheiro, pensou então:
" Nossa! Que cara de quem dormiu uma semana!
Preciso melhorar isso"...
Passou um hidratante no rosto, pegou o lápis preto, para passar em baixo da pálpebra inferior, e realmente ficou satisfeita, porque seu visual agora melhorara bastante...
Sorriu para o espelho, conferindo se os dentes estavam totalmente limpos...
Agora, era só trocar a roupa, e sair..
Rebeca era conhecida pelos pratos deliciosos que fazia:
Ela tinha um pequeno negócio, onde nos fins de semana, ela servia refeições, sobremesas, sorvetes que ela mesma produzia, e também atendia as encomendas que surgiam até mesmo para ceias de Natal.
Onde passava na rua, diziam:
" E aí, Rebeca, que gostosura vai fazer para o fim de semana?"
Ela sorria e sempre respondia a mesma coisa:
" Vai até lá para saber, garanto que vai querer "
E assim Rebeca vivia, procurando os ingredientes aqui e ali, para nada faltar para suas tão famosas refeições de sábado e domingo...
Ela trancou a porta e saiu de casa para o super mercado que vendia por atacado, onde poderia comprar em maior quantidade.
Lá chegando, foi direto para a lanchonete do local, tomar café, porque quando sentiu seu estômago doer, percebeu que saíra de casa sem nada comer!
Como era muito "desligada" nem se preocupou antes com isso. Rebeca na verdade, estava cada vez mais assim, parecia que seus problemas faziam com que ela ficasse mais aérea, avoada mesmo...
Sentou-se em uma das banquetas da lanchonete e pediu seu lanche.
Assim que começava à comer, um senhor perguntou-lhe as horas, pois seu relógio estava parado.
Ela pegou seu celular, e respondeu olhando para o visor. Ele agradeceu, e sentou-se na banqueta ao lado dela.
Sem querer, ela deixou o café com leite cair em sua saia, e por pouco, não pegou na blusa também.
Limpou com uns guardanapos de papel, e continuou seu desjejum...
O senhor de seus 50 anos, virou-se depois de observar a cena, e disse-lhe:
"Se fosse a minha esposa, soltava até um palavrão agora!"
Rebeca, olhou para o tal senhor, e respondeu:
" Se eu fosse perder a paciência por tão pouco, não estaria mais viva, tinha dado um ataque do coração, com tanta coisa que ocorre comigo!"
Ele limitou-se apenas a levantar o polegar, em sinal de aprovação ao que ela tinha dito...
Era o que ele dizia sempre para sua esposa, ter paciência com as coisas...
Rebeca terminou o seu café e saiu dali, para dentro do hipermercado onde procuraria as coisas para fazer o seu menu...
Quando estava para passar no caixa, sentiu um sopro em sua nuca, como se alguém estivesse por trás dela, fazendo isso, e ao olhar para baixo, descobriu uma menina com um cata vento na mão.
Ora afinal não estava doida! Era apenas o ventinho que a menina fazia ao brincar...
Saiu dali apressada, tinha que fazer tantas coisas ainda!
Deparou-se com a mesma menina em frente ao seu carro e lhe perguntou:
_ Onde está sua mãe? Você não pode andar por aí sozinha, tem muita gente má nesse mundo, menininha!
A menina disse que estava perdida da mãe, e Rebeca então pegou-a pela mão e levou até um policial na entrada do estacionamento do hipermercado.
Feito isso, deixando a menina entregue a uma autoridade, arrancou com o carro dali.
Ao chegar em casa, foi retirando as compras de dentro do carro e depositando na varanda da frente.
Um vizinho passou por ela e a cumprimentou. Ela respondeu sem nem olhar quem era. Ele então, falou mais alto:
_ Rebeca, que bom dia, mais sem graça é esse?
_ Ah, oi! Desculpe Marcos, é que hoje estou mais aérea que os outros dias...
_ Olha Rebeca, vê se você se cuida, desse jeito vai acabar se queimando no fogão, quando estiver fazendo as suas refeições de fim de semana... Você anda com muita falta de atenção nas coisas!
_ É verdade, meu amigo... Mas o que fazer, se a minha cabeça não para de pensar um só momento, nos problemas da família? Eles não moram comigo, mas é como se estivessem aqui o tempo todo... Me ligam, e jogam tudo em cima de mim...
Ando assim de tanto queimar os neurônios!
_ O que te falta é uma pessoa para te dar carinho Rebeca, e não para te levar problemas... Ah, se eu não fosse casado e amasse tanto a minha mulher! Certamente eu não pensaria em outra para o lugar dela, além de você!
_ Que é isso, Marcos? Olha que alguém pode escutar e sair fazendo fofoca por aí!
_ Não se preocupe com isso... Agora vou minha amiga, e qualquer coisa, vai lá em casa, eu e Sonia estamos ao seu dispor...
_ Obrigada pelo apoio, Marcos. Mas se Deus quiser, eu vou melhorar da minha "fase desatenta"!
Ele saiu dando um aceno com a mão. Ela acabou de colocar tudo no lugar e foi ligar a TV para relaxar um pouco. Ligou no noticiário local e viu uma coisa que lhe chamou a atenção:
O senhor que ela havia conhecido na lanchonete, estava dando uma entrevista para o repórter do canal. Ela aumentou o som da TV, para escutar melhor o que ele dizia...
" Foi isso que aconteceu mesmo! Mal eu saí da lanchonete do hipermercado, o incêndio começou, não se sabe bem de onde, mas disseram que uma menininha morreu queimada, ela estava no colo do guarda, à procura da mãe. Bem, foi assim que me disseram..."
Ela ficou atônita! A mesma menininha que ela entregou ao guarda, acabou vindo a falecer, em um incêndio que nem ela sabia que acontecera depois que saiu do estacionamento...
