a fuga do pássaro.

de fora da imagem beijas a boca do pássaro. ele voa contigo na boca, leva-te sobre os precipícios e as falésias e os mares de longe. tudo sempre demasiado longe de ti, de propósito. tu respiras pela boca do pássaro. tu aguentas na boca do pássaro e descobres que é nas nuvens que o mundo guarda a memória, que agora ves passar-te pelos olhos em forma de ar. tu engoles as memórias do mundo. estás fora. estás na boca do pássaro, ferras os punhos, enterras as mãos nas penas. lembra-te: queres morrer, precisas de cair. voltas ao coração com o pássaro no ombro, queres falar-lhe de ti, de como foste comido por uma estrela, numa rua de sentido único. não falas, o pássaro tirou-te a língua. no coração todas as imagens das memórias do mundo.estás pesado, o corpo cai-te flácido no chão. o pássaro passeia os teus ossos nas patas, de um lado para o outro. encurta o percurso. fora de tempo dói mais o peito. fora do espaço não há quem te leve o coração. e ela chega. com os braços fala-te do céu, do pássaro, das nuvens, do mundo. beija-te o pedaço de lábio que te sobrou. desaparece pela imagem adentro como se te procurasse.