Tancos, 29 de Janeiro de 1917
Querida Ana Maria:
Espero que esta carta te encontre de saúde bem como a todos os que te querem bem.
Estou-te a escrever no dia em que vamos partir para França defender a nossa pátria. Iremos de camião até Lisboa e aí apanharemos um navio Inglês que fará o transporte das tropas portuguesas até França. Não sei ainda o que esperar, confesso até um certo receio. Tenho noção que o nosso treino militar aqui em Tancos foi bom mas a vivencia do campo de batalha será com certeza diferente. Depois destes dias de licença em que pude passear contigo nos jardins do Marquês, e me disseste aquelas coisas doces ao ouvido debaixo do carvalho do teu jardim esse medo agudizou-se. Já foram formados os pelotões da companhia pelo que já sei os homens que terei que comandar nesta dura tarefa. Parecem-me rijos e determinados e decerto darão o melhor de si. Hoje estivemos em parada em cerimónia de despedida e esteve presente o General Tamagnini de Abreu e Silva que fez um grande discurso e penso terá insuflado coragem e determinação às tropas.
Guardo o teu lenço bordado com as tuas iniciais sempre junto ao meu coração e de vez em quando cheiro-o para me lembrar o teu odor a malmequeres bravos. Sempre que puder e tiver tempo escrever-te-ei para assim matar um pouco da saudade que já me assola o peito. Por hoje deixo-te com um caloroso abraço, beijo-te as mãos.
Teu João da Nóbrega
PS. Endereça por favor os meus cumprimentos ao Sr. teu Pai e à Sra. Tua Mãe.