Sonetos : 

ESPIRAL DE SONETOS SOBRE 2 SONETOS BÁSICOS QUEM ME DERA

 

Pudesse ter nos olhos a alegria
De quem se preparou para saber
Da vida desenhada com prazer
E a sorte cruelmente tudo adia.

A porta que se abrira está fechada,
Caminho pelo qual já não consigo
Saber sequer se existe algum abrigo
Vivenciando o eterno e frio nada.

Amenas ilusões, cruas mentiras,
Acordo sem ninguém, torpe rotina,
Um sonho tão somente me alucina
Aonde mansamente em mim te atiras.

Quem dera ser feliz, ah quem me dera,
Já não veria morta, a primavera...


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Já não veria morta, a primavera
Depois de tanto inverno vida afora,
E quando a solidão feroz se aflora
A sorte num instante destempera.

E o gozo de quem tanto quis um dia
Beleza deste amor incomparável,
Num solo mais tranqüilo quanto arável,
Felicidade imensa se irradia

Trazendo vez em quando esta lembrança
Do tempo em que feliz seguira em ti
Agora que esta estrada já perdi
Sequer neste horizonte o olhar avança

Mentindo e sonegando este prazer
De quem se preparou para saber.


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De quem se preparou para saber
O quanto a vida dói e nos maltrata
Sabendo ser a sorte muito ingrata
Ansiedade imensa posso ver

No olhar de quem desejo há tantos anos
Mergulho sem defesas, plenamente.
E quando novo dia se pressente
Momentos que queria soberanos

Traduzem a saudade que me invade
E nela a dor imensa se permite,
Ultrapassando assim qualquer limite
Gerando no final a tempestade.

Pudesse ter verão, querido, agora
Depois de tanto inverno vida afora.

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Depois de tanto inverno vida afora
Percebo no final que a primavera
Ainda que se faz em longa espera
E mesmo tantas vezes já demora

Um dia chegará, eis o que penso,
E o corpo se exaurindo no caminho,
Andando em pedregulho, farpa e espinho
Gerando este terror cruel e intenso.

Recordo cada passo desta estrada
E nela este desenho se apresenta
A sorte muitas vezes violenta
Traduzindo no fim o mesmo nada.

Quem dera se entranhasse o bom viver
Da vida desenhada com prazer


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Da vida desenhada com prazer
Apenas recordando cada passo,
E dela quando aos poucos me desfaço
Não tendo outro caminho, posso ver

A sombra de um passado mais feliz,
E agora o tempo traz a negação
Bebendo deste mar, ingratidão,
Salgando o meu caminho contradiz

Beleza que pensara interminável,
Um dia após a noite em temporal,
Sabendo este sorriso triunfal
Num mar completamente navegável,

Porém a dor percebo desde agora
E quando a solidão feroz se aflora.


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E quando a solidão feroz se aflora
Não deixa sobrar pedra sobre pedra
O amor quando demais a gente medra
E tudo num momento vai embora.

Adentro os mais fantásticos caminhos
E neles adianto cada passo,
Felicidade em sonhos, sei que traço,
Criando com prazer diversos ninhos.

Mas tudo não passando de ilusão
A queda se anuncia e num tropeço,
Do quanto desenhara em paz esqueço
O vento muda então de direção

Morrendo dentro em mim a fantasia
E a sorte cruelmente tudo adia.

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E a sorte cruelmente tudo adia
Terrível amargura em mim se avança
Matando o que restara da esperança
Gerando tão somente esta agonia.

E o beijo deste amado já não sinto,
Tampouco o seu carinho, tão ausente
O fim do sonho agora se pressente
Amor que tanto quis se vendo extinto

As chaves da emoção segredos tantos,
Delírios entre noites, gozos fartos,
Vagando vez em quando noutros quartos,
Colecionando apenas desencantos.

Quem tanto desejara primava,
A sorte num instante destempera.


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A sorte num instante destempera
E nada restará do nosso sonho,
Diverso deste encanto que proponho
Já nem sequer um brilho nos tempera.

Morrendo pouco a pouco, esta ilusão
Deixando como herança o sofrimento,
Por vezes com ternura ainda tento
Vencer as tempestades de verão

E o gesto sendo inútil não repito,
Cansada de lutar contra a maré,
Ainda que restasse alguma fé,
Já não suporto mais tanto conflito

E assim ao me perder na madrugada
A porta que se abrira está fechada.


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A porta que se abrira está fechada
E nada representa a realidade,
O medo do futuro quando invade
Trazendo a minha noite tão nublada

Expressa a solidão da qual eu bebo
Esta aguardente amarga que me deste
O solo se tornando mais agreste
Diverso do prazer que inda concebo.

Esqueço dos meus dias mais felizes
E sigo esta brumosa noite insana,
A sorte muitas vezes nos engana
Deixando tão somente cicatrizes,

Se eu tenho algum prazer só fantasia
E o gozo de quem tanto quis um dia.

