Escolho meus amigos não pela pele
ou outro arquétipo qualquer,
mas pela pupila.
Tem que ter brilho questionador
e tonalidade inquietante.
A mim não interessam:
os bons de espírito
nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim
louco e santo.
Deles não quero resposta,
quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias
e agüentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco!
Quero os santos, para que
não duvidem das diferenças
e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos
pela alma lavada
e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo,
quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto,
não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim:
metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis,
nem choros piedosos.
Quero amigos sérios,
daqueles que fazem da realidade
sua fonte de aprendizagem,
mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade infância
e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam
o valor do vento no rosto;
e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois, os vendo loucos e santos,
bobos e sérios, crianças e velhos,
nunca me esquecerei de que "normalidade"
é uma ilusão imbecil e estéril.
* Oscar Wilde (1854-1900) foi um dramaturgo, escritor e poeta irlandês. Expoente da literatura inglesa durante o período vitoriano, sofreu enormes problemas por sua condição homossexual, sendo preso e humilhado perante a sociedade.
Imagem: Madness in Golconda dream of sleepwalker, do pintor surrealista belga René Magritte (1953)