Contos : 

Segue o fluxo da vida ! - João Carcule

 

Segue o fluxo da vida - João Carcule

Já sonhou? Já imaginou? Já achou o mapa da mina? Então isto é pra você!!!

Depois de um velório agitado e de despedidas hilárias, voltemos ao sério. Criança é um caso sério mesmo!! Só quem cria é quem sabem o quanto de trabalho dá. Olha que o mar não está para peixe como antigamente. Eu escuto os mais velhos falarem que antigamente bastava o pai olhar torto, que a criança se colocava no seu lugar e a situação estaria resolvida. Hoje a história mudou. Esses casais mais novos, se um deles olhar feio para a criança, esta já manda de volta um olhar mais feio ainda ou já fala alguma besteira para responsável pelo olhar. A gente ouve muitos comentário de que criança é um investimento do futuro. Porém com o perdão aos donos da palavra, porque não sabem o que dizem, já ouvi conversa de que algumas crianças não passam de um investimento a fundo perdido. Desabrocham o mau caráter de dentro dela, os pais não percebem alargam os limites e daí para perdição é um passo só. A gente ainda se lembra daqueles investimento no nordeste a fundo perdido, investe mas não cuida!!

O meu tio falava que o primeiro filho dele foi um sufoco, já de nascimento deu trabalho até na gravidez. Já fazia um ano que eram casados. A esposa ainda não tinha nem um sinal de gravidez. O meu tio ficava nervoso, as pessoas já colocavam em dúvida a sua masculinidade! Sabe leitor, a gente cuida da vida da gente, mas não pode conter o diz-que-diz-que das pessoas e chateiam a gente. Tem pessoa que não cuidam da própria vida, mas sempre acha um tempinho para cuidar da vida da gente, é comum esse tipo de comentário: Quando vai casar? Já vem logo o primeiro filho? Está na hora!! Como se as pessoas determinasse o destino da gente. Ele , o meu tio , queixou-se disso na conversa que tive com ele. Que isto é um fato, nós já sabemos! Então vamos mudar o rumo da prosa e vamos cirandar com as crianças!

Fizeram novenas e novenas e o casal pedindo a Deus um filhinho! Só os dois sabiam dessas rezas, não contaram para ninguém. A não ser quando terminou oitava novena que foram obrigado a chamar o meu avô para rezar, com eles, o ultimo dia encerramento dos nove dias de reza. É ... diziam que podia rezar quantas novenas quisessem, porém no último dia, no fechamento das novenas, teriam de chamar um padre ou um representante de Deus para fechar esse ciclo e foi aí então que o meu avô ficou sabendo do desejo do casal. Ficou muito feliz com o desejo e escutou muitas lamentações também por ainda não terem conseguido prenhar.

Eis que num belo dia o sol nascera diferente, parecia sorrir, o meu tio levantou olhou para o céu , havia uma nuvem com um formato de um nenê e a imagem, com o vento, lá no céu ia mudando de formato e se transformando numa criança bem divisada. Chamou a Antonia, sua esposa, e mostrou aquela imagem no céu. Ele disse para ela "Eu acho que você vai ficar prenha, aquilo é um grande sinal!!" Os olhos dela encheu-se de lágrimas, entretanto não passou dali, conhecia bem o meu tio: era muito brincalhão. O tempo passou e não é que ela ficou gravida mesmo.!!! Sabe leitor, a gente segue o fluxo do destino e ele colabora para que as coisas aconteçam tal qual está escrito para vida da gente. Tem gente que fala "Você bate na porta e está fechada e ninguém abre, porém você bate na outra e ela se abrira! " Alguns têm tanta sorte que em todas que batem sempre abrem! Não é assim leitor? Por outro lado tem outras que batem até com a cabeça nas portas, porque os dedos já inchados não aguentam mais bater! Aí abre uma e o desgraçado ainda por azar tem que abraçar o diabo!! Não é verdade leitor? Mas é um fluxo da vida, então a gente segue o fluxo!