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E o gozo de quem tanto quis um dia
Jamais se mostrará ora presente,
Por mais que novo tempo se apresente
Não posso conceber mais alegria.

O corte aprofundado dentro da alma,
Imensas as escaras que carrego,
O passo cada vez audaz e cego,
Gerando em desamor terrível trauma,

Mesquinhos os caminhos de um amor
Que tanto desejei e nunca tive,
Vontade simplesmente sobrevive
E nela posso mesmo até propor

Um tempo feito em paz, suave abrigo;
Caminho pelo qual já não consigo...

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Caminho pelo qual já não consigo
Saber dos dissabores mais constantes
E neles com certeza me adiantes
Ao fim da tempestade algum abrigo.

Eu sei que tantas vezes pude ter
Nas mãos além da dor, esta esperança
E quando ao mesmo sonho amor me lança
Desvendo nos seus olhos meu prazer.

O custo da alegria é longa espera,
E o beijo se anuncia redentor,
Aonde no passado houvera dor
Agora se percebe a primavera

E nela com certeza inesgotável
Beleza deste amor incomparável.

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Beleza deste amor incomparável
Transcende à própria vida: eternidade
E quando rompo algema já sem grade
O mundo se transforma, fica arável.

Um gesto mais audaz me faz feliz,
Menina muitas vezes sofredora
Que quando no passado em tentadora
Figura que o presente não desdiz

Espalho os meus desejos por aí
Percebo que tu chegas num repente
Trazendo tanta luz aonde ausente
Caminho muitas vezes percebi

E assim junto de ti já não consigo
Saber sequer se existe algum abrigo.


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Saber sequer se existe algum abrigo
Vivenciando a treva e a solidão,
Distante deste sol, belo verão,
A sombra do que fomos eu persigo.

Pensando neste amor que não voltou
Deixando tão somente esta saudade,
Não posso e não conheço a liberdade,
Caminho feito em nuvens se mostrou.

Eu quis amar de novo e não podia,
A ausência de carinho me maltrata,
A vida com certeza é tão ingrata,
Felicidade é mera alegoria

Quem dera outro momento fosse amável
Num solo mais tranqüilo quanto arável.


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Num solo mais tranqüilo quanto arável
Pudesse cultivar minha esperança
A tarde solitária agora avança
E o mundo se tornando inabitável,

Vencida pela dor de uma paixão
Há tanto destroçada, agora vejo
A sombra do que fora meu desejo
Guardada há muitos anos no porão,

Renasce após a paz que tanto engana
E muda a direção do pensamento,
Quem sabe no final terei alento
Depois da caminhada amarga e insana?

Mas quando me percebo abandonada
Vivenciando o eterno e frio nada.

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Vivenciando o eterno e frio nada
Durante a caminhada pela vida,
A sorte há muito tempo sem guarida
Ferida dentro em mim aprofundada

Vencer os desafetos e prosseguir
Não tendo nem sequer a cicatriz
É tudo na verdade o que se quis,
Imagem radiante de um porvir.

No sonho que domina a noite intensa
Qual fora a claridade de uma lua
Deitada sob os raios, toda nua
Minha alma neste amado tanto pensa

E assim na minha bela fantasia
Felicidade imensa se irradia


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Felicidade imensa se irradia
No olhar de quem se deu e não pensava
Que a vida transformando fogo em lava
Destrói todo o caminho em ardentia.

Furiosa tempestade, inundação,
O mundo desabando, terremoto,
O sonho se tornando então remoto,
Apenas neve e frio se darão

Enquanto a poesia me abandona
A moça do passado, morta está,
E sei que tudo aquilo desde já
Retorna com terror, invade a tona

No coração exposto em finas tiras
Amenas ilusões, cruas mentiras.

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Amenas ilusões, cruas mentiras
É tudo o que me resta. O que fazer?
Ausente dos meus olhos o prazer
O pouco que me sobra tu retiras,

E quando se mostrasse mais amigo,
Eu pude acreditar; doce ilusão.
O tempo transformando em negação
Aquilo que pensara ser abrigo,

Vestígios de um momento mais feliz
Ainda os trago vivos na memória,
Final desta aventura merencória
A dor que herdei de ti tudo já diz.

Mas quando a noite chega e em luz se avança
Trazendo vez em quando esta lembrança.

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Trazendo vez em quando esta lembrança
O mundo poderá tramar um dia
Aonde a realidade e a fantasia
Unidas numa luz feita esperança.

Audaciosamente teimo e busco
Lugar aonde possa crer na imensa
Beleza que em verdade recompensa
O que passara outrora em ar tão brusco.

Vencer os meus temores e tentar
De novo após a chuva em tempestade
Rompendo cada algema, cada grade
E em liberdade enfim, poder voar.

Mas quando o dia a dia descortina
Acordo sem ninguém, torpe rotina.

