Crónicas : 

EU COM VINÍCIUS

 
p/ Ana Martins

Eu era apenas um menino. Só com quinze anos, que queria jogar futebol e pensava em ser padre, por influência da avó materna, que sonhava em ver o neto mais velho de batina.
Na casa em frente onde morávamos, estava o produtor musical Fernando Faro. E ali também ficava hospedado o poeta Vinícius de Moraes. Minha mãe, que partiu no dia 11 de janeiro agora, mostrava o poeta, ao lado do seu sempre fiel escudeiro, Toquinho, o violonista e compositor Antônio Pecci Filho.
Jamais na minha idade de quinze anoscheguei a me aproximar de Vinícius. Sempre tive uma timidez incorrigível, o que talvez me tenha dado o dom de escrever e de pouco falar. Embora ele, Vinícius, fosse pequeno no tamanho, mas grande no que escrevia. Foi preciso me tornar jornalista um dia para entrevistá-lo, beber um gim-tônica às dez horas da
manhã com ele e nos tornarmos amigos. Ouvi de boca, logo cedo, já tocado pelo álcool, o seu Soneto de Fidelidade, e depois me cantar o seu Berimbau, parceria com o também genial Baden Powell, acompanhado pelo violão de Toquinho, que,por sinal, não bebia. Vinícius não sabia cantar, ele mesmo tinha ciência disso, mas dizia como um poeta deve dizer.
A revista Manchete foi generosa comigo: publicou em página dupla a foto, feita por José Pinto, com os dois - Vinícius e eu com o copo de gim na mão.
Mais tarde, o compositor de sambas primorosos, Zé Keti, entra na redação do Diário Popular, na rua Major Quedinho, onde eu também colaborava com as minhas crônicas diárias. Dirige-se à minha mesa. Me puxa pelo braço. "Vamos descer um pouco", ele diz. Entramos no café Estadão. Eu peço um uísque, ele um café. Com muito jeito, ele me diz: "Seu amigo Vinícius morreu hoje cedo. Na banheira. Na casa dele.Não vai dar tempo de você ir. Nem eu vou."
Entornei meu uísque de um gole só. E não quis escrever mais nada. Não voltei à redação do jornal. Tomei um porre danado. E deixei por isso. Um poeta, como Vinícius não morre, vira estrela. Prometi que se um dia tivesse um filho homem se chamaria Vinícius. Não tive. Fico devendo.



Presença de Vinícius

"Porque hoje é sábado."
Vinícius de Moraes

entro na sala e encontro o poeta
juntos erguemos nossos copos
e brindamos saúdes antigas

o poeta fuma
eu fumo também como se cumpríssemos
a um ritual secular
cedo demais para beber e fumar tanto...

o poeta se ajeita na poltrona e ri
vinícius não morreu - concluo
está apenas a fazer graça
hoje vinícius não pode morrer

vinícius está bem vivo aqui comigo
na sala
vinícius bebe e fuma comigo
na sala

vinícius respira tranquilo
ao poeta hoje
não é dado o direito de morrer

acordem as amadas
todas as amadas
e as mal-amadas também

hoje não é dado a vinícius
o direito de morrer
hoje não
porque hoje é sábado

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júlio

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júlio


Júlio Saraiva

 
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Julio Saraiva
 
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Enviado por Tópico
Betha Mendonça
Publicado: 22/05/2010 21:01  Atualizado: 22/05/2010 21:02
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Usuário desde: 30/06/2009
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Mensagens: 6700
 Re: EU COM VINÍCIUS
Tua crônica está primorosa, Júlio.Para que a gente sinta a imortalidade de Vinícius: na juventude ao som do violão nos barezinhos da vida eu cantava Vínicius, declamava o Soneto da Fidelidade e o Soneto da Separação com os meus amigos.Hoje o meu filho de quase 19 anos toca no violão Vinícius e ama o clássico disco Tom, Vinicius, Toquinho e Miucha.
Bjins, Betha.
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Enviado por Tópico
elendemoraes
Publicado: 25/05/2010 04:32  Atualizado: 25/05/2010 04:32
Colaborador
Usuário desde: 05/05/2010
Localidade: Rio de Janeiro - Brasil
Mensagens: 507
 Re: EU COM VINÍCIUS
Olá Julio,
boa madrugada!
Sei tb de histórias incríveis sobre o Poeta,
principalmente as que se passaram na clínica São Vicente,
na Gávea, onde ele se internava por livre vontade,
quando o fígado voltava a lhe tirar a paz.
Tudo nele/dele me emociona,
mas ouvi-lo cantar o fado que compôs para Amália,
me põe em extase:

Saudades do Brasil em Portugal

O sal das minhas lágrimas de amor
Criou o mar que existe entre nós dois
Para nos unir e separar
Pudesse eu te dizer
A dor que dói dentro de mim
Que mói meu coração nesta paixão
Que não tem fim
Ausência tão cruel
Saudade tão fatal
Saudades do Brasil em Portugal

Meu bem, sempre que ouvires um lamento
Crescer desolador na voz do vento
Sou eu em solidão pensando em ti
Chorando todo o tempo que perdi.
(Vinicius de Moraes

Abraços!


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