Líquido denso de cristais perolados
Precipita sobre aquela gélida lápide
Onde dorme cabelos encaracolados
Cor-de-fogo... Adormecida olhos-jade...
Sopra o vento veneno que mortifica...
Sobe a poeira e se vivifica os ciprestes...
Jaz, fria... Longe do mundo terrestre...
Muito próximo do enigma da vida...
Repousa sob a caiada cruz, uma ave...
Pia notas tristes, tétricas e sinistras...
Com abundantes lágrimas e força das mãos
Cavo um turvo túnel pela úmida noite...
Tenho meu próprio desespero como açoite
E como eminente inimigo, meu coração...
Ferido estou pelo dente siso da ansiedade.
Pelos meus dedos? Terra preta e sangue rubro.
Cavo, cavo, cavo... Com ensandecida velocidade...
Até que, por fim... Toquei algo rígido... Duro...
Era teu recanto de última e infeliz morada!
Ah, Jesus!
Como minha alma padecia! Como eu chorava!
Não era possível que ali, desfalecida, ela jazia!
Não! Eu nunca poderia deixar-te partir... Querida!
Não hesito um minuto atômico sequer!
Quebro toda colcha de madeira-verniz...
Vi-te morta! Fim do meu mundo infeliz!
Morta! Morta! A mais linda mulher... Morta!
Morte, sua mão infame a tocaste...
Sua miserável, ela é minha! Só minha!
Pego-a em meus longos braços...
Toco-a na face morta... Fico em afagos...
Ah, como teceu errado a aranha da Vida!
Beijo-a muito... Frios e roxos os lábios...
Bebo com minha língua, meu pranto de sal.
Caio sobre aquele corpo... Sinto o gosto do metal...
Esboço um pulcro sorriso... Sinto-me esvaindo...
Vejo, apenas por um instante, teus olhinhos se abrindo...
Cai, ensangüentado, sob a lápide, o meu punhal.
Gyl Ferrys