Decidi, porque sou uma pessoa de decisões, não defraudar os milhões de leitores do meu diário que insistentemente me enviam centenas de milhar de cartas exigindo a continuidade deste meritório trabalho mais para o estilo “epopeia” que propriamente os resquícios de um escritor estrelado, assim como os ovos.
Vai daí, escrevi o número dois. Vou começar como li uma vez num desses romances de cordel onde depois de muitas agruras ele deixa ela e ela decide escrever qualquer coisa. Aqui vai:
Querido diário, há muito tempo que não te dedicava o meu mísero tempo! Está giro não está? Até podia ser o princípio de uma das muitas centenas de novelas que de uma forma absolutamente cultural e profilática da propedêutica passam amiúde nas televisões e nos forçam a ver. Forçam sim! Na sala de espera daquilo a que costumam chamar serviços de saúde, lá levo eu com as novelas da tv. Se vou ao hospital, lá está a novela na sala de espera. Se me viro para o escritório de um advogado, claro, a novela e etc. Ainda não disse, mas o meu orgasmo mental vai direitinho para a publicidade. Adoro ver publicidade! Além do mais fico sempre com uma lista de compras, para além das múltiplas e triplas ofertas que nem se imagina pudessem fazer. A publicidade é o meu mundo! Eu vivo, respiro, como, etc., publicidade. Ela vai desde a justificação do preço de um produto, ao último modelo de um automóvel que se leva anos a pagar e ao qual a assistência é prestada com má cara e em cima do joelho. Além disso com o automóvel oferecem aquilo que por norma é lei no estrangeiro. Só vantagens!
Mas não era sobre isto que eu queria falar. O que é que um carro tem que ver comigo? Nem faço intenções de o comprar…! Vamos a mim.
Depois de muito pensar no meu futuro, no que queria fazer, nas minhas aptidões, conclui que não sei fazer a ponta dum corno. Então não há profissão melhor que a de Primeiro-ministro! Pronto, já sei o que vão dizer. É sempre a mesma coisa! Que condições terei para ganhar eleições? Sei que estou em desvantagem, mas isso é relativo. Sigam o meu raciocínio e digam lá se não tenho as minhas razões…
Falta-me um curso universitário. Nunca houve dinheiro para chegar tão longe… Mas não tem importância, com as novas modalidades até sai barato. Marco uma entrevista com um reitor, por exemplo no dia 25 de Dezembro. Faço um exame de admissão a 1 de Janeiro. Frequento uma aula de qualquer coisa, o que equivale a ter frequentado todas, porque são todas a mesma coisa e marco um exame por exemplo para 31 de Janeiro de 2010. Apresento uma tese, que pode até ser a cópia de alguma já apresentada (evito assim a maçada de falar sobre o que não sei), quiçá na Pascoa e até ao 25 de Abril o diploma vai parar-me direitinho a casa com recomendações e tudo. A seguir vem a filiação partidária. Inscrevo-me no partido da moda, peço logo para ser gestor de uma coisa qualquer, por exemplo um banco privado, daqueles onde os governantes têm o dinheiro porque nunca poderão falir, mal se vislumbre algum cambalacho o estado nacionaliza-o logo, e depois entrementes faço uma payport lá para os lados da Serra da Arrábida, de preferência no cimo e já está. Com esse dinheiro pago os calotes que o raio do diploma e da gestão me deixaram e logo a seguir posso governar-me neste país. O método e simples, apesar de trabalhoso. Se por acaso algum opositor político lá dos tribunais der com a coisa, alego que estou imune – tipo vacina gripe A, mas disso falaremos noutra altura, – e que os negócios que fiz, não fiz porque as provas não são provas e eu além de tudo sou o detentor da verdade absoluta, ou não tivessem votado em mim. Num desses casos ainda ofereço ao tipo um lugarzinho muito bem pago no governo para fazer não interessa o quê e a algum juiz mais irreverente faço uma proposta: Ofereço um popó último modelo com prostituta no interior. Pronto. A seguir é o que se sabe. É tudo arquivado. Digam lá que não sou um tipo esperto!
Como poderão constatar o meu futuro é promissor. Preparai-vos Mundo, o novo Napoleão vai a caminho!
Há algumas recomendações que necessito fazer, porque já estou a ver o popularucho a enviar-me cartas e a querer uma cunha. Primeiro: O lugar que cada membro do meu governo ocupar nos inúmeros ministérios que irei criar, principalmente o da revisão das leis eleitorais, comunicação social e tribunais, terá que ver com a prestação de serviços ao longo deste árduo e extenuante caminho! Não pensem que sou a Madre Teresa do Hemiciclo! Segundo: Será premiada a competência. Haverá um concurso do “esconde coisas” e “mente a rir”. Os melhores serão os chamados. Como dizem os brasileiros “não vai ser mole, não!”. Terceiro: Têm de acreditar de uma forma fanática em tudo o que eu disser porque como já disse verdades é comigo.
Agora sim, posso estar descansado. Já tenho trabalho. A questão é demitir o outro… Mas isso vai com o tempo. Além disso preciso preparar a minha campanha eleitoral. Já marquei umas visitas a alguns países corruptos com os quais pretendo fazer uma aliança de cooperação, ainda não sei bem de quê, mas para já de métodos de governação e princípios filosóficos a implantar no meu querido povo. Penso que temos muito a aprender com eles, assim como eles aprenderam imenso com o “Toninho”. O quê? Não sabem o que é o “Toninho”? O “Toninho” é o meu computador. Só serve para fazer uns jogos mas é muito bom! Faço uma cópia do cujo e ofereço aos meus novos amigos. Entre um tráfico e outro sempre se vão entretendo com uns joguinhos. Além do mais tem uma onda hertziana que apanha um ou dois canais de rádio. Sabem, a música distrai… Desculpem, estive à procura de saber o nome da onda, mas o raio do meu dicionário tem falta de algumas páginas… Que chatice! Mas entendem, não entendem?
Agora, nas missivas que me enviarem, já podem mencionar:
Vossa Eminentíssima Excelência Senhor Doutor Primeiro-ministro da Republica Portuguesa e Algarbes.
Quaisquer dúvidas perguntem! Pô-los-ei ao corrente das minhas atitudes políticas ao longo dos diários para que assim possam saber que têm um Primeiro à altura, apesar de não ser muito grande… aliás até para o lado do baixote… e que tudo fará para tirar Portugal deste abismo para o mergulhar num outro onde a felicidade irá residir na alma dos sobreviventes… Calma António, isto já é campanha eleitoral! Desculpem… é a emoção. Isto de ser Primeiro-Ministro é complicado. Passar a vida a fazer campanha eleitoral é extenuante, não acham?
Bem até à próxima.
Medida 1- Revisão da língua portuguesa. Abolição dos erros: Tudo pode ser escrito da forma que cada um entender.
Viva eu!
Tchau…
António Casado
8 Dezembro 2009