Depois das aulas, no regresso a casa, perdeu-se. Estava habituado a orientar-se pelas estrelas e, nessa noite, não havia estrelas. Os candeeiros da iluminação pública desorientaram-no. Deu voltas e voltas sem saber por onde e ao passar pela terceira vez na mesma ponte sobre um riacho convenceu-se de que devia seguir em frente, na direcção do pio dos mochos. Quando parou de andar, vencido pelo cansaço, ao primeiro sol da manhã, viu que o lugar desconhecido em que se encontrava era o fim do mundo.
Incrível! – exclamou.
Uma regra de oiro dos montes penhascosos em que foi pastor durante vinte anos iluminou-lhe a mente «diante de um precipício, andar para trás é a única forma de andar para a frente». Mas não sentia vontade de retroceder.
Esses momentos ficariam na sua memória como os do primeiro encontro com aquela que viria a ser sua companheira inseparável até ao último dia de vida: a Insónia.
A sombra de uma árvore enorme que tinha sido arrancada pela mão de um gigante poderoso era um convite a que se abrigasse do sol para dormir.
Deteve-se diante daquele raizeiro ao ar, maior do que a casa dos sete anões. Ao peso das pálpebras, fechou os olhos sem resistência, escutando rugidos rotundos que lhe lembravam trovões, mas eram as vagas do mar. Do mar que ele não via e nunca vira. A insónia não o largava. Quem dera rebanhos para contar.