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Das anarquitecturas do cristo-polvo

 
Disse várias borbulhas. Eram fluidas no aquático submerso onde a consciência se ondulava. As refracções eram salinas dentro dos reticulares e emancipavam-se pela bolha. Oxigenava-me em guelras porque as apalpei azuladamente, e com as barbatanas que me impeliam ao oceânico pousei o tridente e o fiz. Então nadei rumo aos focos de luz que dimanavam do céu imerso entre estrelas marítimas enquanto fazia o silêncio porque as oceânides ainda dormiam, logo após suspeita da boa vontade de minhocas que pendiam sem se sujeitarem à gravidade, eram estaticamente sorridentes, assim ficaram após ter torcido a sobrancelha sem sair gota.

Metade de mim nadava com escamas. A outra dava aos braços no reboliço dessincronizado. Outra ainda esfregava-se com espuma à espera da nascença de afrodite. E porque estava no fundo, indaguei sobre as inacessibilidades dos mistérios náuticos. Foi quando vi a atlântida reluzir ao lado de um disco nadador não identificado, provavelmente afogado na quebra de casco. Decidi inverter a marcha.

Preferi o culto das placas de trânsito que surgiam magnânimas, contornadas a corais luminosos publicitários. Seguidamente cruzei-me com duas tartarugas em mariposa que acenaram a um bacalhau desfiado, devidamente decepado pela salga, não disse nada com a cabeça que não tinha, mas elas pediram-lhe chocolate da noruega regado a azeite do pólo norte. E seguiram caminho. Eu também me continuei.

Vislumbrei uma primeira placa, “menstruário, compra, venda e troca de menstruo”. Bati continência de barbatana em riste. Mas como não tinha nenhum comigo e os trocos estavam a seco segui em jornada dessanguinizada.

À frente a segunda, “seminário, compra, venda e troca de sémen, novo e usado”. Bati continência. Brotava interessante mas não em suficiência. Ainda não tinha descendentes e desconfiei das colheitas feitas em alto mar. Embora o fetiche das marmotas de rabo na boca me tenha feito entrar em duvivologia, pelas artes de ter dúvidas quando elas não existem. Quebrei o pensamento quando surgiu a terceira. Não piscava, e as letras eram magicamente minúsculas, “universidade de anarquitectura marítima”, extasiei-me. Rapidamente segui a seta com faíscas nos olhos e rotações das barbatanas em vibrações tsunamicas. Gorgolejei na ansiedade e quase me afogava.

Passei por cardumes de latas de atum que se dirigiam a uma arca congeladora encalhada, quando surgiu, “Estás quase a chegar à anarquitectura”.

Segui por trilhos áridos onde peregrinavam sardinhas ajoelhadas apoiadas em palitos com azeitonas. Algumas encavalitavam-se aos costados e tornavam-se cavalas, transformavam a súplica em simplicidade. E li, “Estás mesmo quase a chegar à anarquitectura”.

Troquei olhares cúmplices com uma piranha desdentada. Espetava-me os lábios em luxúria enquanto revirava os olhos imbuídos numa maquilhagem borratada. Arranjei uma morada de uma ostra barata e combinei para o daqui a um bocado. Ela aquiesceu e deu-me uma palmada na nádega direita enquanto borbulhava, “Por lá ficarei a desejar-te em mim”. Prossegui à coisa, embora de pensamento dualista, entre embocadura piranhosa e escolástica anarquista. Decidi a segunda antes da primeira, a agenda preenchia-se quando apareceu, “Estás mesmo, mas mesmo quase a chegar à anarquitectura”.

Cruzei-me com duas fanecas de farda azul. Bati continência mas efectuaram multagem. Faltava inspecção às escamas e a navegação em ansiedade era perigosa ao que borbulharam. Mas como lhes disse ter uma espinha de poseidon atravessada na goela elas bateram em retirada depois de me beijarem as barbatanas com reverência iconoclasta. E brotou, “Estás quase, mas mesmo, mesmo quase a chegar à anarquitectura”.

Quando estava quase, mas mesmo quase a pensar em anarquitectar-me da anarquitectura, procedendo à óbvia decisão entre fluxos espermatizados ao seminário a troco de uns trocos ou a magia ejaculatória em embocaduras piranháceas, deu-se finalmente. E era entrada em gruta recôndita. A placagem externa elucidava, “Este sítio não é clandestino.”. E por ser assim entrei.

Algumas folhas impermeáveis nadavam em aleatoriedades. Agarrei numa delas, em mesmo factor de escolha. Procedi à vista de olhos diagonal, como mais adequada em qualquer textualidade prezada, “Leccionam-se disciplinas de implosão de caravelas lusitanas”, “levantamento de tijolos institucionalizados e pedrarias eclesiásticas”, “entupimento de fossas com fezes de baleia”, “amassamento de canos empresariais”, “plantio de algas-daninhas e urtigas”, “fudição de aço e restantes metalurgias”, “estoiramento de madeiras sem dano de dobradiça”, “curto-circuitagem de longo alcance”, “arrombamento de portas com toras judaicas”, “estilhaçamento de vidros e quinquilharias adjacentes”, “demolição e trinchamento de alicerces”, “arrancamento de sanitas com posterior hiperventilação.”.

