MORRO do BUMBA
A Tragédia da Irresponsabilidade Social
Jorge Linhaça
Uma explosão na madrugada...a terra desliza por 600 metros engolindo dezenas de casas à sua passagem. Algumas pessoas correm à frente dos desmoronamento e conseguem escapar.Moradores correm para o local e começam a cavar em busca de sobreviventes antes da chegada dos bombeiros.
Não amigos, não é nenhuma cena de um filme catástrofe de Hollywood, é a realidade dos moradores do Morro do Bumba, na Cidade de Niteroi.
A tragédia poderia ser evitada muitos anos atrás se o poder público não fosse negligente em suas atribuições.
Ocorre que o morro do bumba, segundo "descobriu-se agora" nada mais é do que um antigo aterro sanitário desativado. Com o passar dos anos as pessoas foram ali construindo suas casas sem a menor preocupação por parte dos órgãos públicos.
Não é segredo para ninguém que o lixo soterrado gera gás metano, formando bolsões que em alguns casos servem de fogareiros improvisados para habitantes de áreas desse tipo. A instalação é fácil...basta enfiar um cano a determinada profundidade e criar uma faísca na saída do gás.
Ora, devido às fortes chuvas e deslizamentos, não é necessário nenhum exercício mirabolante de imaginação para crer que o choque de duas rochas ou pedras possa ter produzido tal fagulha sobre um desses bolsões e gerado a explosão que foi ouvida pelos moradores e que gerou o, até agora, último ato de uma tragédia que poderia não acontecer.
Se, por um lado fica a sensação de que os moradores jamais deveriam ter ali edificado suas casas nesse local, por outro não há como atribuir-lhes uma culpa maior do que a da necessidade material e da ignorância dos riscos.
Já da parte das autoridades municipais fica a eterna questão da irresponsabilidade com os habitantes de sua região.Claro que os governantes sabiam sobre o aterro sanitário, claro que era obrigação dos fiscais impedirem que as pessoas ali se instalassem, mas como sempre, não o fizeram.
Podem alegar que não há fiscais suficientes para isso ou outras falácias que costumeiramente ouvimos.
Não duvido nem mesmo que a área tenha sido loteada por algum espertalhão ávido por ganhar uns trocos ou que tudo tenha corrido sob o olhar complacente de algum vereador, de olho nos votos daquela comunidade.
A irresponsabilidade social tanto de governantes como da própria população é que permite que hajam tantos morros do bumba por este Brasil afora.
Ver o Governador do Rio anunciar agora a construção de 4000 moradias leva à inevitável pergunta:
- Por que não foram construídas antes ?
- Se vão se construídas agora é porque já haviam os recursos, por que então não foram usados de maneira adequada?
Tais medidas populistas que parecem esmolas para calar a boca de quem imaginar fazer cobranças , assemelham-se muito ao dito popular que fala que " depois da casa arrombada é que se coloca a tranca"
Sei que não adianta apenas responsabilizar os governantes pois eles são escolhidos pela maioria dos eleitores que, na maioria das vezes não votam com responsabilidade alguma, contentando-se em apenas livrar-se da obrigação de comparecer às urnas a cada dois anos.
Irresponsáveis são também todos aqueles que vêem as coisas acontecer e omitem-se de emitir uma opinião ou fazer as denuncias aos órgãos competentes.
Irresponsáveis sociais são também as redes de jornais e televisão,com seus rabos presos aos poderosos, que se limitam a noticiar as tragédias como um circo de horrores em busca de alavancar a audiência, sem jamais fazer os questionamentos necessários.
Porque a Globo, que noticia por horas a tragédia, em nenhum momento faz questionamentos sobre o porquê da omissão do governo que é, no fundo, a causa desta e de outras tragédias?
Que tipo de "jornalismo premiado" é este, que oculta as informações mais importantes, limitando-se a relatar os acontecimentos sem buscar suas causas?
Na Globo, especificamente, ao fim de cada reportagem , procura-se incutir na mente da população que a culpa é de São Pedro, que mandou a chuva fora de hora. Oras bolas, até onde eu saiba , São Pedro não é prefeito das cidades atingidas, não me consta que o mesmo tenha criado o aterro sanitário e nem que depois tenha ali construído ou permitido a construção de casas.
Omitir tais questionamentos não é mais do que pura irresponsabilidade para com a sociedade, cumplicidade com o descaso para com as vidas humanas.
Quem sabe se a "poderosa" Rede Globo ocupasse-se menos dos big brothers da vida e utiliza-se seus horários para levantar os problemas sociais, cobrando das autoridades soluções para essas questões, ao invés de fingir que noticia fatos, fazendo o jogo dos poderosos, o quadro pudesse ser outro.
Talvez eu não estivesse aqui hoje escrevendo sobre esta tragédia, poderia quem sabe estar deliciosamente me ocupando de escrever um soneto de amor.
Não imagine o amigo leitor que me delicio em escrever sobre a estupidez da sociedade como um todo, sobre a omissão permissiva que assola todas as camadas sociais. Não amigo, isso não me dá nenhum prazer e, na verdade só me traz prejuízos em termos de número de leitores de meus escritos.
Por que então insisto em escrever?
Porque, por mais ínfima que possa ser a repercussão de meus escritos, sempre existe a possibilidade de alguém me ler e estabelecer sua própria visão sobre o assunto. Porque sempre existe a possibilidade de minhas crônicas chegarem aos olhos ou ouvidos de quem esteja disposto a fazer a sua parte e multiplicar o meu grito de indignação.
Quem me dera este grito se tornasse um dia tão alto que desentupisse os ouvidos daqueles que mantém o poder decisório em suas mãos, despertando-os para a necessidade de ajudar na construção de uma sociedade onde fossem respeitadas ao menos as necessidades básicas de cada ser humano.
Jorge Linhaça