Pois é bateram na porta do meu tio e ele abriu, ganhou do seu visitante um trabalho novo e um novo lugar para morar. Longinho o lugar, mas o salário compensava, daria para fazer algumas economias e até quem sabe sonhar com uma casinha própria! Todos os convites têm suas implicações. Quando se dá muito, é porque está sobrando ou ninguém quer! Não é assim? Souberam depois que morariam bem afastado da vilinha da qual moravam. Antes que o desejo atuasse e virasse a cabeça, foram conhecer o lugar.

Era muito bonito, havia uma lagoa próximo da casa, muitas árvores frutífera, um bom pasto para animais, um encantamento para os dois jovens. Voltaram animados com o que viram e com a oferta. Ganhariam o básico para comer, porém ganhariam uma galinha com pintinhos já crescidinhos, quatro porquinhos para iniciar a criação, um pangaré e uma cabra com um cabritinho e ainda plantariam no terreno e não pagariam nada pelo uso. Caiu do céu está proposta. Eles na estrada quando voltavam, já sonhavam com vários porcos gordos sendo vendidos, aquele monte de frango no terreiro pedindo para serem vendidos ou virar ali no sítio uma canja. Imaginaram as crianças correndo atrás das criações e viram alguns dos filhos até apanhando, porque subiu na árvore ou por outra traquinice qualquer!!

Uma semana de espera. Nem foi semana, parecia uma eternidade. Mas o que é acordado sempre é aprazado. Lá estavam eles na carroça e de mudança! No caminho foram misturando sonho com realidade e respirando o ar puro do sertão com uma mistura de esperança e de progresso. Encontraram no caminho com uma raposa ali, com um tatu acolá, Um sabiá na árvore, uma codorna no chão e no batidão que andava na ânsia de desfrutar chegaram num de repente. E num átimo as coisas já estavam na casa, tudo amontoado num canto e outras espalhada pela casa. Não tinham muitas coisas mesmos, naquele tempo não se tinha luxo. E naquele lugar qualquer pé de frango dava um virado bom! As malas eram duas trouxas: uma de roupa e uma outra de utensílios de cozinha. Esta era a mudança deles! As maiores malas estavam nas cabeças dos jovens, eram malas e malas de sonhos e de esperanças!! Bonito isso. Hoje se não tiver casa própria, um micro-ondas, uma máquina de lavar, uma televisão e muitas coisas mais os jovens não querem se casar! Preferem ficar! E ficar morando na casa dos pais e se brincar um pouco, querem até mesadas!

Dormiram aquela noite tão pesado que nem perceberam que durante a noite o telhado estalava, produzia um barulho de chamar a atenção de corajosos, imagine só os medrosos. No outro dia acordaram de manhã e já foram para a lida, os sonhos teriam de ser perseguido, Deus fizera a sua parte, agora faltavam a deles , limparam, organizaram, pintaram, arrumaram e tudo que é "aram" possíveis dos verbos de ação e nem viram passar o tempo. E muito menos o barulho do telhado e já faziam três meses que estavam de moradia nova em nem perceberam as coisas estranhas que aconteciam a noite, o futuro ainda estava longe e o presente era só trabalho.

Um dia apareceu um senhor velho com um porretinho como bengala e pediu guarida por uns dias. O meu tio achou com fundamento as argumentações do andarilho e o recolheu para dentro de casa. O velho dormiu uma semana num quarto pequeno no lado do paiol, trabalhou a troco de comida e ainda ensinou muitas coisas ao casal na lida com a terra e disse em tom de profecia! "Oie, logo ocê vai ser papai e ocê precisa aprendê a contá estória pra ele! Quando criança a gente precisa exercitá a imaginação! Um home só é feliz e criativo se exercitá a imaginação! " Numa das noite à beira do fogo no chão, ele contou uma história e surpreendeu o meu tio pela maneira inovadora de contar, foi colocada em versos!

