VERSOS PAGÃOS
Retrocedi no tempo, ao redor da existência.
Percalços e desilusões já não invadem mais.
Foram-se e já não importa nem os cabedais.
Tolo que destarte quedei-me nesta blasfêmia
De crer ser sina o esperar pelas exéquias.
Sentado sobre o muro, hirto de frio, taciturno.
Cerrei os olhos, a boca, a vida e os caninos.
Deveras que a fome literária não me visite,
Deixei o intelecto numa garrafa de aguardente.
E vem com profecias a querer exorcizar-me?
Anda-te daqui com estas rezas e velas acesas,
Nem lamparina daqui vai me fazer arredar!
Pois chame as cafetinas, todas as marafonas,
Estas sim virão me acompanhar com prazer.
Minhas últimas laudas de cem versos pagãos,
Faço questão, entregarei a elas em mãos.
Estás a mirar-me com olhos tão ingentes?
Não sabes que tentei ser poeta e que os
Acadêmicos baniram meus versos?
Sou fantasma, uma aparição, sou defunto!
É morto mesmo, não vês, tirem os antolhos.
Porém hoje para contrariar as más línguas,
Daqui de cima do muro da verdade, posto que
Vencidos os reis assistirei minha
Homenagens póstumas!
Quiçá então, este pobre diabo com alma
De alfarrábio descanse em paz, amém!