Eu escrevo a poesia do ânus
cuja letra fecalíssima, intestinal
escorre pelos canos
e corre pelos campos, felicíssima
à maneira de cavalos, ou de ciganos
corre pelos rios, seus caminhos
minha poesia são cavalos-marinhos
sem rédea, sem regra
pela rede de esgoto
corre o cocô, corre o potro
de uma liberdade obscura, toda cega
minha poesia é uma égua
que corre pelos caminhos tortos
de uma régua
e que muitas vezes não é lida
pelos vivos
porque só aos mortos se entrega
Sim, os mortos me lêem
e estão vivos nesse tipo de vida
que é a literatura
um novo tipo de sepultura
que é estar lendo
deitado, prostrado, paralisado
numa acinética cultura
de um pensamento acidentado
A poesia do ânus percorre canos
que pelo chão abençoado diz aonde vamos
- canais que se multiplicam assim
como extensões anais sem fim
jorrando para partes ignotas do subterrâneo
os fluxos ou humores que sugais de mim
Úmero Card'Osso
Úmero Card'Osso