I
"Do beral da casa puxei
A minha vara de pescá
Era um sonho antigo
Eu falava para um amigo
Pra quando aposentá

II
Peguei o meu velho borná
Enrosquei no meu ombro
Ele eu achei no escombro
Pois a minha mué ia jogá

III
Era relíquia do meu avô
O véio sempre pescava
Sempre seu neto convidava
Só nunca eu disse - Eu vô

IV
Só fui intendê a sua intenção
Era de não dexar que a vida
Pra mim fosse dolorida
E exercitá a imaginação

V
Peguei o meu veio cavalo
Nem liguei pra gozação
Só ia exprementá a emoção
E pé na estrada num só estalo

VI
Meu borná cheia de isca
Minhoca, pão e espiga de mio
E segui sem desviá do trio
Era meu dia de conquista

VII
Já na barranca do rio
Debaixo de um pé de pitomba
Escutava como um bomba
Os pulo dos pexe a fio

VIII
Isquei o meu anzor
Pra pegá pexe pequeno
Era apenas um treno
Só até aparacê o sór

IX
Brilhou no céu o ouro
Raio de luz passaram
Entre as ávores raiaram
Dizia o dia será um estouro

X
Isquei na ponta um pão
Joguei a linha n'água
Brincadeira sem mágoa
A vara curvou num puxão

XI
O pexe era grande escapou
Uma minhoca coloquei
E mais atenção eu prestei
Pegou mas a linha rebentou

XII
Coloquei uma grossa linha
A minha intenção era pegá
Um pexe grande e mostrá
A todos a expriência minha

XIII
Tudo errado de nada adiantô
O pexe era grande e pintado
Parecia um saci pulando fiscado
E a linha deu pra trás afroxõ

XIV
O pexe era o mesmo diabo
Comeu grão de mio e pão
Espiga no anzol era intenção
Pra pegá o intespentiado

XV
Já era noite e naquela escuridão
Joquei com força me deu fadiga
Mas punha a fé na minha espiga
Preparei com cuidado o coração

XVI
O barulho na água foi diferente
Parecia barulho no mato
Me preparei tirei até o sapato
Eis que ele veio no repente

XVII
Senti uma grande fiscada
Fiquei tenso e com arrepio
O pexe podia ser arredio
Na árvore de uma laçada

XVIII
Era grande a força que eu fiz
Puxei e com fé já havia rezado
Ele pareceu fiquei abismado
O grandão escapa o ditado diz

XIX
Eu puxei a linha num estalo
Com muita procupação
João você a credite ou não
Eu tinha pescado um cavalo

XX
Atinei a resposta para situação tal
Com força havia o anzol jogado
A isca caiu no pasto do outro lado
A espiga ficou no meio do capinzal

XXI
O bicho viu e depressa comeu
Eu senti a vara tremer com puxão
Não imaginava naquela escuridão
Esta é a verdade que mentira se deu

XXII
Olha que destino triste
Fui obrigado a aceitá
E até mesmo sem importá
Com dedo em mim em riste

XXIII
Eu sei eu sou um cara brioso
Mas disseram ser maromba
Notícia da pescaria virou bomba
Hoje eu sou um grande mentiroso

XXIV
Amanhã eu vou simbora
Agradeço a atenção dada
Cedinho eu pego a estrada
Vou com Deus e N. Senhora!

XXV
Acredite que seu fio vai nascê
Antes deste inverno chegá
Você vai esforçá de aprende
E tê muita estória pra contá

XXVI
Vai sê criança muito traquina
Desse de derramá café do bule
Será o fio do Seu João Carcule
Para estória o mapa da mina

O velho foi embora e a profecia concretizou-se. Então o rebento veio e veio gordinho saudável, bonito, lindo, maravilhoso, esperto, inteligente e todas as qualidades que só os pais vêem nos seus filhos! Foi aí que o meu tio passou a perceber o trabalho que os filhos dão aos pais.

Os dias foram passando e vieram as noites mal dormidas por causa do pimpolho. Foi então que começaram a perceber as coisas estranhas que aconteciam a noite em volta da casa. Mas isso leitor, fica para outros e outros causos!!

(Santiago Derin)




Exercitar a leitura é alimentar o intelecto!!!

 
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ramedaol
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