A grande prostituta levantou-se da cama, corpulenta, suada, com um sorriso maldito, embebido de más intenções. O marujo finlandês, entorpecido, sem forças para gozar, rejeitar, se mover, com seu corpo estendido sobra a cama fétida de um prostíbulo barato na Praça Mauá, onde já não conseguia formular pensamentos e lembranças de onde poderia estar, era a presa fácil e frágil da mulher gorda e faceira.
Pobre homem de visão turva e confusa. A matreira, contava o vil metal extraído de sua carteira, com a calma das enormes rapinas quando extraem as vísceras de pequenos roedores. O marinheiro tentou um movimento, e em vão fora anulado por um simples empurrão da enorme vadia. Sem nada poder fazer, entregou-se aos braços supremos de Morfeu. A mulher vestiu com dificuldade seu enorme corpo, apagou a luz e o deixou inconsciente. O finlandês, longe do aconchego e da proteção de sua casa sentiu-se numa escuridão infinita.
Ao despertar, num impulso ansioso, viu a luz do dia invadir o antro por uma pequena fresta de rasgo na cortina rosa encardida. Seu corpo nu, ferido, o preocupou. Juntou sua monta, os restos de sua derrota e saiu do quarto às pressas. Não viu ninguém no corredor do prostíbulo, nem na portaria havia uma alma sequer. Se houvesse alguém, certamente teria se escondido, com medo de novas ameaças. Sua cabeça, com a ressaca e o efeito da droga que a prostituta teria administrado em sua bebida sem a sua ciência, era o estrondo da casa de máquinas de sua embarcação, ancorada no porto, próximo. Voltou para o seu navio e contou a malfadada desventura aos seus colegas.
Noite quente. Ruas vazias. Alta madrugada. Poucos circulavam pelas ruas do Centro do Rio. Cinco dias após o golpe no gringo que teria chamado por apelidos clichês de baixo-calão ao contar a façanha para as colegas de vida fácil, ela caminhava pesada e satisfeita para sua casa na favela da Maré, após mais uma noite faceira de trambiques e cambalachos. Buscava um táxi, para o seu conforto de abelha rainha. Ao cruzar a Rua do Acre, cinco homens sob a silhueta da noite, emergida entre o contraste das trevas com a iluminação pública da rua, cercaram seu caminho. Não teve quaisquer chances. A grande caçadora, era a leoa indefesa presa das hienas famintas de vingança, que riam, batiam, e falavam ásperos num idioma forte que não compreendia.
A manhã assolou a cidade, com um sol digno do inferno. Seu corpo nu, enorme, com uma poça de sangue seco, tombado sob o asfalto escaldante sem vida, era notícia dos jornais popularescos. À distância, no horizonte da baía de Guanabara, um cargueiro com a bandeira finlandesa, ganhava o Atlântico.
Conto extraído do livro Angustiolândia, de Romulo Narducci.