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ALUCINAÇÃO

 
ALUCINAÇÃO


Na inconstância de todos os delírios
As fontes rasgam a paisagem
Desejosas de respirar a luz da natureza…

Ondulados ao vento os cabelos
Carregam os intervalos do tempo
Como flores brotadas da aridez…

O delírio navega num mar sem ondas
De encontro ao farol do tempo
Que se prolonga na vicissitude do momento
Quando o movimento não é se não a morte
Ou quando o espírito da vida
Insano e púbere
Se afasta do corpo e vagueia
Fendido de tormentos
Pelo mar morto dos desânimos.

Fora isto
Um desejo abstracto de ser tudo
Uma forma incompleta de um desejo total
Onde o absoluto
É apenas um mar de sensações perdidas
Num labirinto sem início.

Sobre os cabelos ondula uma lemniscata frustrada
Que contém apenas a sorte que nos recusa
Com uma promessa de céu amortalhado
Entre conselhos levianos e abjectos…
- Estais sós!

Neste vazio concreto de incertezas
Uma lareira deposita os restos mortais na poeira
Onde apenas a dor do poeta sobressai
Perdido num vaga-lume sem alcachofra nem verão
Para dizer aos condenados da cidade:
- Não estais sós!

Estamos realmente sós…!!!

Ao nosso redor
O xaile de uma fantástica alegria forçada
Forja romarias e fogueiras de fé.
O álcool depura a sede de vida dos rotinados
Que à falta de uma perspectiva em forma de bandeira
Fazem das horas que lhes restam retalhos de dias iguais
Com sorrisos e cumprimentos nómadas e banais!
- Estão sós…

Por vezes ainda procuram na fonte que sufoca de luz
Um motivo para que justifique uma pulmonar inspiração
De tanta fantasia alcoólatra.
Então riem… dançam… cantam…
Só a futura esperança é nada!

Em permeio com tanta frustração
Içam a bandeira já rasgada pela mão dos sonhos
Arremessam ao vento teorias platónicas
E aguardam junto à lareira o futuro de ontem.

Se alguém me perguntar pelo que já foi
Antes ou depois da leucemia da fantasia
Respondo com a voz embargada de tanta indignação
À agonia dormente das esperanças assassinadas
Ao longo das pedras petrificadas pela indiferença:
- Não sei.

Se alguém na jactância do desespero
Insistir em perguntar pelos dias vindouros
Como quem pensa que tendo barro é oleiro
E quer martelar o caminho na forja do que virá
Respondo com um vale fingido de emoções:
- Não sei.

Vendo bem… Que sei eu?
Talvez nas palavras que nunca escrevi
Ou nas crenças que me passaram à margem dos sentidos
Saiba que existimos como sentinelas…
Talvez para não falar do que não sei
Encontre refúgio entre suspiros e luzes delirantes
Descubra no pecado mortal do olhar
Uma resposta fria, vazia e irreal…

De que me serve ter uma resposta
Quando todas as questões são mortíferas
Quando ninguém quer saber
Por temor à verdade que ousam defrontar?
Se pelo menos no espírito de cada um
Que respira o mesmo ar que eu
Que pisa as mesmas pedras que eu
Que se alimenta da mesma forma que eu
Houvesse um delével aroma de indiscrição
Talvez decifrássemos nos momentos mudos
A paz tão precisa para encontrarmos a verdade…

Se pelo menos um pedaço de sonho amanhecesse
Nas pálpebras fechadas por pestanas de sofrimento…
Se transcendesse os limites incomensuráveis da vida
Que nos desgasta de tanta inércia e comodismo
Nos fere de tanto desinteresse e indiferença
Nos gela porque ninguém planta uma flor!

Vagabundos errantes de um destino fugaz
Abrimos a porta da futilidade e da frivolidade
Escondemos devaneios e desejos secretos
Na roda dentada que nos esmaga o crânio
De tanto perguntarmos às aves que são livres:
- Porque não sou feliz?

Porque ser feliz não é morrer de tédio!
Porque ser feliz não é morrer de frio!
Porque ser feliz não é morrer no vazio!

Preencham a vida de lutas e vontades!
Porque escolhem não percorrer caminho nenhum?
Acordem desse desértico sono de imensidão e nada!
Plantem flores!

No fundo
Geminam uma imensa piedade pelo que são…
Lambem os beiços com a avidez de um cadáver
Que desespera pela cova ainda fechada.
Morrem aos poucos numa agonia lenta…
E sós!

