Poemas : 

Homeostase

 
É receitável
Tal recitabilidade.
Em tal recinto
É mui bem-vinda
Presta habilidade.

Sempre cri que a Vida é um único verso branco interminável
Que a verbalidade é a libido do sol que em cada um habita
Que a imensa profusão da profundidade imensurável do Ser é real
Que falar tem gosto de salada bem temperada
Que ouvir tem cheiro de pipoca estalando
Que cantar é espasmo vagalumínico
Que dançar é contato metassanguíneo
Que as frutas nas copas são as estrelas na lembrança
Numeravelmente
O vento sopra calor
As raízes das plantas enterradas nas calçadas
Os ódios e pavores de desconhecidos me atravessando com a chuva das ondas de rádio e tevê
Meu queixo rechonchudo
Tudo infinitamente o mesmo.

Um zilhão de instantes o mesmo
Um zilhão de infinitudes a mesma.
Esta mesma Vida toda
Girando sobre si
Através de si
Do zero ao um
E depois de novo e de novo
Todos os erros infinitamente repetidos
Todos os vacilos, todas as lições, toda concórdia e honra e pálida deliquência!
Toda lastimosa conformidade
Chegando na muralha no fim da eternidade
Começando de novo do zero
E sendo igualzinha
A existência infinitas vezes se repetindo sobre si mesma
E sempre a mesma
Sempre esta exatamente
Contundente
Intransigente
Resplandecente.

Deus exclamando: "Déjà vécu!"

E o relógio digital próximo da meia-noite
As pernas em lótus firmes fortes
As plantas dos pés bem apoiadas sobre o timo
Meus vícios como vícios
Minha juventude como um esquecimento e um frenesi de amnésia
Minha poderosa marreta enferrujando
Sonoplastia demais me atravessando
Tanto cinema estronchíssimo, cabalmente violento
O vento quase inerte
Meus ossos quase flexíveis
Minha imaginação quase domesticável...

E agir parece um nada, um vazio
Pensar parece um dispêndio dispéptico imponderável
As máquinas recebendo mais carinho das pessoas que as pessoas
Aquele ondular dos gramados e campos
Às marés das correntes soprantes
Meu pranto que não deixo escorrer palpitante
Minha alegria digerindo
O pânico uma injeção de adrenalina em overdose de cocaína
A frustração uma musa incomparável masculinizada
A paixão um sexo que é pura subjetivação
As coceiras e as sujeiras e o que mais tranborde do coração um pedido de socorro
Clamando por cachoeiras, rios e lagos translúcidos
Céus virgens, dias purpúreos
Batizados
Fogueiras em que se não assem pecadores
Clareiras em que se não fixem pregadores
Cumes instigantes
Descansos despreocupantes.

Utopia que me renova
Que me faz envelhecer
Humanidade
Definibilidade.






9 de Setembro de 2006
orgasmagia.blogspot.com
 
Autor
alikafinotti
 
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