Além das Aparências
Jorge Linhaça
Temos, como seres humanos, uma propensão inata a estabelecer juízo sobre aquilo que vemos ou tomamos conhecimento em sua superficialidade.
Talvez pela própria velocidade com que as coisas acontecem e as notícias nos chegam, muitas vezes em tempo real, embora fragmentadas, nos tornamos cada vez mais apressados em tomar partido, principalmente quando os fatos geram uma comoção coletiva. Imergimos numa catarse coletiva como que controlados por um estado de semi-hipnose e nos deixamos levar pela corrente, de acordo com nossos paradigmas.
Uma histórinha interessante, como ilustração, é aquela do motoqueiro que acelera sua moto pelas ruas da cidade de maneira aparentemente irresponsável, costurando o trânsito como um alucinado, desrespeitando as sinalizações até que sofre um acidente.
A primeira reação de boa parte das pessoas seria a de condenar o próprio motoqueiro:
Bem feito!...esses irresponsáveis! Quem procura acha!...Azar dele!
Reação até certo ponto compreensível...
Agora voltemos no tempo...
Zé da Silva, escriturário, casado, pai do pequeno Junior de 4 anos de idade, recebe um telefonema:
- Sr José?
- Sim sou eu...
- Sr José , aqui é do hospital , seu filho sofreu um acidente e está em estado grave aqui em nossa instituição...precisamos que o senhor compareça aqui com urgencia para poder autorizar os procedimentos cirúrgicos. Anote aí o endereço por favor...
Zé da Silva, desnorteado e apavorado com a notícia, sai do trabalho, apanha sua moto, veículo comprado à prestação, e parte para o hospital o mais rápidamente possível.
É o mesmo motoqueiro do início do nosso relato...
- Poxa, Linhaça...mas aí a coisa muda de figura...você não tinha contado essa parte...
Verdade!.. um fragmento de história leva-nos a fazer julgamentos errôneos, baseados em nossos paradigmas.
"Talvez a maneira mais forte de definir o conceito de paradigma seja dizer que ele representa os conteúdos de uma visão de mundo. Isso significa que as pessoas que agem de acordo com os axiomas de um paradigma estão unidas, identificadas ou simplesmente em consenso sobre uma maneira de entender, de perceber, de agir, a respeito do mundo. Os que partilham de um determinado paradigma aceitam a descrição de mundo que lhes é oferecida sem criticar os fundamentos íntimos de tal descrição. Isto significa que o olhar deles está estruturado de maneira a perceber só uma determinada constelação de fatos e relações entre esses fatos. Qualquer coisa que não seja coerente com tal descrição passa desapercebida; é vista como elemento marginal ou sem importância." in http://www.ucb.br/prg/comsocial/cceh/textos_paradigmas.htm
Assim sendo, em uma sociedade cada vez mais sujeita a toda forma de propaganda, é natural que muitos se deixem levar pela voz que mais ouvem, pelos conceitos mais vezes repetidos, até mesmo à exaustão.
Acostumamo-nos, como na obra de Aldoux Huxley " Admirável Mundo Novo"
a fazer de " 62.400" repetições uma verdade introjetada em nosso ser.
Creio que mesmo que nem sejam necessárias tantas repetições assim.
Se passarmos a acreditar, por exemplo, que tudo que o Linhaça diz é verdade, corremos o sério risco de deixar de pensar por nós mesmos e nos deixarmos levar por idéias ou impressões equivocadas. Claro que isso não se restringe ao Linhaça...na verdade a coisa é muito mais grave quando acreditamos em tudo que a televisão nos vende como verdade/mentira ou bom/mau.
Notícias fragmentadas geram visões fragmentadas e causam um malefício enorme pois, no geral, as pessoas não se preocupam em buscar maiores esclarecimentos.
É prática comum na mídia, fazer um enorme barulho sobre algo que atinge a emoção do ser humano e não aprofundar-se no fato, repetindo, à exaustão, cenas ou depoimentos de primeira hora. No entanto, com o passar do tempo e o esclarecimento de alguns pontos, vão diminuindo o seu ímpeto "jornalístico"
e apenas comentam de passagem os novos fatos.
É como os direitos de resposta...colocam-se minutos e minutos, ou laudas e laudas de um certo assunto, destacado em horário nobre ou primeiras páginas e, na hora de rever a informação inicial, gastam-se segundos ou notas de rodapé perdidas no meio dos jornais ou revistas.
É preciso tomarmos muito cuidado antes de caírmos na grita geral, envolvidos por interesses nem sempre tão nobres quanto se aparentam.
É preciso que o ser humano, reacostume-se a pensar por si mesmo, que tire um tempo para a reflexão antes de sair repetindo,qual um papagaio, aquilo que ouviu no telejornal ou leu em determinado texto.
Sei que não é uma tarefa fácil em um mundo massivamente massacrado por mensagens do "politicamente correto".
Em geral, os pensadores não tem espaço ou destaque na mídia, o que vemos hoje é uma informação sistematicamente superficial, por uma lado incapaz de levar a uma séria reflexão sobre o que quer que seja e, por outro lado, altamente proveitosa para manipular a opinião pública segundo o interesse de alguém.
Talvez um exercício saudável para evitar sermos totalmente manipulados, seja nos fazermos algumas perguntas chaves:
Quem? Quando? Onde? Por que ?
E podemos acrescentar outras do tipo:
Quem ganha com isso?
Quais as motivações dessa ação?
Quais efeitos podem vir daí?
É um fato isolado ou faz parte de um planejamento?
Isso pode não nos garantir que não sejamos enganados ou nos equivoquemos em nossas conclusões, no entanto há de nos fazer ao menos pensar por nós mesmos.
Não deixará de ser um grande avanço, não acham?
A "bola da vez" é o ataque de Israel ao comboio "pacifista e humanitário" e a história inicial já começa a ganhar outros contornos levando a novos questionamentos...
Por que a cineasta Ana Lee, levou fimadoras de alta definição na viagem se a única intenção era uma ação humanista?
Por que seu cinegrafista costurou os "cards" na cueca?
Será que foi tudo "improvisado" ou já havia algo planejado nesse sentido?
Por que ela não entrega as imagens ao comissariado da ONU ao invés de levá-los para os EUA e editá-los primeiro?
Será que tudo é pura coincidência?
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