Aos poetas suportam a inoportunidade!
Não por serem portadores de uma qualquer verdade
Escondida na manga de um verso inventado
Mas por pintarem no quadro da sala o motim da razão
Com as frustrantes cores feitas de dores reais!
Suportam-nos como quem suporta os picos dos cactos nos pés
Só porque é homem e não deve nem pode implorar!
Suportam-nos porque ousamos navegar num mar tempestuoso
Sem resquícios de vaidade, nem ignomínias soberbas!
Suportam-nos porque enfrentamos…

Perante o luto da alma sou poeta!
Sou o vagabundo errante que procura uma folha de cartão
Para dormir ao relento numa noite de vento e chuva!
Sou o alegre Pierrot que ri, dança, canta
Sobre um pelourinho inquisitório e imundo!
Sou a loucura de Nero numa orgia romana
Lanço fogo às ruas intolerantes de Roma!

Sou o futuro!
Vejam este deus menor
Como se passeia sobre a petulância das folhas do poder
Com a graça de um passo de ballet
Diante dos vossos olhos incompreendidos…

Eu marco a tolerância do absurdo!
Suportam-me porque lhe furo os tímpanos de gritos
Faço rodilhas das frustrações
Esgrimo com uma espada forjada nas pequenas misérias
Um ambicioso colectivo de subtracções!

Eu sou o braço estendido do vosso desespero!
Felizes… Como sois felizes…
Nem quando por sorte do destino a morte os vai buscar
Com uma foice de eternidade e lamentos e
Vos encaixota com um sorriso seco nos lábios roxos…!
Levam convosco um passado de lama
Onde nada existe que valha a pena reflectir!
Pois que morram tão felizes como viveram!
Se ainda algum indício de fantasia
Nublar de sonhos napoleónicos e idealistas a vossa mente
Ponde uma corda à volta do pescoço da vossa família
E ide descalços junto da senhorial morte, como Egas Moniz,
Reclamar os preceitos da cega obediência ao Hades!
Pois morram nessa fantasia!
Cocem a sarna do tédio!
Ruminem a erva do desapego!
Mas por favor, morram felizes!

Deixem as fontes! As águas já secaram…
Abandonem os jardins! As ervas já murcharam…
Esqueçam os mares! As ondas já acalmaram…
Não precisais de barcos porque no deserto não se navega!
Apenas os abutres nidificam na areia tórrida!
Oásis? Oásis são os vossos sonhos perdidos num caos
Quando os abismos rasgam a carne e dilaceram a mente
De tanta dor – se ainda houver espaço para a dor –
Relembrada em goles de aguardente e alucinação!

Pois que consumam a vida como quem ingere o veneno
Que alimenta os glóbulos imbecis da vossa ausência de querer!
Pois que consumam a vida como quem respira carbono
E aceita a luz do dia como um ácido corrosivo!
Sois o que sois! Nem bons nem maus!
Apenas, e só, pedaços de nada a boiar no infinito…
Nada!

antóniocasado

 
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antóniocasado
 
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Enviado por Tópico
sir Arthur
Publicado: 15/04/2010 23:00  Atualizado: 15/04/2010 23:00
Participativo
Usuário desde: 16/01/2008
Localidade: São Paulo
Mensagens: 33
 Re: ALUCINAÇÃO
"De que me serve ter uma resposta
Quando todas as questões são mortíferas
Quando ninguém quer saber
Por temor à verdade que ousam defrontar?

De tanto perguntarmos às aves que são livres:
- Porque não sou feliz?

Porque ser feliz não é morrer de tédio!
Porque ser feliz não é morrer de frio!
Porque ser feliz não é morrer no vazio!"

Deixem as fontes! As águas já secaram…
Abandonem os jardins! As ervas já murcharam…
Esqueçam os mares! As ondas já acalmaram…
Não precisais de barcos porque no deserto não se navega!"

Esses foram apenas alguns dos muitos trechos que eu simplismente adorei do seu poema. Parabéns! Devo confesar tbm, que eu me identifiquei com escrita livre que vc tem. Algumas vezes as palavras simplismente tomam vida e vão para o papel, e parece que foi isso que aconteceu neste poema. Meus parabéns! e quando possível, dê uma olhada nos meus poemas. hahaha
abraço!





Enviado por Tópico
antóniocasado
Publicado: 02/05/2010 16:49  Atualizado: 02/05/2010 16:49
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Mensagens: 1656
 Re: ALUCINAÇÃO
Ola

Se te disser que amo, digo-te pouco. Mas o pouco tem o valor de tudo quanto o amor representa.
Amo-te demais
Marco

antóniocasado