Aquilo a fez pensar o quão pequeninos somos, diante do destino!
Se ela tivesse se demorado mais ali, poderia ter sido surpreendida pelo tal incêndio também, e essa hora poderia nem mais existir...
Por instantes se sentiu uma sortuda, mas ao lembrar daquela menininha, seus olhos encheram de lágrimas...
Foi até sua caixinha de remédios, e tomou uma colher de água de flor de laranjeira, dissolvida em água com açúcar...
Deitou-se. Resolveu que nada faria mais naquele dia, tiraria apenas para si... Afinal era uma dádiva estar viva! Com o sono, vieram os sonhos...
Sonhou que estava em um harem, em terras longínquas, dançaria para o sheik.
Ela não queria isso, mas era forçada a fazer. Sabia que ele escolheria a dançaria que lhe agradasse mais, para levar aos seus aposentos e fazer dela o que bem quisesse.
Dançava... Tinha que dançar ou a guarda do sheik, a machucaria.
Ela não tinha colocado os olhos nele, mas sabia que ele era bonito, as outras moças tinham lhe dito, antes da entrada no salão.
O sheik a seguia com olhos fitos no corpo de Rebeca, o desejo o inflamava... A dança dos lenços era muito sensual, e Rebeca a tornava mais ainda!
Por um momento Rebeca avistou-o. Era mesmo bonito! Mudava de ideia agora... Talvez fosse bom passar a noite com o sheik, quem sabe se o seduzisse bem, ela não teria a liberdade? Com uma boa lábia e muitos carinhos, talvez conseguisse fazer com que ele cedesse ao seu pedido.
Sim, era isso! Teria de fazer com que ele a quisesse para aquela noite...
Ela chegou mais perto do sheik, e se contorceu toda à sua frente com a dança, mostrando os belos seios para que ele notasse bem...
Ele reparou nisso: Ela realmente tinha seios lindos e fartos.
Não teve dúvidas: Bateu palmas para que a música parasse, e tomou-a pela mão, levando-a para seus aposentos. Foi uma noite prazerosa para ambos, mas Rebeca não soube do desfecho do sonho, porque foi acordada com a campainha tocando.
Levantou-se e foi ao banheiro para lavar o rosto, finalmente abrindo a porta. Ao olhar para a pessoa que estava à sua frente, tomou um susto:
O homem era igualzinho ao sheik do sonho que acabara de ter! Ficou meio engasgada, as palavras não saíam da boca...
Ele adiantou-se e disse:
_ Sou seu novo vizinho, soube pelos outros, que você faz refeições também por encomenda, D. Rebeca. Estou interessado em que cozinhe para mim , mas sendo diário, seu trabalho, o que acha?
_ Nossa! Que susto o senhor me deu! É que acordei agora, estou meio que dormindo ainda, sabe? Pois bem, entre por favor, vamos acertar isso...
Ele entrou e reparou a casa muito limpa, era esse o principal requisito para uma boa cozinheira!
Rebeca disse então, ao mostrar o sofá para que ele se sentasse:
_ Bem, posso fazer refeições diárias sim, não me incomodo com isso, mas seria em minha casa mesmo e levaria em uma 'quentinha', ou prefere que eu cozinhe na sua casa? Para mim, tanto faz... Apenas peço que deixe sempre os ingredientes que eu disser, nos armários e na geladeira, caso a opção seja a sua casa...
_ Sim, claro! Prefiro lá porque almoçarei feito tudinho na hora, e depois sairei para trabalhar. Gostaria de combinar o valor das refeições...
_ Bem, senhor... Ainda não disse seu nome...
_ Meu nome é Rassan. Acabei de chegar na cidade, sou de uma pequena cidade no sul, de descendentes dos turcos que vieram para o Brasil, meus pais imigraram para cá, e eu nasci aqui.
_ Ah.. Então muito prazer Sr. Rassan. Eu sou Rebeca o senhor já sabe, os vizinhos lhe contaram.
Bem, farei para o senhor o mesmo que cobro por refeição, nos fins de semana, sendo que cada dia, contará uma refeição, ou quer pagar por semana?
Ou seja, no fim da semana me paga as refeições que foram feitas, como prefere?
_ Bem, D. Rebeca, pago então no fim da semana, ok?
_ Sim, está bem. Comigo não vai passar sem comida!
E quer também que faça sobremesa todos os dias?
_ Pode ser... Gosto sempre de um doce depois do almoço.
_ Então estamos combinados! E quando começo, amanhã mesmo?
_ Sim, claro! Porque hoje já comi essas refeições congeladas de super mercado, e no micro ondas...
_ Ok, amanhã estarei lá pelas 7:30h da manhã para começar o seu almoço, e certamente 11:00h estará tudo pronto. Leve agora a lista das coisas para comprar, porque sem temperos, eu não faço nada!
E deixe também na geladeira carne, frango, ou o que quiser que prepare durante a semana.
_ Tudo bem! Vou agora mesmo cuidar disso. Um abraço D. Rebeca.
_ Faça um favor? Não me chame de 'Dona'. Fico me sentindo uma velha. Basta apenas Rebeca.
_ Sim, sim tanto melhor! Digo o mesmo, trate-me por Rassan.
_ Ok, então até amanhã!
_ Até!
Ela fechou a porta depois que Rassan saiu, e quase sem fôlego estava, tentou se controlar durante o tempo todo que ele ali estivera. Não queria que ele suspeitasse do seu nervosismo. Como aquele homem poderia ser igual ao de seu sonho? E ainda: Vir das mesmas terras do sheik!
Mistérios do destino, de novo!
CONTINUA...
FÁTIMA ABREU