Tabaco e Corridas: Parte 3
Seguindo falando sobre os benefícios da caminhada ou da corrida no tratamento do tabagismo, eles devem ser iniciados por quem ainda não praticava esses exercícios pelo menos duas semanas antes de entrarem em abstinência.
Podem ser associados aos exercícios respiratórios, com técnicas de inspiração profunda e expiração lenta, em ciclos de 3-5 vezes seguidas, o que é muito bom para enfrentar a fissura e já começar a reduzir o número de cigarros até a data marcada e tão sonhada para deixar de fumar.
Na véspera da cessação, uma boa caminhada ou corrida deve fazer parte do cardápio do dia da despedida do cigarro, o que irá aumentar a confiança e a necessária auto-estima para acordar no dia seguinte e transformar este dia, em um marco inicial para vencer um dos mais difíceis desafios da vida.
E, a partir daí, seguir vivendo e cada vez mais intensamente, um dia de cada vez, aliviando o fardo pesado do cigarro paulatinamente e readquirindo o domínio de sua vida, a pele a exalar um cheiro natural, os sentidos mais aguçados percebendo o perfume da vida, o gosto das coisas, o som dos pássaros, o beijo mais gostoso, o sexo com mais disposição.
Os exercícios físicos após enfrentar a turbulência do período da abstinência devem prosseguir aumentando em intensidade e regularidade, ou pelo menos manter o ganho já conquistado, com disciplina e determinação – chaves para qualquer processo de mudança.
E quanto melhor a pessoa se sente mais disposta estará para a prática de corridas ou caminhadas. O desafio para as pessoas é entrar nesse
circuito vital, rompendo a inércia e o eterno desculpar-se por falta de tempo e incluir em sua vida uma rotina mais saudável que aumentará a sua energia e renovará suas forças para enfrentar outros desafios que estão por vir ou que ainda não haviam sido enfrentados pela baixa auto-estima.
Até mesmo o ganho adicional de peso verificado com todos os fumantes após deixar de fumar, será de menor monta e atingirá a relação ideal (índice de massa corpórea – IMC) em menor tempo, possivelmente antes de um ano, se o indivíduo caminha ou corre. Porque ele estará queimando o excesso de calorias que antes dependia da dieta com nicotina.
Pense nisso, o sistema de recompensa cerebral adotará o estímulo para liberação das endorfinas e outras catecolaminas através da prática saudável dos exercícios ao invés da queima de guloseimas, ou anteriormente da inalação de nicotina.
Uma atividade física regular pode ter efeitos também sobre o humor das pessoas.
Outro temor de quem pára de fumar é ficar deprimido, uma vez que a nicotina é uma droga psicoestimulante e euforizante.
Uma vez mais os exercícios vem comprovando em inúmeros estudos que as pessoas que se dedicam à prática de atividades físicas são menos predispostas a desencadear um episódio depressivo.
Ainda que ocorra uma depressão, além da prescrição médica de antidepressivos, estão indicados os exercícios para que a pessoa possa restabelecer o seu nível de humor aos poucos e após a cessação da medicação mantenha este estímulo através dos exercícios e na construção de habilidades para enfrentar os problemas da vida.
Os exercícios animam e fazem a pessoa se sentir mais feliz.
E, quanto melhor você se sente mais disposto a praticar exercícios estará. O desafio é iniciar, reaprender a caminhar, a correr e a desfrutar da vida com intensidade, doação e dedicação.
Viver é muito mais do que existir, uma pedra existe e está inanimada, uma pessoa vive e se sente viva se rompe com a pulsão de morte – quando se entrega para hábitos e comportamentos nocivos como o cigarro – e assume a sua pulsão de vida – adquirindo, exercitando, consolidando atitudes saudáveis e o modo de se ver no mundo.
Vivendo a aprendendo a jogar, nem sempre ganhando nem sempre perdendo mais aprendendo a jogar, esta bela passagem da música do inesquecível Gonzaguinha, imortalizada na voz de Ellis Regina, tem muito a nos dizer, neste tema no qual estamos debatendo.
Poderíamos também interpretar desta maneira:
Vivendo a aprendendo a caminhar, nem sempre ganhando nem sempre perdendo mais aprendendo a caminhar e, pelas nossas próprias pernas, coração e mente.
Certamente, no caso dos fumantes, redescobrirem a vida com os prazeres que se descortinam após a partida do cigarro, é um desafio que podem, precisam e devem fazer.
Cada vida é singular e tem um valor inestimável, muitas vezes não percebido ou avaliado pelo próprio fumante, mas decerto apreciado e quantificado por todos aqueles que o cercam e estimam.
Se eu pudesse encerrar esta estória com uma frase que pudesse modificar o curso da história da dependência ao cigarro diria para cada vítima do tabaco:
Trague o ar que lhe é generosamente oferecido
Deixe o cigarro sair de sua vida,
liberte suas mãos do seu jugo
Se permita o encontro, aconchego e abraço
Mantenha os dedos ocupados em gestos de carinho
Que a felicidade irá bater em sua porta, em sua mente.
Caminhe livre, leve, solto
Com o compromisso libertário dos andarilhos
Ao ritmo das batidas de um humano coração
Corra sim, em busca do prazer, harmonia e alegria
Que você decididamente não encontra no cigarro,
Era tudo mentira aquela rica e pomposa propaganda
Agora que você sabe e está cada vez mais consciente da verdade
Venha para o mundo do Bem Estar (não aquele do Marlboro)
Que está ao seu alcance,
Basta somente que tente
Comente, corra, diga para você mesmo,
Que o valor de sua vida é que não tem preço.
Inicie a sua caminhada, a estrada está a sua espera, se for preciso aumente as passadas até que corra cada vez mais do cigarro e ele somente represente as cinzas de um passado que não lhe basta mais.
AjAraújo, o poeta e médico humanista, texto escrito sobre a importância das corridas para ajudar o fumante a deixar o cigarro, em agosto de 2007.