Era então delicioso o conhecimento que me esperava, embora tudo fosse seguido do aviso, “Apenas teoria!”.

Eram óbvias delícias do mar.

Lambi os lábios a sal com açúcar e penetrei na gruta com ferveduras da gula. Passou em correrias um polvo de bandeira negra em riste declamando estridências, “Acabou a teoria, começa o devir messiânico!”. E flechado desapareceu.

Dirigi-me à lagosta que andava em volta de imitações de minérios. Tinha uma lanterna na cauda e lingerie preta enfiada nas antenas. Perguntei-lhe quem era o personagem, “O messias! É o messias! O grande polvo sebastião!”. Questionei-a à lingerie, mas era óbvio o oculto, ganhava a vida no arrancamento de mamilos em empresa de erogenias pormenorizadas. Orgulhosamente me tentou mostrar a metodologia das trinchas quando decidi seguir viagem. Já uma legião de seres marítimos seguia o sebastianino. Juntei-me à comitiva.

Decidi trocar bolhas com uma enguia eléctrica. Deglutia caixas de xanax em sofreguidões, e adverti-lhe de posologias. Que sem caixa era mais fácil. Que os excipientes cartolínicos e metálicos rebentavam a tripa. Estarreceu-se antes de ter um fanico fulminante. Subrepticiamente deslizei a outra área.

Abordei um carapau que se injectava com sumo de tanjerina, “Mas porque é o polvo sebastião um messias?”, e após acabar a toxicologia cítrica gorgolejou, “Bem… Porque é um polvo… Porque se chama sebastião… E porque é messiânico.”, insisti ao mesmo, “Bem… Porque é o reitor da anarquitectura… E porque nasceu com seis tentáculos.”.

O estranho menos pareceu quando o celeste aquoso apinhado de estrelas marítimas começou a tocar-me nos cabelos. Pensei na verdade cosmogónica. O universo pode-nos cair na cabeça quando não temos telhas. Dei por ela e já estava numa praia.

Rodeava-me dos seres aquáticos, de polvo sebastianino em frontispício, “Para o meu martírio! Para o meu martírio anarquitectos!”, incendiava sem bolhas, mas com tentáculos gesticulados no frenético, era como se tivesse tinta à flor da mucosa. Mas a bandeira estava desbotada.

Adverti o carapau de que não tinha tido qualquer aula. Nem conhecimentos para o porvir. Acalmou-me porque não era problema, existiam assuntos menores a tratar. Senti-me em múltiplos estímulos libidinais por ajudar à causa. E porque tinha a piranha em lista de espera questionei sobre o tempo, “Bem… Coisa rápida… Afinal, é messiânico.”. Senti-me em alívio, até porque teria outro agendamento aliviado. Dei por ela já estava numa floresta.

Começaram a chover bolotas quanto um exército de esquilinhos surgiu em altos ramos. Vestidos a verde camuflatório e capacete anti-espinhas. Bati continência, mas enquanto gritavam “Bolotem-nos até à morte” já tinha levado com várias. Vi as estrelas do céu que já não estavam nubladas, nem azuis.

Os anarquitectos tomaram posições defensivas. Condescenderam com negociações que chegaram ao negócio, e o veredicto? Já eu fervilhava com a desdentição. Ora iam poupar todos excepto o responsável pela coisa. Lá se ia o sebastião.

Subimos um monte, quase calvo, de bolotas apontadas à cabeça. No cimo um enorme asterisco em madeira. Seis pregos enferrujados. E claro está, o martelo de thor. Seis esquilos colocaram o sebastião em molde para o suplício. E eram gritos de lamúrias anarquitectas quando o polvo foi crucificado sem dós, mas com marretadas. Marretada e grito. Marretada e grito. Até ao infinito do seis. Já o erguiam para gáudio geral, e a multidão exclamava em tremores de mar, mas em terra, “É a era do cristo-polvo! O início do legado! O devir do asterisco!”.

Deram-me colares com asteriscos. Túnicas com asteriscos. Livros com asteriscos nas capas. E por dentro todo o texto era feito de asteriscos. Fora os restos.

E sem nada mais a fazer no invento do apoteótico, do miraculoso, sem vontade da espera de três dias para renascimento do cristo-polvo, me fui. Novamente ao marítimo. Para a ostra barata. Para as tesuras que brotavam em divino. Porque a piranha desdentada me torcia o desejo.

Já em futorologia próxima soube chamar-se maria e ter problemáticas graves de rompimento de hímen, e tudo porque a vida, no fundo dos seus mistérios, era um divino cardume de asteriscos.

© Bruno Miguel Resende
 
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Bruno Miguel Resende
 
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Enviado por Tópico
HorrorisCausa
Publicado: 12/02/2010 18:14  Atualizado: 12/02/2010 18:14
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 Re: Das anarquitecturas do cristo-polvo
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