“ A miséria das classes baixas é sempre maior que o espírito de fraternidade das classes altas. A primeira igualdade, é a justiça. ” (Victor Hugo)
Caminham na noite
São andarilhos,
Maltrapilhos, Mendigos
Catadores, sem teto...
Fazem o contraste
com o alegre soçaite,
Em mesas nas calçadas,
De bares e restaurantes
Alguns vendem balas,
Biscoito, amendoim torrado,
bananada, rosa em botão
e os seguranças em vão...
Tentam afastá-los
para que não incomodem
A freguesia dos com tudo,
disputada pelos sem-nada
Neste rumos noturnos
amargos de jornadas vazias
são crianças, jovens, velhos
amontoam-se nas calçadas
Às vezes conseguem participar
Daquele festivo banquete
Sobras dos suculentos pratos
Se tornam a ceia da noite
Acabam virando quentinha
Doada por algum cliente,
Ou acabam virando-latas
Para buscar os restos da festa...
O que é excesso, desperdício
Para quem tem fome é um alívio
Garantia de sobreviver mais um dia
Rotina que se repete sem direito a azia...
Mundo cão, guardião do materialismo
A luta pela sobrevivência cotidiana,
Estimulada pela sociedade de consumo
Desnuda a face dolorosa da miséria
Que a muitos passantes, são indiferentes
Enquanto outros se sentem ameaçados
Ao pararem seus carros nos semáforos
ou caminharem diante das marquises
Como filmou Fritz Lang em "Metropolis",
Victor Hugo imortalizou em "Les Miserables"
Cândido Portinari pintou em "Retirantes"
Sebastião Salgado documentou em suas fotos
Fazer uma leitura no contexto histórico
Das desigualdades sociais de nosso mundo
É tarefa não só para poetas, intelectuais
Governantes, juízes ou religiosos...
Reduzir as iniquidades sociais
Requer uma inversão de prioridades
De governantes, das sociedades, sob pena
De dramas, como os vividos pelos haitianos
Seguimos deixando a margem,
Milhares de pessoas na miséria,
Desagregando famílias, lares
Na violência da exclusão social...
Sequer tem onde morar com decência
Enquanto espigões são financiados
Eles são expulsos para a periferia,
Pela especulação imobiliária
Assim, seguimos insensíveis,
Vidros fechados, medo nos semáforos
Como se estivéssemos em safaris
E moradores de ruas fossem animais soltos
O que é admirável e espantoso,
É esta extraordinária capacidade
De lutar na adversidade, fato notável
E a seguir na cruel rotina, SOBREVIVER...
AjAraújo, o poeta humanista, escreve sobre as pessoas abandonadas nas ruas da cidade, homenageia a Victor Hugo e sua célebre obra: Les Miserables. Escrito em Setembro de 1992.