o poeta.

que homem é aquele que me olha do canto da sala. da cerâmica do rosto, quase ferro fundido,meio sorriso. a boca fechada, o olhar gasto. o cabelo muito lambido, chegado para trás. que homem é aquele que me olha do canto da sala. tiraram-lhe metade do corpo ou nunca a fizeram. pela postura deve ter sido um poeta muito creditado, cabeça ligeiramente elevada, pescoço completamente esticado e a expressão madura. poeta. deve ser um poeta defunto. desses poetas de cidades do interior, pouco conhecidos mas muito afamados, que chegam a velhos com dores nos ossos dos dedos da mão que escreve. perdeu o nome, não há vestígios de nome na cerâmica, não há no verde-azul, quase escuro, nenhuma letra. só as dobras do casaco, o colarinho da camisa, tudo muito bem engomado. o nome nem sinal dele. talvez o tenham levado com a outra metade do corpo ou então nunca o fizeram.