Textos : 

sem número.

 


. façam de conta que eu não estive cá .





dentro da pele, quase a chegar-te ao osso, iam-se extinguindo os gestos - era a consumação dos afectos - toque de uma mão no rosto. nunca aprendeste a chover, eras neve sempre que o tentavas. apercebi-me que às vezes enganavas os gestos, aguardavas o cair das folhas, ou era quando a terra dormia debaixo dos teus pés que te libertavas do corpo e corrias ao meu encontro. nunca percebeste nada destas engenhocas - tempo e espaço - apertadas ao pulso ou à vista. prendiam o que cultivavas, amor. quando te conheci o teu rosto era uma pintura abstracta, podia ver nele a complexidade esquemática de um carreiro de formigas, ou a simplicidade de três tulipas a crescer fora de estação. havia no teu rosto um bosque denso, assim que abrias os olhos era o meu corpo fustigado por ramos de árvores que não existem, não aqui - neste realidade onde coabitamos. bichos feridos. na tua boca andavam a boiar nenúfares e era belo vê-los afogar palavras. quando sorrias podia ver-te os peixes na raiz da língua. era no teu rosto que todas as coisas, possíveis e imagináveis, encontravam morada, e, naquele dia, até eu julguei ter encontrado finalmente a minha casa.


 
Autor
Margarete
Autor
 
Texto
Data
Leituras
775
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
4 pontos
4
0
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 04/03/2010 21:38  Atualizado: 04/03/2010 21:38
 Re: sem número.
gostei tem um toque lancinante
esse fio da navalha
cortando os pulsos em silêncio
um imaginário espectante...
sobre o que estará por vir
abraço
Mar

Enviado por Tópico
Moreno
Publicado: 04/03/2010 22:12  Atualizado: 04/03/2010 22:12
Colaborador
Usuário desde: 09/01/2009
Localidade:
Mensagens: 3482
 Re: sem número. à mar
as imagens das tuas palavras entranham-se na pele, penetram até ao osso, alojando-se no ser como casa.

beijo

Enviado por Tópico
Alexis
Publicado: 05/03/2010 00:07  Atualizado: 05/03/2010 00:09
Colaborador
Usuário desde: 29/10/2008
Localidade: guimarães
Mensagens: 7238
 Re: sem número. para mar
a tua escrita nada tem de medíocre ou obsceno.mesmo quando falas de putas.ou de sangue,ou de merda,ou de bichos,ou de morte ou de outras coisas.nem a tua ,nem a de muitos outros escritores que por cá andam.
apeteceu-me vir dizer isto aqui.porque sim.noutras páginas o poderia também fazer.mas não em todas.textos há onde a palavra mais "pura",mais "inocente" se enche,para mim, de obscenidade e de mediocridade.cheguei já a sentir-me corar de vergonha quando li a palavra "virgem" ou "esmeralda" ou "flor" em certos contextos.nada fiz,senão corar,de vergonha.às vezes emiti uma opinião.mas normalmente quem me faz corar de vergonha,não sabe ler opiniões nem as aceita bem.
tudo depende em suma,do uso que se dá às palavras e de como se as lê.e tu,cara mar.usa-las com elevação,sejam elas quais forem.
por hoje era só isto que te queria dizer.

um beijo.

alex

Enviado por Tópico
Caopoeta
Publicado: 05/03/2010 06:13  Atualizado: 05/03/2010 06:13
Colaborador
Usuário desde: 12/07/2007
Localidade:
Mensagens: 1988
 Re: sem número.
Não te quero ler hoje,
Mesmo assim desejo-te como fosso, onde
os meus dedos sodomizados
Pela palavra que, de dor que é tua, e eu
Tomo-a como nossa
No cárcere de de quem atravessa a os corredores frios
, Lamenta-se esta tentativa de recordar o que fomos
. Porque me perturba o que de ti leio porque guardo o que de ti vivo.
És melhor do que escreves
és melhor do que revelas na escrita carne ou no sangue da escrita coração.
Eu, acompanho este retrato, à cabeceira da cama, letra a letra esta” fome de silêncios”,
Chegarei sempre tarde, tal como sou, tardio, como todos os homens de resto, a minha fome é bordada na insónia dos nervos, minha insónia torna-se febre se coragem não tive, como findar o dia, como salvar a vida, Marguerete.