Escrevia-te os sons, de uma manhã dourada, no guardanapo que te lustrava o sorriso. Eram cânticos de pardais excitados pelo calor do dia. Eram notas de harpas cansadas que caiam das folhas das árvores quando se espreguiçavam. Escrevia-te os sentidos arrepiados por cada gesto que fazia, cada corte, cada rasgo nas verduras escolhidas por um olhar cansado do tempo. Escrevia-te as frases espalhadas na mesa durante anos e anos. Eram manchas escravizadas na toalha de sempre. Escrevia-te o silêncio e o vazio de cada refeição fria. Era o horário da vida que te mantinha ausente.
Hoje caiu-te o sorriso na panela da sopa quando, ao cheirares, encontraste o poema.