- babel -
. façam de conta que eu não estive cá .
[estado comum: sem braços]
depois de perder os braços, perco a cabeça e dou comigo sentado, num canto, à espera, de quê? não sei. se antes de perder os braços assim me encontrasse pensaria talvez no que lhes aconteceria se os perdesse, agora que os perdi não me parece importante pensá-lo. dois buracos no tronco. olho melhor e já lá não estão. penso como seria se ainda lá estivessem e depois de o pensar, logo depois, verifico que afinal ainda lá estão. cabe em mim uma espécie de loucura, dessas que troca os olhos e incha a língua e verte o sangue das veias. estou demente. afirmo-o. na contradicção destes pensamentos perco os anteriores e apercebo-me que afinal nunca os tive, nem aos braços. há uma espécie de inquietação, uma certa angústia, vem deste ser sozinho, coisa pouca, maior quando penso nela. é um limiar, um estar rente, um ser na margem. acreditar que ainda se é sem o ser há muito, e estar como se estivesse no fim do mundo.
[ estado incomum: sem cabeça ]