O que dizer quando se quer um novo poema às vésperas dos meus infortúnios atos maledicentes? O que fazer numa tarde letárgica e angustiante onde observo o cinza transmutar-se vagarosamente por imagens vultosas trazidas à minha incompreensão? Quereria pular o amargo?! Passaria a voar com os pés encravados em toda merda urbana? Quero ver de novo! Sugar a seiva de tuas entranhas na luxúria escancarada no sabor do orvalho! A muito tempo não beijo as estrelas. A muito tempo não sei do brio da escuridão.
O tempo é o meu carrasco e juiz. O cimento enamorado à poeira constrói o pedestal dos ignorantes (ELES SÃO OS BABUÍNOS DA CIDADE). Ah, o que escreverei senão tormentos e tormentos de minha fatídicas desventuras por este vasto mundo de usuras?
Na véspera, vestirei meu terno rasgado, comprarei um buquê de flores mortas e escreverei o meu testamento. Farei, então, promessas para os meus próprios testemunhos isolados da convicção. Sairei com o gosto acre de derrota na garganta jaz degolada pelo último conflito. Passarei como um pássaro! Como um pássaro passarei e, então, num triste assovio cantarei. Vou emoldurar o meu coração para que todos contemplem veias e artérias. E o meu cérebro? E quanto a esta fantástica fábrica de confusões? Eu quero um gole de endorfina! Venha, me faça gozar em seu umbigo para que eu nasça de novo!
Na véspera, eu percebo: meus cabelos não são os mesmos, minha boca não é a mesma (principalmente a palavra que ela profere), meu sorriso... (quê sorriso?) meus passos continuam tortos, meu pênis continua torto, meu cu continua peidando, meus olhos vêem tudo o que eu não vejo, minha alma... meu espírito... minha vontade não é a mesma!
E
N
T
R
E e veja como o mundo gira! Tudo é questão do tempo nos engolir. E nós aqui, na véspera do que pode vir. O que está por vir, nunca poderemos saber, nem tocar, nem comer, nem querer... Mas quando às vésperas eu estiver, escreverei com sangue o último poema.
Rio de Janeiro, 06 de junho de 2002.