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Acordo sem ninguém, torpe rotina;
Depois de não saber sequer se há rumo.
Deveras solitária me acostumo,
E mesmo uma lembrança inda fascina.

Marcada em tão profunda tatuagem
Jamais me libertando do passado,
Caminho que conheço, decorado,
Repito novamente esta viagem

E volto a ter nos olhos o horizonte
Maravilhosamente enternecido
O amor que tanto quis não esquecido
No sonho, pelo menos já desponte

Revive cada brilho que bebi
Do tempo em que feliz seguira em ti.


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Do tempo em que feliz seguira em ti
Ainda trago vivo na memória
Algum momento ao menos de vitória
Depois de tudo aquilo que perdi.

Vencer os meus temores; prosseguir
Errático cometa; eu não consigo
Sentir e decifrar qualquer perigo
Inúteis caminhares do porvir.

Mas tudo revoltando dentro em mim,
A moça envelhecida pela dor
Não sabe seu destino recompor,
A flor já morta e fria no jardim.

Tentando descobrir a fonte e a mina
Um sonho tão somente me alucina.

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Um sonho tão somente me alucina
E nele tua imagem se preserva,
Minha alma de tua alma mera serva
É como se uma chuva mansa e fina

Caísse sobre o rumo que previra
Nublados os caminhos sem saída
Assim ao perceber em despedida
O amor que tanto quis e a vida tira

Nos olhos inda trago um mero brilho
Vestígio do fulgor de antigamente
Realidade dura me desmente
E a senda entre espinheiros, ora trilho

Que faço, meu amado, pois, sem ti
Agora que esta estrada já perdi.



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Agora que esta estrada já perdi
Não posso mais seguir contra a maré
Perdendo pouco a pouco minha fé,
Jamais encontrarei o que há em ti

A força incandescente de um carinho
Delírio feito frágua que incendeia
No doce emaranhado, tua teia
Na qual, tão suavemente ora me aninho

Sonhar nunca faz mal e me alimenta,
E nestas noites duras, solitárias,
As ânsias se mostrando sempre várias
Apaziguando assim cruel tormenta

E neles reacendo velhas piras
Aonde mansamente em mim te atiras.

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Aonde mansamente em mim te atiras
Num átimo mergulho sem pensar.
Pudesse ao adentrar em raro mar
Viver longe de todas as mentiras.

Pudesse pelo menos, quem me dera,
Vencer os meus anseios e temores,
Colhendo finalmente em ti as flores
Plausíveis numa imensa primavera.

Pudesse ser feliz, eu tentaria
Vagar contra as tempestas mais ferozes,
Dos sonhos escutando brados, vozes,
Percebo ser somente fantasia

E quando a realidade em mim se lança
Sequer neste horizonte o olhar avança.

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Sequer neste horizonte o olhar avança
E deixo para trás a caminhada
Sabendo tão distante esta alvorada,
Minha alma sobrevive da lembrança.

Eu quis beber da fonte maviosa
E dela ter eterna juventude,
Mas quando percebê-la vaga eu pude
A vida se mostrou em fria glosa.

E os rastros do cometa dito amor
Jamais eu consegui reconhecer,
Aonde se escondera o meu prazer,
A luz já não se põe ao meu dispor

E quando viva em mim terrível fera
Quem dera ser feliz, ah quem me dera.


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Quem dera ser feliz, ah quem me dera
E ver após a chuva um belo sol,
E como fosse assim um girassol
Bebendo da alegria em primavera.

Assíduas emoções tomando o peito
Daquela que se deu sem perguntar
E tendo nos meus olhos este amar
Caminho muitas vezes satisfeito.

Mas vejo quão falsário este momento,
E nele não percebo mais a luz,
O olhar que do passado reproduz
O brilho se perdendo, desalento

E quem tanto eu queria, a se perder
Mentindo e sonegando este prazer.


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Mentindo e sonegando este prazer
A vida destroçando a fantasia,
E quando novas luzes eu veria
O tempo novamente, escurecer.

Percorro os meus anseios e vontades
Desvendo cada queda e seu por que,
O mundo que sonhara não se vê
Tampouco reconheço claridades.

Os olhos embaçados pelo medo,
Vestindo este terror já costumeiro,
E quando em novas rotas eu me esgueiro
Uma esperança tola me concedo.

Assim domando a dor, terrível fera
Já não veria morta, a primavera...

26

Já não veria morta, a primavera
Tampouco poderia reclamar
A ausência da beleza de um luar
Que a cada nova noite destempera.

O verso repetindo a minha sina,
E nelas os meus enganos em contraste
Com toda esta ternura que encontraste
Carência toma a conta e me domina

Meus olhos entrelaçam a esperança
E ainda buscam luzes no horizonte,
Por mais que a realidade desaponte,
Futuro sob olhar chegando, avança

Quem sabe a recompensa possa ter
De quem se preparou para saber.


De Praia para o mundo lusófono

VALMAR LOUMANN
 
Autor
VALMARLOUMANN
 
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